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Segurança jurídica e segurança alimentar

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Imagem ilustrativa. (Foto: Marcelo Andrade/Arquivo/Gazeta do Povo)

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Nossa Constituição Federal, que institui o Estado Democrático de Direito, assegura não só o direito à propriedade como fundamental (art. 5º); mas garante o desenvolvimento nacional (art. 3º), destacando a política agrícola como essencial, principalmente em seu artigo 187. Desde minha função anterior, como secretária da Família, pude acompanhar a agricultura familiar, levando programas de fortalecimento de vínculos familiares, a pedido da então ministra e hoje senadora Tereza Cristina, de modo a dar continuidade ao negócio, que se demonstrara especialmente importante durante a pandemia e que ocupa hoje, 45% da força agrícola.

No início deste ano, assumindo a gerência jurídica da FAESP e passando a integrar seu Conselho Jurídico, bem como da CNA e da FIESP, tenho comprovado a força do agro negócio e a necessidade de oferecer plataforma e segurança jurídica para alavancá-lo, unindo produtores e agricultores, em um ganha-ganha, além de potencializar a agricultura familiar, já que o Brasil, responsável por um prato em cada cinco no mundo, tem capacidade de garantir a segurança alimentar em larga escala, se projetamos devidamente o setor, entre poderes e sociedade civil, como dita e resguarda a lei.

Seguimos acreditando na força que a lei deve ter em um Estado Democrático de Direito, bem como no senso de justiça dos integrantes do Poder Judiciário.

Porém, a instabilidade entrou no país desde janeiro, começando pelo estímulo – ou, pelo menos, compactuação – com as invasões de terras camufladas de “ocupação”; impostos mal exigidos, como, por exemplo, o salário educação e o ITCMD; direito adquirido sobre regime jurídico, nas horas in itinere etc., gerando perplexidade pelo prognóstico de injustiça com aqueles que trabalham produtivamente a terra.

Nesse sentido, quero destacar especialmente o que se refere ao denominado Cartel da Laranja, que vigorou entre 1999 e 2006 no Brasil, reduzindo praticamente o número de citricultores, incluindo a agricultura familiar, de 55.000 para 5.000 – muitos levados à falência –, ao dominar 80% da produção nacional. À época, a FAESP teve um protagonismo imediato para impedir a atuação do Cartel – já que 75% das pequenas e médias empresas do segmento estão em São Paulo, maior Estado produtor, além de visar a proteção das demais regiões –, recorrendo também ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que concluiu acordo para pagamento de 301 milhões de reais pelas empresas.

Vemos decisivo para o Brasil uma condenação expressa à prática de cartel que vai se estendendo, como na área da borracha ou da carne.

A ação continua em andamento no Reino Unido, por processo paralelo de citricultores à Cutrale. Para impedir a prescrição, recentemente o MPF denunciou novamente o Cartel, requisitando o pagamento de 12, 7 bilhões de reais em reparação de danos causados pelo esquema pelas empresas envolvidas, tais como a Citrosuco, Cutrale e Louis Dreyfus Company (LDC): 8,5 bilhões de reais de indenização por danos financeiros e 4,2 bilhões de reais por dano moral coletivo. Não se pode deixar de destacar também a lesão aos consumidores, também pleiteada pelo MPF. A procuradora da República Karen Kahn, que também está nos acompanhando na reinvindicação, contesta, conosco, o sigilo judicial, em uma ação que afeta sobremaneira o público, já que não se comprova a reversão do quadro, desde a decisão em 2016. O silêncio dos envolvidos e a alegação de falta de notificação tornam ainda mais obscura e suspeita a atividade.

De qualquer forma, vemos decisivo para o Brasil uma condenação expressa à prática de cartel que vai se estendendo, como na área da borracha ou da carne, bem como a urgência em proferi-la, já que os processos nessa área – e em outras – em nosso país, chegam a durar mais de 20 anos. Não falta informação nem comprovação, e a corte inglesa já autorizou o seguimento do processo no Reino Unido. A FAESP segue com sua forte colaboração para subsidiar o necessário para que a forma do Direito sustente o mérito, veiculando uma decisão efetivamente justa, já que os réus alegam prescrição, prática lícita e inocência.

A narrativa deste caso específico – que pode analogamente ser aplicado a outras práticas contra legem que vão se fortalecendo – pode servir como reflexão sobre a necessidade fundamental de segurança jurídica para que a segurança alimentar seja garantida, a começar pelas famílias dos citricultores; para a manutenção de preços de mercado acessíveis; para promover oportunidades para todos, visando a totalidade de um desenvolvimento econômico estável e saudável e para ajudar outros países em situação de vulnerabilidade, fomentando a solidariedade internacional.

Seguimos acreditando na força que a lei deve ter em um Estado Democrático de Direito, bem como no senso de justiça dos integrantes do Poder Judiciário – também fundamentado em sua adequada formação jurídica e conhecimento de nossa realidade fática – para que o agronegócio no Brasil possa cumprir sua vocação e missão em nosso território e no mundo, a partir da dimensão continental de nossas terras.

Angela Gandra Martins, Ph-D em Filosofia do Direito, é ex-secretaria nacional da Família, gerente jurídica da FAESP e sócia da Advocacia Gandra Martins Advogados Associados.

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