| Foto: Felipe Lima

Estamos acompanhando manifestações contra o projeto de lei 9.302/2017, que estabelece regras de exigência de conteúdo local nos empreendimentos de petróleo e gás. Seus críticos consideram que o PL contraria a chamada “flexibilização” recente, que tem sido alardeada como decisiva para relançar “exitosos” leilões de petróleo. Por esse motivo, caracterizam o texto como ameaça aos futuros leilões e como um retrocesso – o que, absolutamente, não é verdade.

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Infelizmente, toda a análise propalada por alguns segmentos do setor de óleo e gás é parcial e não representa a realidade, quando considerada a economia do país como um todo. Não basta o Brasil produzir petróleo para se tornar um importante exportador. O petróleo tem de gerar empregos aqui e, mesmo que o recurso dos royalties gerados vá para a educação, nada se resolve se não houver emprego para os formados.

O remédio para alguns segmentos está se tornando um veneno para todo o restante da sociedade brasileira

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A partir do surgimento da Petrobras, em 1953, o Brasil conseguiu implantar em seu território um competente parque industrial e tecnológico, equiparado ao dos principais países desenvolvidos. Cabe lembrar que a maioria das empresas hoje instaladas é constituída por filiais das principais empresas transnacionais, porém com CNPJ (portanto, empresas nacionais) e gerando aqui emprego e renda.

Logo, declarações de autoridades e algumas entidades sobre baixa produtividade ou carência de tecnologia local para uso imediato não correspondem à realidade. As fábricas são as mesmas e, na maioria dos casos, até mais modernas; a tecnologia é a mesma; a gestão é a mesma. E a esmagadora maioria dos fornecedores do terceiro elo da cadeia de fornecimento para a indústria de petróleo não esteve envolvida nas investigações da Operação Lava Jato.

O que é lamentável é que tais benefícios, ou incentivos, não permearam toda a cadeia de valor e ainda mudaram radicalmente condições já estabelecidas e firmadas em contratos, modificando premissas que levaram a elevados investimentos em instalações aqui.

Por que beneficiar só uma parte do setor, e justamente a que menos contribui para a geração de emprego e renda?

Os valores estabelecidos no PL em questão são perfeitamente exequíveis, cabendo observar, apenas como exemplo, que na recém-concluída plataforma P-76 foram alcançados índices bem superiores àqueles constantes no projeto de lei. São igualmente compatíveis com um mínimo que as empresas que exploram uma riqueza da sociedade brasileira devem ter a obrigação de retornar para essa mesma sociedade. Uma contrapartida para o privilégio de explorar um bem da União. Lembro, ainda, que a União pertence aos brasileiros, incluindo aqueles que estão desempregados e aqueles que têm subempregos.

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Vale lembrar o exemplo dos países do Atlântico Norte, como Noruega e Reino Unido, que transformaram um bem mineral finito em riquezas para seus países, deixando de ser exportadores de petróleo e passando a ser exportadores de máquinas e equipamentos. Terminando, vale lembrar o velho ditado: a diferença entre o remédio e o veneno é a dose. Nesse caso, o remédio para alguns segmentos está se tornando um veneno para todo o restante da sociedade brasileira.

Assim, em vez de retrocesso no conteúdo local, o PL trará progresso para o desenvolvimento nacional. Retrocesso será voltar aos anos 70, quando o Brasil importava todos os equipamentos e depois tinha de, a duras penas, buscar a substituição de importações de partes e peças para conseguir manter a continuidade operacional.

Alberto Machado Neto, professor e coordenador acadêmico da FGV, é diretor-executivo de Petróleo, Gás Natural, Bioenergia e Petroquímica da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).