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Quando Curitiba deu uma lição de coragem ao Brasil

Há 30 anos, Curitiba deu ao Brasil uma lição de democracia e lucidez política. Na noite de 12 de janeiro, realizamos na Boca Maldita o primeiro comício pelas Diretas Já, que reuniu cerca de 50 mil pessoas. A campanha "Eu quero votar para presidente" começou aqui, fruto do idealismo e da ousadia dos que acreditavam que era possível implantar no Brasil um regime democrático de direito. A história provou que estávamos certos.

Para quem não viveu a ditadura, pode parecer um feito banal, mas Curitiba deu o pontapé inicial no movimento que tomaria o país inteiro, levando multidões às praças públicas. Não conseguimos eleger, pelo voto popular, o presidente da República em 1985, mas acendemos no país a chama da esperança e impusemos uma derrota aos militares. A partir de 12 de janeiro de 1984, o país seria outro.

Devemos a realização do comício em Curitiba à visão de líderes políticos como José Richa, então governador, Alvaro Dias, senador e presidente do PMDB, Maurício Fruet, prefeito de Curitiba, Affonso Camargo e à bancada de deputados federais e estaduais de oposição. Houve um envolvimento de todos os partidos e da militância de esquerda na divulgação e mobilização e presença de entidades representativas da sociedade civil como a OAB, então presidida por Otto Sponholz. Ao lado de Ricardo MacDonald, fui um dos organizadores do comício.

No palanque da Boca Maldita reunimos estrelas da política nacional como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Franco Montoro, e celebridades como a atriz e deputada Bete Mendes Raul Cortez, Dina Sfat, Wando e Belchior, além de Osmar Santos, que viria a ser o locutor oficial dos comícios.

Impossível esquecer o doutor Ulysses repetindo os versos da música "Inútil", do Ultraje a Rigor "A gente não sabemos escolher presidente, a gente somos inútil. Pois vamos mostrar que a gente não somos inútil. Que nós sabemos escolher presidente", discursou o presidente do PMDB.

O Brasil vivia um processo lento de abertura política e o sucessor do então presidente general João Figueiredo seria novamente escolhido por um Colégio Eleitoral formado por parlamentares. Era um jogo de cartas marcadas que apenas sacramentaria o nome ungido pelo governo militar. Paulo Maluf e o então ministro dos Transportes Mário Andreazza eram os favoritos do Partido Democrático Social-PDS, partido que sucedeu a Arena, de triste memória.

A partir do comício de Curitiba, tudo mudou. Grandes manifestações tomaram as capitais brasileiras e a mobilização pela aprovação da emenda do deputado federal Dante de Oliveira para escolher o presidente da República pelo voto direto atingiu todos os setores progressistas da sociedade. A proposta foi derrotada, por apenas 22 votos, mas o apoio popular à iniciativa foi decisivo para abrir uma dissidência no PDS que resultou na criação da Frente Liberal.

Sob o comando do PMDB e com apoio do PDT, PTB e PT houve a aliança com a Frente Liberal e foi possível vencer a disputa no Colégio Eleitoral. O peemedebista Tancredo Neves foi eleito com 480 votos, contra 180 dados ao segundo colocado, Paulo Maluf. Houve 17 abstenções e 9 ausências.

Naquela noite, Curitiba mostrou ao país que era possível mudar, que havia esperança, que era possível sim viver numa democracia. Naquele 12 de janeiro, Curitiba deu uma lição de coragem ao Brasil. Naquela noite, nenhum de nós foi inútil.

Luiz Claudio Romanelli, secretário de Estado do Trabalho, Emprego e Economia Solidária do Paraná, é advogado especialista em Gestão Técnica do Meio Urbano e presidente do Forum Nacional de Secretarias do Trabalho (Fonset).

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