Se Nova York já é charmosa o ano todo, o charme se transforma em sedução irresistível na época do Natal. A árvore iluminada do Rockefeller Center, milhões de pessoas nas ruas, nas lojas e nos parques, o trânsito mais caótico que o habitual, as indefectíveis sirenes de ambulância e as buzinas tonitruantes dos carros de bombeiros que são a trilha sonora da cidade... Tudo isso cria um ambiente único e inesquecível.
E daí vêm as crônicas do Natal, para provar que, nesta época, as coisas não obedecem a um padrão rotineiro e estão carregadas de magia: desta vez é o caso de um cego que caiu nos trilhos do metrô com seu cão-guia poucos segundos antes de que um trem chegasse à estação. Milagrosamente, o cego se alojou entre os trilhos e o trem passou por ele sem feri-lo gravemente. E o cachorro, solidário, aninhou-se junto ao seu dono, lambendo seu rosto durante todo o drama. De chorar de emoção, não é mesmo? Mas tem mais: Orlando, o cachorro, está prestes a se aposentar e o cego não tinha como comprar e treinar outro cão-guia, o que custa uma fortuna; em 24 horas, doadores anônimos depositaram mais de US$ 50 mil na conta da vítima do acidente... É o espírito do Natal? Acho que sim.
A vida nos trouxe várias vezes a esta cidade mágica, por razões profissionais e pessoais nas mais diversas circunstâncias. De uma delas me lembro especialmente, acontecida logo após o episódio do 11 de Setembro, quando a cidade ainda se recuperava do estupor causado pelo ataque terrorista às torres do World Trade Center. Contei, em um texto da época, o que presenciamos na Times Square: um carro de bombeiros sendo aplaudido à sua passagem; não admira, pois mais de 300 bombeiros de Nova York morreram heroicamente nos escombros das torres. No local do desastre, máquinas ainda tiravam o entulho dos prédios no local denominado de Ground Zero, uma tarefa macabra porque grande parte das vítimas humanas nunca foi recuperada e seus despojos estavam misturados aos detritos. Apesar disso tudo, a cidade recuperou seu dinamismo e seu entusiasmo rapidamente.
Michael Bloomberg está deixando a prefeitura da cidade depois de imprimir sua marca como administrador e político à altura da cidade. Bilionário, pagou as próprias campanhas do bolso para não ficar refém dos interesses dos financiadores; frequentemente vai para o trabalho de metrô ou ônibus para conversar com a população, mas nunca escorregou para a demagogia, preservando ferrenhamente sua vida pessoal e familiar da imprensa e da curiosidade pública. Em sua gestão, a cidade se transformou novamente em uma potência econômica, mas, apesar de seu papel como líder do capitalismo norte-americano, desenvolveu uma agenda social muito mais ampla que seus opositores supostamente "sociais", investindo fortemente na educação pública, na habitação e no transporte público, entrando em choque com grandes lobbies econômicos ao proibir o fumo em toda a cidade, lutar contra a obesidade, o excesso de lixo e a poluição, apoiando as causas ambientalistas. Manteve e ampliou o esforço na área de segurança, o que transformou Nova York em uma cidade com índices de criminalidade inferiores aos de Curitiba.
Curiosamente, há uma enorme desinformação na imprensa e na academia brasileira sobre esta cidade e este país. A cada vinda minha, me sinto como alguém que vai fazer uma visita de pêsames, pois a morte iminente do capitalismo norte-americano é anunciada há décadas em nosso país nas universidades e nos jornais. Mas os fatos teimam em desafiar as teorias: no terceiro trimestre deste ano, a economia norte-americana cresceu a uma taxa de 3,5% ao ano (que inveja, hein, Dilma e Mantega?); o consumo está em alta e o desemprego está em baixa acelerada.
Pelo jeito, aplica-se aos Estados Unidos e a Nova York a famosa frase de Mark Twain: "As notícias sobre minha morte são prematuras e exageradas".
Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.
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