Incluída pelo novo artigo 8.º-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, em breve se realiza em todo o país a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, a partir do dia 1.º de fevereiro, com o objetivo de disseminar informações sobre medidas preventivas e educativas que contribuam para a redução da incidência da gravidez na adolescência. O Brasil ocupa o infeliz quarto lugar em uniões precoces num ranking de 20 países: "normas e papéis sociais tradicionais e desiguais de gênero, pobreza e falta de oportunidades, gravidez não planejada, violência sexual e insuficiência legal e de políticas públicas são apontados como possíveis causas para os casamentos e/ou as uniões precoces", segundo a ONG Plan International.
É preciso ressaltar que a prática é considerada internacionalmente uma violação dos direitos humanos (segundo o ODS 5 da Agenda 2030 da ONU), está diretamente associada à gravidez precoce e suas consequências são múltiplos riscos às jovens mães, tais como ausência de escolaridade e independência financeira, e às crianças por elas geradas, as quais se encontram no grupo dos mais elevados índices de mortalidade antes dos 5 anos e desnutrição.
O enfrentamento da gestação na adolescência deve incluir ações de educação no ambiente escolar
Mas quais seriam as medidas preventivas que de fato contribuem para a redução da incidência de gravidez na adolescência, nos exatos termos trazidos pela redação da lei? Eventuais orientações sobre abstinência podem ser uma opção para as adolescentes dentro de sua esfera de decisão, além de outras políticas públicas para reverterem preocupantes índices brasileiros de gravidez e casamentos precoces. Além do incremento para abertura de diálogo sobre o assunto entre pais e filhos, o enfrentamento da gestação na adolescência deve incluir ações de educação no ambiente escolar, associadas ao amplo acesso a contraceptivos e ao acolhimento das jovens nos serviços da rede de saúde.
Em Curitiba, a partir de trabalho intensivo da Secretaria Municipal de Saúde neste sentido, observou-se uma queda considerável de número de gestações precoces de mães com menos de 20 anos entre os anos 2000 (5.553 nascimentos) e 2018 (1.851 nascimentos). Inicialmente, realizou-se o mapeamento dos indicadores contidos em banco de dados epidemiológicos a fim de localizar áreas de maior vulnerabilidade com altos índices de adolescentes gestantes. Por meio da estruturação, desenvolvimento e aplicação de oficinas personalizadas de prevenção e promoção de saúde aos grupos identificados, sensibilização de forma teórico-vivencial de profissionais da saúde e assistência intersetorial atuantes nos territórios, houve criação de um ambiente propício à escuta, ao questionamento e à reflexão. Depois, foi percebida redução de casos de gestação na adolescência nas áreas trabalhadas, manutenção da metodologia em ações locais e melhora na abordagem e acolhimento pelos profissionais.
A gravidez na adolescência continua sendo um desafio para gestores públicos e toda a sociedade. Atuação intersetorial (educação, ação social, trabalho e emprego, esporte e juventude, cultura, conselhos de direitos, lideranças comunitárias, Ministério Público, entre outros), levantamento de aspectos biopsicossociais, observação da existência e necessidade de intervenção mostram-se eficazes para redução da gravidez na adolescência sem deixar de se considerarem direitos sexuais/reprodutivos e autonomia.
Verifica-se grande avanço da legislação protetiva dos direitos da infância e juventude ao se trazer a temática em tela para o texto do ECA. Contudo, metas, índices e resultados – ou seja, evidências científicas e estatísticas, tais como as expostas na capital do Paraná – devem embasar políticas públicas efetivas para a solução de tão grave problemática.
Ângela Leite Mendes é médica ginecologista da SMS – Rede Mãe Curitibana Vale a Vida. Mariana Bazzo é promotora de Justiça.
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