Se rever e modernizar o sistema tributário brasileiro já era prioridade, os dois primeiros meses de 2023 têm mostrado que essa questão precisa ser tratada com máxima urgência, sob risco de agravar os prejuízos ao país. Do Executivo ao Judiciário, medidas e decisões ameaçam contribuintes e, por consequência, nosso desenvolvimento.
O novo governo federal iniciou o ano emitindo maus sinais. Entre as propostas contidas no programa de medidas de recuperação fiscal está a alteração do cálculo do crédito do PIS e da COFINS que pode ser apropriado pelas empresas na sistemática de cobrança não cumulativa, prevendo que não dará direito a crédito o valor do “ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição”, contida na Medida Provisória 1.159/2023, o que poderá aumentar litígios relativos à matéria.
A sociedade precisa ser ativa no debate para defender as melhores propostas, capazes de equilibrar a sustentabilidade das contas públicas e o peso do Estado nos ombros dos cidadãos.
O mesmo se verifica em relação à proposta, na Medida Provisória 1.160/2023, da retomada do voto de qualidade em julgamentos de processos administrativos pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) – cuja constitucionalidade já vinha sendo reconhecida nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 6399, 6403 e 6415 –, ainda que haja sido celebrado acordo com a OAB no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.347 (lembrando que a MP ainda depende da análise pelo Congresso Nacional).
Há ainda, os prejuízos ao contraditório e à ampla defesa, especialmente dos micro e pequenos contribuintes, em razão da Medida Provisória 1.160/2023. Ela prevê a aplicação, ao contencioso administrativo fiscal de “baixa complexidade” da regra prevista para o contencioso administrativo fiscal de “pequeno valor”, sendo realizado o julgamento em última instância por órgão colegiado da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, sem possibilidade de recurso ao CARF.
Outro sinal vem do Supremo Tribunal Federal que, ao julgar os limites da "coisa julgada" em matéria tributária, não se conseguiu maioria para a chamada “modulação de efeitos” de sua decisão, possibilitando que empresas venham a ser obrigadas a pagar, retroativamente, tributos cuja cobrança foi afastada por decisão definitiva do próprio Judiciário. As estimativas são de impactos bilionários para diversas companhias, abrindo margem para enorme insegurança jurídica.
Esses eventos tornam ainda mais complexo o já grave cenário tributário, que penaliza empreendedores e emperra nossa competitividade. Somente em 2022, foram R$ 2,89 trilhões pagos em impostos pelos brasileiros — ou seja, cada um de nós teve de trabalhar, em média, 149 dias para pagar essa conta.
Atualmente, a enormidade de legislações e interpretações faz com que as empresas gastem muito mais horas com a burocracia relacionada com o pagamento de tributos do que em países desenvolvidos. É louvável que o governo federal assuma a reforma tributária como prioridade, mas é preciso comprometimento com a simplificação do sistema, reduzindo a burocracia e garantindo com que os tributos sejam uma ferramenta utilizada para o crescimento — e não um peso na vida do cidadão. Isso será possível se houver pressão da sociedade. Sinais como os emitidos pelo Executivo e o Judiciário sinalizam para o aumento de litígios e trazem insegurança jurídica, podendo restringir o efeito das reformas.
A sociedade precisa ser ativa no debate para defender as melhores propostas, capazes de equilibrar a sustentabilidade das contas públicas e o peso do Estado nos ombros dos cidadãos. Destaco nossas iniciativas no âmbito do Comitê Jurídico da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), entidade que está mobilizada para debater as medidas contidas no "pacote Haddad" e as propostas de Reforma Tributária que tramitam no Congresso Nacional.
Temos muito a contribuir — e chamamos toda a sociedade para participar desse debate. Precisamos avançar por um modelo com segurança jurídica que coloque os tributos a serviço de suas reais funções: promover crescimento, geração de emprego e renda e liberdade para empresas e cidadãos. Tarefa complexa, mas fundamental para que o Brasil possa se desenvolver.
Anderson Trautman Cardoso é advogado tributarista, ex-presidente da Federasul (2021-2022) e vice-presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB).
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