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O piloto sentiu os golpes, vacilou e entrou numa arriscada área de turbulência. As metáforas saíram da inocente área futebolística e agora estão na perigosa esfera da aeronáutica: o relatório da CPI dos Correios e a denúncia do procurador-geral da República abalaram os controles da aeronave palaciana e mesmo sem recorrer à caixa-preta percebe-se a confusão na cabine de comando. A prova está na absoluta inépcia com que o governo conduz a crise na Varig.

Agarrados às simplificações ideológicas que os levaram ao abismo, alguns membros do primeiro escalão balbuciam uma esfarrapada desculpa que não fica bem em pessoas que sempre defenderam soluções intervencionistas e jamais aceitaram as soluções de mercado: "O dinheiro público não pode ser gasto para salvar uma empresa privada".

Neófitos neste time, esses comissários indevidamente transformados em comandantes, ignoram o chamado efeito-dominó, a dinâmica que comanda o mundo dos negócios. Uma grande empresa mesmo em situação agônica tem potencial para contaminar todo o setor e ainda contagiar parte da economia.

A Varig não é apenas uma empresa de transporte aéreo, é um dos pilares da indústria do turismo. Não é apenas um grande empregador, é um dínamo que movimenta o setor aéreo há mais de meio século. Depois do desastre da Panair, foi uma das responsáveis pela integração deste país-continente.

Enquanto os marqueteiros chapa-branca tentavam enfiar uma réplica do chapéu de Santos Dumont na cabeça do sempre sorridente astronauta Marcos Pontes, os operadores do governo não conseguiam perceber que sua inoperância ajudava a derrubar um dos símbolos do nosso pioneirismo na navegação aérea.

Não se trata apenas do caso clássico do dinossauro que não conseguiu adaptar-se aos novos tempos. O setor como um todo ainda tem muito de jurássico. Enquanto a estatal Infraero, nem sempre conduzida por profissionais do ramo, dispõe de um poder excessivo, a Anac levou quase quatro anos para sair do papel – só foi formalizada recentemente e dá mostras evidentes do seu despreparo para enfrentar a catástrofe anunciada.

O mesmo governo que agora adota uma fingida lealdade à livre iniciativa, desde o período da transição FHC-Lula procrastinava a criação da agência reguladora da aviação civil simplesmente porque não pretendia dar força a um instrumento capaz de opor-se ao aparelhamento partidário da máquina administrativa. Um organismo verdadeiramente autônomo e competente já teria evitado o doloroso espetáculo que Luís Nassif designou muito apropriadamente como "a imolação da Varig".

Nestes dias tão propícios à meditação, o governo deveria ao menos perceber que "o caso Varig" transcende à Varig. Uma empresa-zumbi é capaz de criar um setor-zumbi, a Varig tem proporções para arrastar o segmento inteiro para o buraco e criar um enorme mal-estar na sociedade. O brasileiro aprendeu a voar e não apenas para divertir-se nas férias ou feriados. O negócio da aviação produziu profundas alterações na vida brasileira que já não podem ser revertidas.

O mercado, sozinho, não conseguirá substituir a empresa-ícone. As concorrentes – nacionais ou estrangeiras – terão muitas dificuldades para integrar as rotas abandonadas, atender a demanda crescente, honrar as passagens compradas e, sobretudo, quitar os compromissos com os 5 milhões de clientes do seu programa de milhagem. E se esse compromisso for rasgado as conseqüências serão arrasadoras.

Os neoneoliberais que agora estão com as mãos no manche precisam atentar para a importância da credibilidade no mundo das relações sociais. Os "sem-passagem" aliados aos "sem-milhas" e apoiados pela militância dos trabalhadores da Varig podem fazer enormes estragos nas próximas sondagens eleitorais.

Atarantados, desatentos ao radar, preocupados apenas com algumas piruetas deletérias, estes que agora pilotam o avião chamado Brasil o empurraram para um vácuo. No vácuo, as quedas assustam.

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