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A essa altura, já não há quem não tenha ouvido falar do recreio temático com o tema “e se nada der certo?”, realizado recentemente em uma escola gaúcha, repetindo evento semelhante ocorrido em outro colégio de Porto Alegre dois anos atrás. Os alunos se fantasiaram de domésticas, garis e empregados da rede McDonald’s, dando a entender que esses ofícios pertencem a pessoas que teriam fracassado na vida. Um ato de uma infelicidade incalculável.

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Quando foi que a geração atual deixou de valorizar o trabalho como forma de tornar o homem mais digno e passou a valorizar somente o fator e o estereótipo econômico como forma de sucesso?

Todo trabalho lícito é um exercício de plenitude da dignidade individual. Quem trabalha se sente digno, mas quem ainda não teve contato e nem está acostumado com o ambiente de trabalho não consegue e tem sublime dificuldade de entender o seu valor.

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Todo trabalho lícito é um exercício de plenitude da dignidade individual

A ausência de contato dos mais jovens com o valor do trabalho tem, no entanto, alguns culpados: a intervenção estatal e as exageradas legislações trabalhistas, que, com o tempo, foram proibindo os mais jovens de ter qualquer contato com o trabalho, sob o pretexto de que deveriam se dedicar exclusivamente às lavagens cerebrais do currículo centralizado do Ministério da Educação, retirando dos mais jovens o direito de ter um contato, ainda que inicial, com a dignidade do trabalho. Some-se a isso o fato de a educação domiciliar que visa ensinar o valor do dinheiro ser muitas vezes falha, em meio a mimos e caprichos excessivos dos pais modernos. Assim, tudo está a indicar que se trata de uma geração que terá graves dificuldades de tão cedo andar com as próprias pernas.

Esses jovens foram intensamente convencidos a achar que sua segurança financeira está em ter uma boa formação e simplesmente se jogar no mercado de trabalho, nexo este que é contrariado pela própria realidade, pois o sucesso profissional está baseado não em facilidades e brilhantes ideias que simplesmente caem do céu, mas do enorme e suado esforço de cada dia, de cada controle nas contas do mês, de cada renúncia a coisas que, apesar de satisfazerem, se fazem supérfluas em um momento emergente. Nenhuma bela história de sucesso empresarial foi resultado de facilidades, e muito menos sumariamente iniciada no topo administrativo sem que a pessoa ao menos tenha passado pelas hierarquias inferiores, sentindo as dificuldades da base da pirâmide.

Leia também:Nada deu certo (artigo de Flávio Bortolozzi Junior, publicado em 8 de junho de 2017)

É próprio de uma mentalidade vazia e pouco experimentada pensar que o sucesso da vida se mede simplesmente pelo quanto você coloca na sua conta bancária, e não pelo simples exercício de buscar o seu sustento através do trabalho, assumir responsabilidades e sustentar a si mesmo e a uma família.

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Quem são os culpados? Novamente, os pais, que, além de viverem as contradições do materialismo, das aparências estereotipadas modernas, certamente reduziram também a educação de seus filhos a isso. Seria por proteção? Ora, não se pode proteger ninguém das realidades atuais, sob pena de deixar os sujeitos serem engolidos por ela!

Se os filhos deste país não derem valor a todo tipo de trabalho, inclusive os braçais, muitas vezes executados pelo esforço de quem está acordando cedo e sofrendo no transporte público apenas para servir e ganhar o seu sustento, ainda vai existir a ideia ingênua de que se trata de “coisa de gente que não deu certo”. Ora, trabalhar é digno, trabalhar é um dever. O valor não está somente no que se tira do sustento, mas na dignidade gerada por não precisar pedir socorro à sociedade com braços desocupados, enquanto o tempo corre ocioso.

Bruno Dornelles é advogado tributarista.