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Sem partido, sim; com esse projeto, não

O professor que, em vez de ensinar, doutrina, escolheu a profissão errada. Se defende um partido político, quando deveria ensinar a matéria, descumpre seu dever. Se constrange os alunos a participarem de alguma manifestação, age com violência intolerável.

Os projetos de Escola Sem Partido são bons ao abrir o debate, mas o que propõem é um mal ainda maior. Certas premissas procedem, mas outras – “não existe liberdade de expressão no exercício estrito da atividade docente” – são absurdas. Têm princípios positivos: neutralidade religiosa do Estado, pluralismo de ideias, liberdade de aprender e de ensinar, liberdade de consciência e de crença, informação ao estudante sobre seus direitos e vulnerabilidade do educando (embora outros sejam péssimos: o Estado moderno resulta de posições políticas e ideológicas nada neutras; Estado política e ideologicamente neutro é um oximoro). Mas o conteúdo dos projetos contraria seus princípios.

Escolas privadas não necessitam autorização para veicular seus princípios: a opção livre dos pais por aquela escola, com aqueles valores, é suficiente

Por exemplo, determinar educação religiosa e moral de acordo com as convicções dos pais. O filho tem o direito de ver as convicções dos pais em perspectiva, o que é impossível se lhe forem oferecidas – contra o pluralismo – apenas as preferências dos pais. Escolas privadas não necessitam autorização para veicular seus princípios: a opção livre dos pais por aquela escola, com aqueles valores, é suficiente. Não cabe à lei restringir o ensino de teorias às principais ou vedar algumas. Não se combate uma manifestação de ignorância com outra – no final, a ignorância vence. Combate-se ignorância com sabedoria, que emerge em ambientes de divergência e livre debate.

Há vedações de difícil verificação e incompatíveis ao ensino, como proibir tout court – a promoção de interesses pessoais do professor. Um professor com interesse no estado de bem-estar social não pode ser proibido de ensinar que saúde é direito de todos e dever do Estado, nem de avaliar as políticas adotadas.

Exigir a apresentação justa das principais versões, teorias, opiniões e perspectivas sobre questões políticas, socioculturais e econômicas, embora soe correto, é exigir o impossível e empobrecer o ensino. Quais as principais, as mais famosas ou as mais corretas? Na opinião de quem? O que é uma apresentação justa? Apresentação política e ideologicamente neutra não existe. Lembremos Isaiah Berlin: “Os nazistas mataram 6 milhões de judeus na Segunda Guerra”, “6 milhões de judeus morreram na Guerra”, “3% da população morreu”, “90% dos mortos não eram judeus”, são todas proposições verdadeiras, mas nenhuma, nem qualquer outra, ideológica ou politicamente neutra. O professor, estudioso da matéria, não pode ser neutro: deve avaliar e explicar quais as melhores entre as versões, teorias e perspectivas e por que, garantindo e encorajando a discordância. Privar os alunos disso impede seu desenvolvimento. O projeto propõe substituir a valoração do professor pela do Estado fiscalizador.

Embora proclame esses princípios, o projeto, em rigor, viola a liberdade e o pluralismo. Conhecer posições diferentes sem autoritarismo permite ao estudante avaliar os valores dos professores e dos pais, escolher livremente os seus, ou até construir novos valores, superando a geração anterior. Lei que limita a educação dificulta o desenvolvimento, atenta contra a liberdade, o pluralismo e a Constituição.

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