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O ano de 2023 para o Brasil não foi um desastre econômico, mas ficou longe de ser um sucesso. A agropecuária salvou o governo Lula de um resultado negativo. Tendo crescido em relação a 2022, no período da safra e no começo do ano atingiu números expressivos que compensaram a acentuada queda do PIB nos 2º e 3º trimestres, permitindo uma evolução na ordem de aproximadamente 3%.
O déficit orçamentário previsto de muito mais de 100 bilhões de reais derrubou o bom resultado do último ano do governo anterior, num superávit acima dos 50 bilhões de reais. A reforma tributária, aprovada em nível de Lei Suprema, sem conhecimento dos projetos de legislação infraconstitucional, assim como os impactos em cada unidade federativa e em cada segmento empresarial, continua sendo aplaudida pelos desconhecedores do sistema tributário e gerando perplexidade e dúvidas naqueles que o entendem.
A convivência de dois sistemas (o antigo, dito como caótico, e o novo de 2026 a 2033), no mínimo trará para todas as empresas do Brasil um complicador, ou seja, continuar com o velho sistema por 8 anos, se não houver prorrogação, e acrescentar o novo desconhecido. Este terá que ser estudado com cuidado nos termos da Carta Magna e da legislação decorrente, lembrando-se que o texto que se pretende simplificador na sua origem, é três vezes mais extenso do que o atualmente previsto na Constituição de 1988.
Enfim, quando se conhecerem as alíquotas e os impactos na federação e na empresa nacional, durante as propostas legislativas, a indústria não protestará, pois foi a grande incentivadora e beneficiária do projeto, mas os setores de serviço, comércio e agropecuária, que terão um peso, em alguns segmentos muito superior à atual carga tributária, certamente criarão seus lobbies no Congresso para gerar novas exceções. O certo, porém, é que o Brasil ostentará a maior alíquota de imposto sobre o valor agregado (IVA) do mundo.
Na política, o Executivo – cuja eleição foi assegurada pelo Supremo Tribunal Federal, no dizer de um dos ministros, pois auxiliou a vencer o outro candidato, segundo outro ministro – mantém ótimas relações com a Suprema Corte e difíceis com o Congresso Nacional. O Supremo Tribunal Federal, que se auto outorgou o direito de legislar em algumas matérias como aborto, drogas, marco temporal das terras indígenas, transformou-se não só no poder técnico (de julgar), mas também no poder político, ao ponto de sugerir nomes para a própria Suprema Corte ao presidente da República, com sua aceitação.
Essa transformação de uma casa de interpretação das leis numa casa legislativa, gerou tensões e reação principalmente do Senado, que é a única corte capaz de punir ministros do STF, com projetos de Emenda Constitucional, dos quais um já fora aprovado na Câmara (PEC 8/2021), desagradando os magistrados do Pretório Excelso. Entendem os senadores, assim como eu, que o artigo 49 inciso XI obriga – é um “poder-dever” –, o parlamento a defender sua competência normativa perante a invasão de outros Poderes. Está assim redigido: “Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (...) XI - zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”.
Por fim, por ser o Congresso um poder de maioria conservadora e o Executivo um governo de esquerda, todos os projetos de lei por este propostos exigirão muito trabalho para serem aprovados e a concessão de recursos orçamentários para bases eleitorais dos parlamentares que possam votar a seu favor gerará um acréscimo orçamentário, sendo, pois, o custo político desfigurativo das contas públicas. À falta de segurança orçamentária para combater a inflação, a política monetária do Banco Central é o único caminho que resta para enfrentá-la.
Nada obstante tais problemas a serem enfrentados no ano de 2024, certamente com PIB menor que em 2023, sou otimista por acreditar mais na sociedade do que nos governos – que sempre são maus empregadores para o empreendedorismo e para o desenvolvimento nacional –, pois sei que a iniciativa privada brasileira se reinventará. Para o Brasil, sempre confiei na teoria do besouro, que os físicos declaravam não poder voar pelo peso do corpo e o tamanho das asas, mas, apesar dos prognósticos contrários, sempre voou. Assim são os empreendedores brasileiros, quando a doutrina econômica mostra que não podem crescer, crescem, pois tem a sabedoria da reinvenção.
Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das Universidades Mackenzie, UNIP, UNIFIEO, UNIFMU, do CIEE/O ESTADO DE SÃO PAULO, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército – ECEME, Superior de Guerra – ESG e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região; professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia); doutor Honoris Causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs-Paraná e RS, e catedrático da Universidade do Minho (Portugal); presidente do Conselho Superior de Direito da FECOMERCIO- SP; ex-presidente da Academia Paulista de Letras-APL e do Instituto dos Advogados de São Paulo-IASP.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos