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Em 14 de agosto de 2018, foi sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a qual, como o nome indica, dispõe sobre o tratamento de dados pessoais utilizados, sobretudo pelo poder público e por empresários, tendo como principais objetivos proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade dos cidadãos. Portanto, a LGPD representa um verdadeiro marco no Direito brasileiro e a sua importância é inquestionável.
Mas a questão que se coloca é outra: o prazo para parte dessa lei entrar em vigor (14 dos seus artigos já estão em vigor), o que até o momento está previsto para ocorrer em agosto deste ano. A razão para esse questionamento – que não é novo e já vem sendo tratado no Projeto de Lei 5.762/2019 – ganhar força exatamente neste momento é a mais óbvia possível: o coronavírus e os seus impactos na atividade empresarial do país.
Diante desse cenário, o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) propôs o Projeto de Lei 1.164/2020, o qual parece atender aos interesses de todos os destinatários dessa lei, inclusive dos que por ela são protegidos. Afinal, esse projeto de lei não visa exatamente à prorrogação da LGPD como um todo, mas tão somente do prazo para a aplicação das sanções nela prevista, para 12 meses após o início de sua vigência.
Inclusive, é importante ressaltar que esse projeto apenas formaliza uma situação que, ao que tudo indica, iria ocorrer de qualquer maneira, tendo em vista que ainda não foi instituída a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão com competências fundamentais para a implementação da lei, dentre as quais está justamente a aplicação de sanções em caso de tratamento de dados realizado em descumprimento à legislação. Ou seja, faltando menos de cinco meses para a LGPD entrar em vigor, ainda não existe o órgão que terá competência para sancionar aqueles que a descumprirem. Ademais, não haveria bom senso em se punir aqueles que descumprirem a LGPD já a partir de agosto deste ano. Primeiramente, porque a ANPD tem como competência, também, regulamentar essa lei, de modo que se mostra inviável aos empresários prepararem a sua estrutura organizacional para a LGPD sem nem sequer terem como saber os termos da regulamentação que será imposta pela ANPD.
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Em segundo lugar, o coronavírus e o seu impacto da economia – que é concreto e com proporção ainda desconhecida – afastam qualquer dúvida sobre a importância de se prorrogar o prazo para vigência de parte da LGPD. Pois, nas palavras do senador Alvaro Dias, “num cenário de possível crise financeira, permitir que as empresas estejam sujeitas a sanções de até R$ 50 milhões seria uma iniquidade em um momento crítico pelo qual atravessa o país”. Em outras palavras, no contexto atual, os empresários estão diante de desafios como alterar toda a forma de trabalho dos seus empregados (home office), a queda brusca no seu faturamento e a manutenção de empregos com menos receita, o que é evidenciado pelas fortes e constantes quedas na bolsa de valores. Logo, não parece razoável que os empresários brasileiros, tendo de enfrentar tamanhos desafios, precisem, neste momento, também direcionar esforços e recursos financeiros para o cumprimento da LGPD, inclusive porque provavelmente muitas dessas medidas necessitarão de uma presença física nos estabelecimentos para a sua implementação, o que não é compatível com o isolamento social ora imposto.
Rodrigo Cunha Ribas é advogado atuante no Direito Empresarial.