Apoiadores de Trump entram em confronto com a polícia e forças de segurança e derrubam barricadas para invadir o Capitólio dos EUA em 6 de janeiro| Foto: ROBERTO SCHMIDT / AFP
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Após uma caótica e atribulada corrida eleitoral, marcada por disputas judiciais e um acirramento político jamais antes visto na história dos EUA, estava marcada para o dia 6 de janeiro a sessão no Congresso norte-americano para certificar a vitória do democrata Joe Biden no Colégio Eleitoral. No mesmo dia, centenas de milhares de eleitores de Trump se deslocaram até Washington para protestar. As cenas que o mundo presenciou daí em diante foram inéditas e chocantes. Alguns manifestantes conseguiram entrar no prédio do Congresso da maior democracia do mundo. Quatro pessoas morreram, uma delas uma mulher baleada dentro do Capitólio por agentes de segurança.

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Ao analisar todos os acontecimentos em Washington tiram-se várias conclusões, porém algo específico salta aos olhos: o gritante duplo padrão de boa parte da imprensa e de muitas pessoas ao descreverem esta manifestação, em comparação com as centenas de manifestações do Antifa e Black Lives Matter ao longo do ano.

É bom já deixar um ponto bastante claro: os baderneiros que invadiram o Congresso americano devem ser identificados e presos. Não há como relativizar qualquer tipo de violência, depredação de patrimônio público ou invasão. O Partido Republicano sempre foi o partido da “lei e ordem”, e deve continuar defendendo tais valores. O que embrulha o estômago é o duplo padrão das pessoas que classificam os baderneiros do dia 6 como “terroristas”, mas durante todo o ano passado chamaram extremistas violentos de esquerda de “manifestantes pacíficos”.

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O âncora da CNN americana Chris Cuomo, irmão do governador democrata de Nova York, disse no ar, em 2 de junho do ano passado, que “protestos não deveriam ser educados ou pacíficos”. Ele estava obviamente se referindo aos protestos do Black Lives Matter e do grupo Antifa, que desde o início do ano passado causam terror e violência por todos os EUA. Para o âncora, esses grupos têm licença para serem violentos.

Em outubro, um apoiador de Trump foi assassinado no meio da rua em Portland. Grupos extremistas tentaram invadir e atear fogo em um prédio federal da cidade. Milhares de lojas e estabelecimentos comerciais foram depredados e incendiados em diversos estados. Em uma imagem que viralizou e que escancara este duplo padrão, um repórter da CNN descreve os protestos como “majoritariamente pacíficos”, enquanto chamas enormes dominam o cenário ao seu redor.

Por que, então, existe esse duplo padrão tão evidente? O que está por trás do posicionamento das pessoas que estão defendendo grupos extremistas violentos desde o começo do ano passado?

A resposta não é tão simples. Eu a obtive após várias conversas com pessoas que adotaram essa exata postura, de criticar a violência de apoiadores de Trump, mas ignorar completamente a violência dos grupos de esquerda. Depois de algum tempo de conversa, os defensores do Black Lives Matter (que ao menos são honestos) admitem que, para eles, a violência desses grupos é justificável porque a “causa” permite. Ou seja, se for para “combater o racismo”, a violência é permitida, o que não seria o caso dos manifestantes pró-Trump.

Ora, essa visão é no mínimo interessante. Essas pessoas utilizam a sua própria régua moral para definir quem pode ou não ser violento. Para elas, o problema não é a violência em si, mas quem está sendo violento e qual a motivação desta pessoa. Se a motivação passar na régua moral estabelecida por eles próprios, a violência está liberada. Por essa mesma lógica, poder-se-ia justificar, por exemplo, atentados de extremistas islâmicos. Pela régua moral dos terroristas, eles estão cobertos de razão. A “causa” deles poderia ser tão justificável quanto a causa do “combate ao racismo” nos EUA. Deveríamos, portanto, tentar compreender a motivação deles e justificar um atentado que tire a vida de algumas pessoas? A partir do momento em que o limite não é mais o ato violento, mas a motivação de quem está cometendo tal ato, entramos em um terreno muito espinhoso e injustificável do ponto de vista moral.

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Cada um tem o direito de defender as ideias que bem entender. Devemos defender ferozmente a liberdade de cada pessoa se expressar. No entanto, o limite desta liberdade é a preservação da propriedade pública e privada, que inclui a integridade física de outras pessoas. Violência é inadmissível em qualquer circunstância, e deve ser a linha que separa pessoas sensatas de mentes revolucionárias. Quem hoje defende a violência de determinados grupos porque concorda com a “causa” amanhã terá de defender a violência de qualquer um que tenha uma “causa” pela qual lutar. Que lutemos sempre no campo das ideias, e não tentemos justificar violência por qualquer razão que seja.

Gabriel Kanner é empresário, ativista social e presidente do Instituto Brasil 200.