O comportamento ético e moral desde sempre foi objeto de estudo da filosofia, e encontra definições e conceitos tão diversos quanto diversas são as correntes de pensamento. Há, contudo, elementos nucleares que parecem ser comungados. Um deles é o que John Rawls denomina “moralidade de grupo”. Para o autor, o conteúdo da moralidade de grupo é ditado pelos padrões morais adequados ao papel do indivíduo nas várias associações às quais pertence. Esses padrões, ainda segundo o autor, “incluem as regras de moralidade ditadas pelo senso comum, juntamente com os ajustes necessários para adequá-las à posição particular de um indivíduo; e são impressos nele pela aprovação ou pela desaprovação daqueles que detêm a autoridade, ou pelos outros membros do grupo”.
Eis aqui um ponto que merece destaque e reflexão em função dos recentes episódios da vida política nacional envolvendo o recebimento de propina ou atos de corrupção. Em que medida os protagonistas de atos de corrupção estão recebendo a devida sanção moral por parte do grupo social a que pertencem? O cometimento de atos de corrupção ou a continuidade da prática – mesmo em um período no qual notoriamente se sabe haver um esforço gigante por parte da sociedade em geral e, em especial, das instituições a quem compete o controle da administração pública (Ministério Público, autoridades policiais) para identificar e punir atos ilegais – demonstra que o temor da sanção jurídica não parece dissuadir da prática de atos ilícitos. Vale dizer, a sanção jurídica não está cumprindo suas funções essenciais de prevenção geral e de prevenção especial: evitar que se cometam delitos e evitar que se reitere o cometimento de práticas ilícitas.
Não é possível “ficar fácil” para os corruptos
Nesta medida, pode-se cogitar que a sanção moral, ou a reprovação da conduta pelo grupo social ao qual pertence o infrator, pode contribuir de fato para inibir práticas de atos de corrupção. O que se verifica, contudo, na vida cotidiana é que aqueles flagrados recebendo propinas ou praticando outros atos de corrupção nem sempre recebem a devida sanção moral por parte de seu grupo social. No plano pessoal de seu círculo social, normalmente o fato de terem delinquido não produz nenhuma repercussão mais significativa. A sociedade brasileira, no plano social, em geral é leniente e complacente com os corruptos. Os que são flagrados não recebem sanção social, ou a recebem em grau mínimo.
Não se deve, e nem é este o propósito, defender que os delinquentes sejam banidos da sociedade. O que se defende é que haja um mínimo de reprovação social efetiva, de modo a causar substancial constrangimento para aqueles que foram flagrados recebendo propina ou cometendo qualquer ato de corrupção. Um pedófilo certamente teria dificuldades para continuar frequentando normalmente um clube social, pois a reprovação da conduta tornaria inviável a convivência harmoniosa no grupo social. É preciso que a sociedade compreenda o substancial e essencial prejuízo que os atos de corrupção produzem, e dê respostas efetivas e consistentes no plano da sanção social e moral.
Leia também: Paraná, paraíso da impunidade (artigo de Diogo Castor de Mattos, publicado em 8 de abril de 2017)
Não é possível “ficar fácil” para os corruptos, sendo-lhes imposto responder por suas condutas delituosas apenas no plano jurídico-judicial. Um mínimo de reprovação social efetiva, para constituir uma verdadeira sanção moral, pode ser mais um meio mais eficaz de combate à corrupção. A premissa é a de que o temor do constrangimento público e da reprovação do seu círculo de relacionamentos pessoais pode produzir resultados mais efetivos que o temor da sanção penal, que sempre tarda e nem sempre corresponde à gravidade da infração cometida pelo corrupto.