O início do governo Lula foi cercado por expectativas de como se daria a relação do Poder Executivo com o Congresso Nacional. Após um semestre de relação entre ambos os Poderes, notou-se que a articulação feita pelo presente governo não seria tão fácil, se comparada às anteriores gestões do petista. Percebeu-se que as pautas encampadas pelo presidente da Câmara dos Deputados, o deputado Arthur Lira, teriam maior facilidade para serem aprovadas, tal como ocorreu no contexto da Reforma Tributária e do Arcabouço Fiscal. O apoio de Lira, inclusive, passou a ser um quesito essencial para que pautas governistas pudessem ter sucesso. Neste período, houve algumas críticas da articulação do governo com o Parlamento e da real base governista Congresso Nacional.
Esse cenário tem levado o presidente da República a considerar algumas mudanças nos ministérios, com o objetivo de fortalecer apoio de parlamentares a suas pautas no segundo semestre. A primeira mudança foi a substituição de Daniela Carneiro por Celso Sabino (União/PA) na pasta do Turismo, para que o governo possa ter maior apoio dentro de um partido-chave no Congresso, o União Brasil. As possíveis trocas não param no Ministério do Turismo, uma vez que há possibilidade de mudanças em outras pastas, tais como no Ministério do Desenvolvimento Social, no do Esportes e no do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Se essas alterações se concretizarem, ficará ainda mais evidente o esforço do governo para contemplar outros partidos e fortalecer sua base, com o fim de evitar possíveis derrotas no segundo semestre do primeiro ano de mandato.
O segundo semestre de 2023 está cercado de expectativas no Congresso Nacional e temas de enorme relevância nacional serão debatidos nas Casa Legislativas.
As principais pautas nos próximos meses no Congresso Nacional devem envolver questões econômicas, regulação em tecnologia e apostas esportivas, comissões parlamentares de inquérito, entre outros temas. Vejamos os principais deles:
Marco Fiscal e reforma tributária: Os temas de maior interesse nacional no momento se concentram em questões fiscais. O Marco Fiscal sofreu alterações no Senado Federal e voltará à Câmara dos Deputados – o senador Omar Aziz (PSD/AM), relator da proposta no Senado, incluiu novas exceções à lista do conjunto de despesas que serão excluídas das regras que limitam o aumento de gastos, tais como a complementação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e despesas nas áreas de inovação, ciência e tecnologia. Em relação à reforma tributária, o Senado ainda aguarda o envio da proposta pela Câmara dos Deputados e já houve definição de quem será o relator, o senador Eduardo Braga (MDB/AM). A tendência é de que haja tramitação célere da reforma no Senado, já que não parece haver oposição o suficiente para barrá-la, embora possam ser apresentadas emendas ao texto e, caso haja mudança substancial na proposta, esta deverá ser analisada novamente pela Câmara.
O que também está à prova é a capacidade de o governo se articular com sua base, a fim de aprovar matérias de seu interesse.
Regulação de apostas esportivas: Outro tema que tende a ser debatido é a medida provisória que regulamentará as apostas esportivas no Brasil. O assunto ganhou evidência nos últimos meses, principalmente por causa do esquema de fraudes, que levou, inclusive, à abertura de uma CPI, ainda em funcionamento. O governo já se manifestou no sentido de o tema ser uma prioridade do Ministério da Fazenda e a medida tem ganhado ainda mais importância, dado que se pretende gerar receita de aproximadamente R$ 15 bilhões, segundo fontes do governo.
Marco regulatório de Inteligência Artificial: Com a inviabilidade de aprovação do PL das Fake News no primeiro semestre, mesmo com o esforço governamental, há expectativa para que se iniciem discussões acerca da regulação de inteligência artificial no Brasil, assim como tem ocorrido na Europa e nos EUA. O presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco (PSD/MG), apresentou o Projeto de Lei 2338/2023, com base no anteprojeto aprovado pela comissão de juristas criada no Senado Federal para discutir a regulação da matéria. Há outras propostas em tramitação na Casa sobre o mesmo tema, mas que são completamente antagônicas, tal como o PL 21/2020. A expectativa é de que seja aberta uma Comissão Especial logo após o recesso legislativo e o relator da matéria será o senador Eduardo Gomes.
Comissões parlamentares de inquéritos: Os próximos meses marcarão o fim de CPIs que movimentaram o Congresso Nacional no primeiro semestre, mas que até o presente momento pouco afetaram o governo atual. A principal delas é a CPMI dos atos antidemocráticos, que tem sido a mais polêmica. Além dela, há as CPIs na Câmara dos Deputados: a do Movimento Sem Terra, a da fraude nas Americanas e a de manipulação em apostas esportivas.
Projeto do Marco Temporal: O PL 2903/2023 foi polêmico na Câmara dos Deputados e representou uma derrota do governo. Em suma, a proposta restringe a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por estes povos antes da promulgação da Constituição Federal. No Senado, a proposta ainda será debatida nas Comissões de Agricultura e Reforma Agrária e de Constituição e Justiça. Nesse sentido, não deve adquirir o caráter urgente que teve na Câmara.
Como se vê, o segundo semestre de 2023 está cercado de expectativas no Congresso Nacional e temas de enorme relevância nacional serão debatidos nas Casa Legislativas. O que também está à prova é a capacidade de o governo se articular com sua base, a fim de aprovar matérias de seu interesse. As recentes movimentações em pastas do Executivo, as conversas com partidos que, até então, não se mostraram como base governista e o envolvimento direto do presidente Lula nas articulações com o Poder Legislativo, principalmente com o Arthur Lira, demonstram que haverá um esforço considerável por parte do governo em aprovar suas pautas.
Brunno Carmona Calado, advogado na área de Relações Governamentais do Almeida Advogados, tem MBA em Relações Governamentais pela Fundação Getúlio Vargas.
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