O ministro da Saúde, Ricardo Barros, ao passar por Ponta Grossa em 24 de junho, foi muito infeliz ao afirmar que “é melhor ter um médico cubano do que um farmacêutico ou uma benzedeira para atender à população”. Na ocasião, o ministro estava anunciando que o programa Mais Médicos será prorrogado, mas o coitado não conseguiu se expressar direito, certamente por desconhecer as minúcias de uma área tão complexa como a saúde.

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Mas a culpa não é dele. Ele foi escalado, sabe-se lá por qual motivo, para assumir uma pasta que conhece muito pouco, como bem demonstrado pela sua fala. A sua trajetória também mostra isso. Engenheiro civil, filho de prefeito, prefeito, irmão de prefeito, deputado federal, deputado federal, deputado federal e deputado federal. Agora ministro. Esqueceram de falar para ele que um sólido conhecimento em política não “resolve” a saúde. A saúde transcende questões políticas ou partidárias e nenhuma contribuição poderá ser dada por alguém alheio às discussões técnicas e sociais sobre saúde (tanto as mais recentes quanto as mais “clássicas”, como as relacionadas com o movimento da reforma sanitária ou a luta antimanicomial, por exemplo).

Um sólido conhecimento em política não “resolve” a saúde

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Falar que “é melhor um médico cubano do que um farmacêutico ou benzedeira” é, no mínimo, um desrespeito com o trabalho exercido dignamente pelos farmacêuticos e benzedeiras. O ministro mostra que não entende nada sobre equipe multidisciplinar de atenção à saúde. Os farmacêuticos desempenham um importante papel, inclusive com atividades privativas, as quais não podem ser exercidas por nenhum outro profissional, sob risco de tal prática ser enquadrada como exercício ilegal da farmácia.

Em relação às benzedeiras, o ministro foi igualmente deselegante, diminuindo a importância do trabalho de tantas mulheres (e homens, já que há benzedores). O município de Rebouças, por exemplo, na vanguarda do reconhecimento das práticas terapêuticas populares, incorporou as benzedeiras locais nas equipes de saúde. Os benzimentos são considerados práticas complementares que, somadas às práticas convencionais da medicina, colaboram para a melhora do paciente, sobretudo por estarem inseridas na matriz cultural do paciente. Vale ressaltar que os benzimentos constituem o saber popular, coletivamente construído e adotado há diversas gerações. As benzedeiras, portanto, integram, de forma oficial ou não, o sistema de saúde. Quando o ministro desconsidera a importância de uma equipe multidisciplinar para garantir um atendimento integral ao paciente, atenta contra o Sistema Único de Saúde (SUS), pois vai de encontro à integralidade, um dos princípios basilares do SUS.

Mas as ofensas não foram dirigidas apenas aos farmacêuticos e benzedeiras. A fala do ministro coloca os médicos cubanos numa posição extremamente inferiorizada. O ministro, ao afirmar que “é melhor um médico cubano do que um farmacêutico ou benzedeira”, quis dizer que “é melhor um médico cubano do que nada” (leia-se “nada” como “farmacêuticos e benzedeiras”). Na falta de um médico “médico”, portanto, serve um médico cubano. Numa clara atitude discriminatória e classificatória, o ministro hierarquizou todos esses profissionais de saúde, distinguindo médicos cubanos de médicos não cubanos. Esse equívoco não é criação do nosso ministro. O próprio programa Mais Médicos já começou errado, na sua concepção, ao criar duas categorias distintas de médico. Ao impedir que médicos contratados pelo programa atuem fora do SUS, priva esses profissionais da liberdade de atuação em todos os segmentos passíveis de atuação profissional médica. Com tanta confusão, quem sofre é a população, pois o sistema de saúde deve ficar doente, fruto da percepção equivocada sobre como organizar um sistema tão complexo, tão peculiar e tão frágil.

Rodrigo Batista de Almeida é professor do curso de Farmácia do Instituto Federal do Paraná (IFPR), câmpus Palmas.