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Quer uma vida mais longa e saudável? Compartilhe seus dados

(Foto: Pixabay)

Sempre fui muito cuidadoso em relação às minhas informações pessoais (há quem diga que sou paranoico). Uso bloqueador de anúncios, de cookies, gerenciador de senhas e uma tonelada de endereços de e-mail descartáveis. Dispositivos vestíveis para monitorar a atividade física? Nem pensar. Até cubro a câmera do meu laptop. Não gosto da ideia de ter meu perfil traçado ou dar a chance para que um vazamento de dados me deixe exposto. Se você me perguntasse se eu queria que meus dados fossem coletados, analisados e compartilhados, é claro que eu diria que não.

Mas então tive uma experiência engraçada no ano passado. Ganho a vida estudando grandes conjuntos de dados, e pensava em criar um aplicativo de inteligência artificial que dissesse à pessoa se seus sintomas eram graves a ponto de exigir uma consulta médica ou até um pulo ao pronto atendimento. Minha incursão no campo da assistência médica não durou muito: a IA exige muitos dados e, quando se trata de informações pessoais de saúde, é incrivelmente difícil obter acesso a elas, mesmo que sejam anônimas. Depois de meses tentando obter os dados de que precisava para minha pesquisa, desisti.

Entretanto, o experimento me ensinou uma coisa: não quero mais esconder os dados sobre a minha saúde. Quero doá-los, revelá-los.

Talvez ninguém note, mas a escassez de informações sobre a saúde impõe um custo significativo à sociedade, pois a IA tem potencial para fazer a medicina avançar em uma amplitude incrível de subcampos.

A escassez de informações sobre a saúde impõe um custo significativo à sociedade

Poderia aumentar nossa compreensão do genoma humano, melhorando nosso sistema de detecção e compreensão dos transtornos genéticos. Dado seu sucesso no reconhecimento de imagens, ajudaria os patologistas melhorando a resolução dos slides, ou mesmo segmentando as células com potencial canceroso. Encurtaria o tempo que o radiologista leva para processar os exames e afinar a precisão de seus diagnósticos. Eu me identifico principalmente com esse último exemplo, já que meu pai morreu de mesotelioma, o câncer causado pelo amianto, depois que os raios X ofereceram o diagnóstico errado, como se fosse de pulmão. Grande parte do progresso nessas áreas, e em muitas outras, é, no mínimo, atrasado pela falta de dados.

Há várias razões concomitantes para justificar a dificuldade de montar grandes conjuntos de informações sobre a saúde representativos de nossa população, sendo uma delas o fato de estarem espalhadas por milhares de consultórios e hospitais, que usam sistemas de registro eletrônico diversos. É difícil extrair os históricos deles, e não por acidente: as empresas não querem facilitar essa operação, para que o cliente não leve seus dados para o provedor concorrente.

Mas há também um problema fundamental com a proteção da privacidade da nossa assistência médica, principalmente a Lei de Portabilidade e Responsabilidade de Seguro-Saúde, conhecida como HIPAA (na sigla em inglês).

Ela foi aprovada em 1996, quando a inteligência artificial ainda fazia parte apenas dos filmes de ficção científica e sonhos da ciência da computação. Seu objetivo era proteger a privacidade e a confidencialidade dos registros do paciente (além de agilizar a portabilidade da cobertura quando o paciente mudasse de emprego).

Hoje, porém, um dos principais efeitos dessa legislação é dificultar ao máximo o compartilhamento de dados por parte de médicos e hospitais com os pesquisadores: as taxas que teriam de pagar a advogados, estatísticos e outros consultores para garantir obediência à lei são tão altas que simplesmente não vale a pena.

Julia Adler-Milstein, diretora do Centro de Informática Clínica e Pesquisa de Melhoramento da Universidade da Califórnia, em São Francisco, me disse que "os custos associados ao compartilhamento de dados para pesquisa seguindo as regras da HIPAA são tão altos que muitos hospitais nem têm como justificá-los. E as multas decorrentes de um possível vazamento também não animam."

Essas penalidades são instrumentos incisivos que não correspondem a níveis diversos de dano, criando um clima de medo que desestimula o compartilhamento. O vazamento de informações pessoas na internet resulta, com razão, em penas de milhões de dólares – como também os casos de perda de dados, nos quais é pouco provável que alguém jamais os tenha acessado, pois estão armazenados em um laptop ou pen drive que talvez nunca tenha nem saído do consultório. Não estou dizendo que o segundo caso não seja passível de multa, apenas que os valores atuais são excessivos.

O que pode ser feito? Uma solução é aumentar o controle sobre os pacientes. O governo poderia criar um repositório de dados no qual a pessoa carregaria suas informações e que lhe desse controle sobre o volume desejado de compartilhamento e com quem. O problema desse plano é que é pouco provável que muita gente usasse a plataforma.

Poderíamos oferecer um incentivo, permitindo que empresas privadas comprassem os dados dos pacientes, mas milhões de pessoas teriam de participar. O fato de as companhias chinesas já estarem adquirindo centenas de milhares de registros a preço de banana só agrava a questão: o preço de uma tomografia computadorizada de IA de uma instituição norte-americana que pagou milhões por seus dados correria sérios riscos de ser preterido pelo da concorrente chinesa, muito mais acessível.

Uma alternativa mais pragmática seria minimizar algumas das exigências mais onerosas da HIPAA e definir com mais cuidado as situações em que se requer mais privacidade e aquelas em que se pode relaxar um pouco.

Os acordos de compartilhamento devem ser padronizados, de modo que os médicos e hospitais não tenham de elaborar algo próprio toda vez que quiserem compartilhar informações.

Algumas melhorias já estão sendo feitas para mudar a questão das multas, levando em consideração a "culpabilidade" da organização – ou seja, até que ponto a violação é causada por negligência –, mas devemos ir além e adequá-las de acordo com um nível de dano verificável. Por fim, as penalidades devem levar em consideração o tamanho da instituição; um milhão não representa muita coisa para a Clínica Mayo, mas pode quebrar um hospital pequeno.

Facilitar o compartilhamento de dados para essas instituições menores é especialmente importante se quisermos que a IA seja igualmente eficaz para todos os cidadãos. Os modelos funcionam mal quando não são aplicados em uma amostra representativa; o reconhecimento facial, por exemplo, é muito mais eficiente para homens brancos que para mulheres negras. Se obtivermos nossas informações exclusivamente dos sistemas de assistência médica mais caros, corremos o risco de reproduzir essa tendenciosidade na medicina, marginalizando ainda mais as comunidades carentes e rurais que geralmente são servidas por hospitais menores.

Reformar a HIPAA não significa abrir todos os nossos dados pessoais a quem pagar mais por eles ou para qualquer propósito; pelo contrário. Há muitas áreas hoje em que o governo e o consumidor devem exigir maiores proteções, particularmente nos exames genéticos, monitores de desempenho físico e relógios inteligentes, que praticamente não têm regulamentação nenhuma.

Para aproveitarmos os benefícios da IA, porém, temos de simplificar o compartilhamento. Ao contrário de tantos outros sacrifícios muito mais substanciais que já fizemos em outros aspectos da vida, pelo menos teremos algum resultado pelos nossos esforços: o potencial para uma vida mais longa e saudável.

Luke Miner é cientista de dados.

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