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É fato que os educadores – aqueles “de alma” e especialmente os da educação básica – estendem a tarefa sutil, reflexiva e crítica de observadores dos comportamentos humanos mesmo nas merecidas e esperadas férias. Não importa: seja diante de um lindo mar azul, seja em um restaurante, se virem uma criança brincar, andar, se alimentar ou se expressar, ali haverá interesse em observar atentamente as potencialidades e habilidades desse ser em pleno desenvolvimento.
Próprio da vocação de educadores, é quase que intuitivo o encantamento perante as nuances do comportamento humano. Sob a aura de um olhar refinado, essas tantas observações os tornam ainda mais sensíveis à prática escolar, uma vez que, somadas às leituras que os acompanham, renovam o repertório sobre a realidade, completando o sentido da vida e compreendendo melhor a sociedade que os cerca.
O ato de educar deve ser bem-feito: dar atenção, olhar e escutar os filhos, diminuir acertadamente o uso de telas, acompanhar, conviver, ensinar a perder, chorar junto, admirar-se, competir, pular.
No entanto, como educadores, o difícil é não ficarem estarrecidos com as situações cada vez mais frequentes, por exemplo, em um dia típico de verão em família. Sem generalizar, mas, na tentativa de expor uma percepção da realidade, tem sido chocante deparar-se com cenas frequentes de pais na piscina e os filhos (pasmem!) sentados na cadeira com os olhos pregados em seus celulares.
Já o típico cenário praiano composto por baldinhos, pazinhas e filhos puxando os pais para o mar faz parte do passado, pois, de maneira geral, muitos ficam sentados na cadeira de praia, não contemplando a paisagem, resguardando-se em uma sombra ou descansando suas mentes, mas imersos no mundo solitário do dispositivo móvel. Em restaurantes, idem: muitas crianças só param para comer diante de uma tela, momento que, enfim, os pais dizem ter um minuto de paz. Não é raro ainda ver crianças assistindo a vídeos no celular enquanto caminham ao lado dos pais na avenida beira-mar. Por óbvio, decorrem desse fato trombadas com estranhos e tropeços no percurso.
Diante de circunstâncias dessa natureza, os educadores “de alma” sangram, pois veem, no desastre de algumas famílias disfuncionais, crianças sendo transferidas de uma cadeira a outra, com pouca atenção. Por falta de convivência, proximidade e presença, os limites são impostos de maneira severa, sem explicação, em voz alta e de forma moralista. E mais: com muitos nãos. As crianças seguem o fluxo... respondem, fazem birra e, com tanta imersão em telas, replicam de youtubers ou influenciadores exemplos para linguagem, discussão com os pais e ação.
Sem muita lógica, momentos depois, lá estão todos da família juntos, buscando o melhor ângulo, fazendo o show acontecer, escolhendo a imagem ideal, adequando a posição, aguardando o pôr do sol mais impressionante e a maior curtição. Longe da linda memória de amor, muitos buscam na foto a chance de angariar mais um seguidor.
Há muito a ser ponderado, afinal, educadores não têm o direito de serem medianos. Regra geral, vale a adaptação do pensamento de Leonardo da Vinci, que encontrou na simplicidade o maior nível de sofisticação. Educar, embora trabalhoso e árduo, é básico e elementar.
No entanto, o ato de educar deve ser bem-feito: dar atenção, olhar e escutar os filhos, diminuir acertadamente o uso de telas, acompanhar, conviver, ensinar a perder, chorar junto, admirar-se, competir, pular, pegar na mão, acariciar... De forma consciente e madura, muito embora alguns pais infantilizem a relação com os filhos. É urgente ensinar às crianças princípios de convivência, cuidado consigo mesmas e com o próximo, espiritualidade, disciplina e sustentabilidade. Resumindo: o básico!
Assim como na vida (autoconhecimento) e na gestão (foco), há momentos em que a maior inovação consiste na habilidade de uma pessoa ou organização conseguir realizar o básico perfeito, ou seja, reconhecer a essência de algo, realizando-a com maestria. Quantos relacionamentos, quantas empresas e quantas escolas fracassam por não conseguirem fazer, no mínimo, o básico bem-feito.
Diante dessa realidade e em favor de uma geração melhor, educadores “de alma”retornam à escola em 2023 já sabendo que o básico precisa ser retomado, especialmente com as famílias, sob pena de, ao fazerem somente o trivial, sacrificarem o essencial com aqueles que mais amam. É preciso corrigir a rota.
Haroldo Andriguetto Junior é pai, doutor em Educação, diretor da Escola O Pequeno Polegar, e vice-presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado do Paraná (SINEPE/PR).