Mesmo com a nota oficial do governo do estado afirmando o “compromisso com a função social da arte e da cultura”, neste momento de sumário desmonte das instituições culturais, a paralisação das atividades da Orquestra Sinfônica do Paraná e do Balé Guaíra “por tempo indeterminado” levanta algumas questões que precisam ser respondidas.
Já que o problema de um eventual hiato transitório era conhecido há pelo menos dois anos, por que não se buscou alternativa mais eficiente? Qual a razão dos mais de dois anos de demora para a assinatura do convênio com a Palcoparaná? Por que o estatuto demorou tanto para ser criado e homologado? Os 81 cargos atingidos eram divididos entre artísticos (50) e técnicos do teatro (31). Estes últimos, contudo, foram preenchidos por cargos comissionados no Teatro Guaíra, que de 31 passaram a ser 43. Em seu despacho para a Assembleia Legislativa, o governador afirma que a medida traria uma economia média anual aos cofres públicos de R$ 3.742.122,43. No entanto, a tabela de custos só contempla os 43 novos cargos, comparando com o custo dos 81 existentes. Foi este apenas um erro, uma manobra contábil, ou não há a intenção de recontratar os 50 artistas, mesmo pela nova autarquia? Se desconsiderar 50 postos de trabalho é economia para os cofres públicos, como serão providos os recursos? O que tudo isso nos diz sobre a postura do poder público a respeito deste setor, e sobre o momento crítico da cultura no país?
Qualquer alteração circunstancial ou de discurso, e orquestras inteiras são eliminadas do mapa com uma canetada
Alterar o modelo, criando uma Organização Social para facilitar deteminados trâmites burocráticos e judiciais que possam otimizar a gestão de entes culturais, é uma escolha. Uma OS tem uma institucionalidade menos robusta, e a vulnerabilidade é também uma escolha. Assim como retirar a possibilidade de vínculo direto dos funcionários com o Estado e não realizar concurso público.
O que causa desconfiança nessas medidas comuns dos gestores públicos é a falta de consistência das políticas culturais no país. Qualquer alteração circunstancial ou de discurso, e orquestras inteiras são eliminadas do mapa com uma canetada. Via de regra, a “economia de gastos” reclamada gira em torno de 0,05% do orçamento total. Matematicamente, medidas tão enérgicas quanto deixar de comer duas folhas de alface por dia e querer, com isso, emagrecer.
Em um país com 12 milhões de desempregados, essa lógica absurda conseguiu transformar a demissão de pais e mães de família em uma boa ideia, desde que seu instrumento de trabalho seja, em suma, a criatividade. Aliás, criatividade é indústria e, como em qualquer outro setor, estruturas complexas (como uma orquestra) deveriam ser parte de uma política de desenvolvimento. Entre 2004 e 2013, o PIB do setor cresceu quase o dobro do brasileiro. No mundo, essa área gera mais empregos que o setor automobilístico nos Estados Unidos, Japão e União Europeia juntos.
A arte é o mais refinado exercício da experiência estética e da imaginação. Albert Einstein, que viajava o mundo com seu violino, disse que “a imaginação é mais importante que o conhecimento”. Ela caminha ao lado do saber técnico, quebrando paradigmas: uma das bases da evolução científica, intelectual, espiritual e filosófica em qualquer sociedade. A música é uma das maneiras de exercitar tal faculdade humana, que nos permite ouvir o passado e deixar uma herança para o futuro. Qual seria nosso legado, se apenas existisse o silêncio?
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