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A responsabilidade civil e penal nos casos de abandono afetivo de idosos
| Foto: Pixabay

A Constituição Cidadã de 1988 determina, em seu artigo 229 que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Nas últimas décadas, a longevidade do brasileiro aumentou para um patamar próximo dos 80 anos. Apesar de representar um grande avanço em alguns setores da sociedade, surpreendentemente, a família não acompanhou este progresso e, insidiosamente, tenta eximir-se da responsabilidade do cuidado para com os pais, principalmente os idosos.

Em socorro à crescente desconsideração, a Lei 10.741/2003, Estatuto do Idoso, já em seu Art. 3º, prevê a obrigação de a família assegurar à pessoa idosa, com absoluta prioridade: a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

O direito à habitação é amparado pelo art. 37 do Estatuto do Idoso, cujo texto determina que a pessoa idosa tem direito à moradia digna, no seio da família natural ou substituta, ou desacompanhada de seus familiares, quando assim o desejar, ou ainda, em instituição pública ou privada.

O Estatuto é rigoroso quanto às punições previstas para os infratores de um tema frágil, real e contemporâneo. Assim, o artigo 98 prevê detenção de 6 meses a 3 anos e multa, no caso de abandono de pessoa idosa, em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência, ou congêneres, ou na hipótese  de não prover suas necessidades básicas, quando obrigado por lei ou mandado.

Por seu turno, o artigo 97 cuida da punição por omissão de socorro à pessoa idosa, cujo texto impõe pena de 6 meses a 1 ano e multa para quem deixar de prestar assistência à pessoa idosa, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde, sem justa causa, ou não pedir nesses casos, o socorro de autoridade pública, aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta de morte.

Na esfera penal, o Código Penal prevê, em seu art. 244, detenção de 1(um) a 4(quatro) anos e multa, de 1 a 10 vezes o maior salário  mínimo vigente no país para quem deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; e deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo. Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada.

Vale registrar que, além da legislação vigente, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei  4229/2019 que prevê a responsabilização civil subjetiva dos filhos por abandono afetivo, no caso do descumprimento do dever de cuidado, amparo e proteção do idoso, pelo dano gerado a ele sentimento de isolamento, de solidão, quadros depressivos, entre outros.

O tempo é inexorável, logo, nos tornaremos estatística de complexos enredos familiares, com desfechos imprevisíveis. A equação básica de crescimento mostra um exponencial aumento do número de idosos. Prevê-se, no curto prazo, verdadeira explosão de demanda social, envolvendo cidadãos da terceira idade, exigindo especial atenção dos familiares e do Estado.

Emerge uma sombria dúvida, considerando-se o crescente desinteresse familiar em cuidar de seus idosos, estará o Estado preparado para atender exponencial demanda? A função precípua do Poder Judiciário é a de guardar a Constituição e aplicar a lei ao fato concreto, que o faça com a maior celeridade e isenção possíveis, particularmente para evitar a ocorrência indesejável da máxima de Rui Barbosa: “Justiça tardia é injustiça institucionalizada”.

Antonio Riccitelli é advogado, administrador, consultor jurídico, mestre e P.h.D em Direito. É membro do Conselho Jurídico da InvestBrasil, coordenador de Direitos Humanos da Comissão do Acadêmico de Direito da OAB/SP.

Conteúdo editado por:Jocelaine Santos
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