Operadoras e prestadores não podem depender exclusivamente de reajustes para recompor margens. Devem buscar novas formas de gestão
A discussão sobre a remuneração médica na saúde suplementar não pode ser feita isoladamente da revisão de formas de remuneração como um todo da rede credenciada ou referenciada de prestadores de serviços médico-hospitalares. Essa equação envolve honorários médicos, consultas, taxas e diárias hospitalares, materiais e medicamentos etc.
Para o reajuste desses honorários e taxas, há uma expectativa em relação a um simples repasse do índice de aumento concedido às mensalidades pagas pelos usuários às operadoras de planos. O próprio índice de aumento dos planos, no entanto, não pode ser descolado da análise da variação dos custos médico-hospitalares (VCMH).
O VCMH é composto por dois principais itens: a variação da quantidade de serviços utilizados, medida pela frequência média per capta anual de um procedimento, e a variação do preço médio do procedimento. Esse índice de custos se mantém próximo dos 12% desde outubro de 2009, acima, portanto, dos reajustes das mensalidades (6,76%, em 2009, e 6,73%, em 2010) e do IPCA (abaixo de 5%).
Ao contrário das operadoras, os prestadores de serviço não têm seus custos afetados pela variação de frequência, já que cobram por procedimento realizado. Para o prestador, importa apenas a variação de custo dos insumos utilizados, pois quanto maior a frequência maior sua receita.
Vejamos o que aconteceu nos últimos anos. Segundo dados do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), se comparada ao ano de 2006, a frequência de consultas aumentou 4,1% em 2008, mais 3,9% em 2009, e a tendência de aumento se mantém em 2010. No mesmo período, os preços pagos pelas consultas foram reajustados em 9% (2008), mais 6,1% (2009), e 5,85%, nos 12 meses terminados em março de 2010. Os custos das operadoras com esse item aumentaram 13,5% (2008/07), mais 10,1% (2009/08), e mais 8,18% nos doze meses terminados em março de 2010.
Observamos que o índice acumulado de reajuste do valor pago pelas consultas está acima do IPCA e do reajuste concedido aos planos.
Em relação à frequência e ao reajuste dos valores pagos por exames, por exemplo, a tabela de variação de custos também foi maior. A frequência de exames realizados aumentou 7,4% de 2007 a 2008, e 5,3% de 2008 a 2009, e segue aumentando em 2010 (5,5% nos doze meses encerrados em março). Os preços pagos pelos procedimentos nesse período foram reajustados, em média, 0,9% em 2008, 3,3% em 2009 e 3,02 em 2010. Já os custos das operadoras aumentaram 8,4% (2008), 8,8 (2009) e 8,23% (2010).
Como se vê, a conta não é simples. Deve considerar diversas variáveis. Além dos preços dos procedimentos e da frequência de uso, o reajuste anual das operadoras reflete a introdução de novas tecnologias e a ampliação do rol de coberturas.
Não se pode, portanto, aplicar aumentos aos prestadores de serviço repassando pura e simplesmente índices de reajustes concedidos aos planos ou a variação da inflação medida pelo IPCA. A revisão das tabelas, sem observar todas as variáveis, poderia ocasionar um impacto ainda maior no custo das operadoras e um consequente aumento dos valores das mensalidades pagas pelos usuários em níveis, talvez, muito superiores aos atuais.
As operadoras de saúde suplementar são gestoras de recursos dos usuários. A elas cabe administrar esses recursos de forma responsável para garantir a qualidade e a continuidade dos serviços prestados.
Na última década, o sistema de saúde brasileiro, sobretudo o de saúde suplementar, passou por profundas transformações. Foram mudanças estruturais importantes que exigiram um olhar sistêmico para a consolidação de um novo mercado. O tamanho e o alcance dessas mudanças exigiram uma reengenharia nos processos técnicos, legais e regulatórios.
O setor de saúde suplementar trabalha permanentemente para se adequar aos constantes aperfeiçoamentos do sistema promovidos pelas atualizações da regulação. O objetivo é garantir um atendimento justo e de qualidade a 44 milhões de usuários de planos e de seguros de saúde no Brasil. Para isso, operadoras e prestadores não podem depender exclusivamente de reajustes para recompor margens. Devem, sobretudo, buscar novas formas de gestão e novos processos para aumentar a eficiência da prestação dos serviços e garantir o equilíbrio do sistema.
José Cechin é diretor-executivo da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde).
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