O verbo mais gasto em economia política é “reformar”. Todos os políticos prometem reformas e depois são cobrados por não as fazê-las. Reformas são sempre difíceis de fazer, pois sempre mexem com o privilégio de alguém e o Estado se atrapalha muito na hora de tentar implementá-las. O livro de Marcos Mendes Por que é tão Difícil Fazer Reformas Econômicas no Brasil? deixa claro essas dificuldades.
O primeiro problema é considerar reforma como produto de consumo, que você entra num supermercado e escolhe por marca. As pessoas divergem muito em escolha de marcas. O produto é o mesmo, mas as discussões se tornam apaixonadas sobre preferências pessoais.
O segundo problema é o significado de reformar. Reformar significa modificar algo já existente. Vale lembrar Alvaro Alsogaray implorando aos congressistas argentinos sobre um pacote de reformas: “Não as façamos pela metade”. Mas reformas, por definição, são feitas pela metade. Reformar é modernizar com a intenção de melhorar.
A abolição do Estado Empresário, do Estado Babá, do Estado Provedor e do Estado Cara de Pau, irá permitir aos brasileiros florescerem.
Reformar não é monopólio estatal. Fazendo escolhas, estamos fazendo reformas baseadas em novos mores e realidades. A reforma agrária privada e silenciosa dos últimos 50 anos foi muito mais bem-sucedida do que a ruidosa reforma agrária do Estado. E nos últimos anos, mais de 50 mil imóveis rurais e urbanos ganharam títulos de propriedade. Sem ruído. E as reformas trabalhistas dos informais são mais realistas do que a recente meia reforma trabalhista estatal. O terceiro problema é reforma como biombo para privilégios que o poder propicia. Frank Knight tocou no assunto num discurso de 1950: “Não confio em reformistas. Quando alguém ou um grupo pede ‘poder para fazer o bem’, meu impulso é dizer: Mas claro, quem no mundo precisaria de poder por outra razão?”.
Todos os presidentes do Brasil foram e são contra a mais importante das reformas, também conhecida como “privatização”. Pensam como Geisel (CPDOC-FGV) e como FHC, que almoçou com o general: “Conversamos sobre petróleo. Geisel é contra a privatização das refinarias, da Petrobrás e da Vale. Eu mesmo tenho minhas dúvidas o que deve ser feito com um instrumento importante de política econômica”, conforme contra no Diários da Presidência de FHC.
Traria clareza à retórica política aposentar o verbo reformar e substituí-lo por “abolir”. Quem introduziu tal verbo no discurso político foi Ludwig Erhard por ocasião do anúncio da reforma monetária de 1948, na Alemanha, que mudou muitas regras do jogo. Foi chamado a Bizone (administração dos aliados) e ameaçado de prisão por ter reformado as leis. Em resposta, Erhard disse simplesmente: “Eu não as reformei. Eu as aboli”. Enfim, ele não foi preso e o resultado ficou conhecido como o “milagre alemão”.
O Nobel de 1993, Douglass North, também defendeu a abolição de certas regras. “O desempenho econômico é função das instituições e de sua evolução. Juntamente com a tecnologia empregada, elas determinam os custos de transação e produção. As instituições constituem as regras do jogo numa sociedade. Se em determinada sociedade, a pirataria oferece os melhores retornos, as organizações investirão em conhecimentos que produzam os melhores piratas”, escreveu ele em Custos de Transação, Instituições e Desenvolvimento Econômico. Para North, abolindo certas regras do jogo, as organizações piratas definharão e as organizações produtivas florescerão.
Desde 2016 estamos abolindo regras do jogo que atiçavam os piratas. Quando a União e estados, vendem suas estatais, subsidiárias e imóveis; ou quando concessionam metrôs, parques, rodovias, aeroportos, portos, ferrovias, saneamento, eletricidade e gás, estamos abolindo o ineficiente e corrupto Estado Empresário. Quando os serviços públicos são digitalizados, quanto se demora dois dias para abrir uma empresa, o Estado Babá está sendo abolido. Quando se facilita a recuperação judicial de empresas e os empreendedores têm outra chance, o Estado Regulador está sendo abolido.
Com um Banco Central independente dos humores do Executivo e todos os poderes conscientes que as políticas fiscais e monetária estão entrelaçadas, os brasileiros pobres serão beneficiados. A redução do imposto inflacionário e a redução de alíquotas de outros impostos funciona como uma injeção de renda na veia dos pobres. Em alguns estados, o ICMS chegava a 51,5% do preço da gasolina. Na conta de eletricidade, 49% são encargos. Na telefônica, os encargos são igualmente altos. Nos gastos com gás, gasolina, eletricidade e telefonia chegavam a 40% da renda de uma família com renda de 1,5 salários mínimos. Quando se retira a cunha fiscal da intermediação financeira com a abolição do IOF, todos ganham. Então o Estado Cara de Pau começa ser abolido. Mas há resistência em se reduzir esses tributos. O Estado capricha no uso do discurso mágico de que “a redução de tributos nos combustíveis e eletricidade pode custar muito”. Mas custa para quem? Para os governos, que não devolvem nem metade do arrecado em serviços básicos de qualidade para a população.
As políticas de incentivo à indústria igualmente são desnecessárias. Fala-se muito que a única chance de dar emprego decente para a população é reindustrializando o país, mas se esquece de que a importância do emprego industrial cai no mundo todo desde os anos 80. Nos EUA, o emprego industrial caiu vertiginosamente, a produção industrial continua crescendo. A indústria moderna não cria empregos. Propostas de “políticas industriais” são só outra forma de protecionismo.
No comércio exterior, quando as tarifas externas de importação são reduzidas, o Estado Protecionista está sendo abolido e o setor industrial submetido à competição. A indústria brasileira necessita e merece ter menos encargos tributários, trabalhistas e regulatórios para ser competitiva. Impostos chegam aos insumos industriais e outros impostos são recolhidos antes dos produtos saírem das fábricas. Impostos como o IPI e sobre a folha de pagamentos justificam o protecionismo industrial.
A abolição do Estado Empresário, do Estado Babá, do Estado Provedor e do Estado Cara de Pau, irá permitir aos brasileiros florescerem. “Florescer” é conceito feliz do Nobel de 2006 Edmund Phelps. Ele explica esse conceito no livro Mass Flourishing, de 2014, onde defende que florescer é um direito humano.
É muito mais difícil reverter regras do jogo abolidas do que reverter reformas. E a democracia agradece. O tecido social brasileiro está muito mais resistente a aventuras políticas. Tal melhora é visível ao setor privado nacional e internacional. Não estão dando bola para o ruído ensurdecedor vindo de Brasília sobre as eleições.
Empreendedores privados são descobridores de oportunidades. Olham para o futuro e notam que o Brasil é cheio de oportunidades. Notam que com certas regras do jogo sendo abolidas melhorou muito o ambiente para seus investimentos. A relação investimentos/PIB aumentou de 14% para 19% nos últimos quatro anos. Os investimentos privados comprometidos já são um trilhão de reais para os próximos dez anos. Sem contar os investimentos privados voluntários, que também são enormes. Em mais dois anos, será visível o florescimento dos brasileiros.
Odemiro Fonseca é formado pela Escola de Administração e Economia – AESP da FGV e pós-graduado pela Wharton School (EUA). Foi empresário do ramo de alimentação e construção civil.
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