| Foto: Towfiqu Barbhuiya/Unsplash
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As doenças cardiovasculares, segundodados da World Heart Federation, são responsáveis, anualmente, por mais de 20 milhões de óbitos no mundo. No Brasil são cerca de 400 mil óbitos por ano. O controle de fatores de risco, como diabete melito e obesidade, é essencial para o enfrentamento eficiente desse importante problema de saúde pública.

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O emprego dos agonistas do receptor do peptídeo-1 semelhante ao glucagon (GLP-1), novos medicamentos para diabete melito e obesidade, como o Ozempic, têm sido considerado pelos especialistas uma nova fronteira da medicina. As evidências científicas dos seus benefícios são crescentes, incluindo a redução de complicações cardiovasculares.

O tratamento da obesidade é bem mais complexo e multifatorial, depende de dieta saudável e atividade física, além do controle da ansiedade, tem elevado impacto no orçamento público, mesmo sem incluir na conta a “cervejinha com picanha” prometida pelo presidente Lula

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Desde 2010, essa classe de medicamentos está disponível no Brasil, com a aprovação da Liraglutida (Saxenda) para o tratamento do diabete melito tipo 2 pela Anvisa. Mas só em 2018, com o registro da Semaglutida (Ozempic), usada também para o tratamento da obesidade (off-label), foi popularizada no país. Foi aprovada, recentemente, a Tirzepatida (Mounjaro), que parece ser ainda mais eficaz.

A revista Bloomberg Businessweek, em maio de 2023, destacou em sua capa: “As drogas para obesidade podem ser o maior blockbuster da indústria farmacêutica em todos os tempos”. Estima-se que as vendas aumentariam em 30 vezes, caso 1/3 dos obesos graves usem essas medicações, com custo de U$ 27 bilhões/ano para as seguradoras do Medicare, equivalente a 18,5% dos gastos líquidos com medicamentos. No mundo as vendas da indústria farmacêutica podem atingir U$ 150 bilhões/ano (R$ 870 bilhões), equivalente a mais de três vezes o orçamento do Ministério da Saúde do Brasil.

Com base em estudo apresentado recentemente durante as sessões científicas da American Heart Associatione publicado simultaneamente na revista JAMA Cardiology, pesquisadores do Centro Médico Beth Israel, estimam que mais de 137 milhões de adultos norte-americanos se enquadram em uma das indicações dos análogos da GLP-1, sendo importante “garantir o acesso equitativo a esses medicamentos eficazes, mas de alto custo, bem como apoiar os indivíduos para que eles possam permanecer na terapia no longo prazo, deve ser uma prioridade para nossos médicos e formuladores de políticas”.

Em 2023, o Ministério da Saúde negou a incorporação da Liraglutida 3mg para o tratamento de pacientes com obesidade grave, pré-diabetes e alto risco de doença cardiovascular. Segundo a Conitec, os custos do medicamento suplantam o limiar de custo efetividade previsto pela área técnica, o que acarretaria um gasto incremental , ao longo de 5 anos, de R$ 12,6 bilhões para tratar um total de 2,8 milhões de pessoas, com variação de R$ 10,3 bilhões a R$ 14,5 bilhões.

Os novos agonistas GLP-1 como o Ozempic ainda não foram avaliados pela Conitec, mas diante dos elevados preços de mercados, mesmo com eficácia superior, não se enquadrariam dentro dos critérios econômicos vigentes. Na perspectiva da saúde suplementar o cenário ainda é mais intricado, já que a legislação que regula o setor exclui de cobertura os tratamentos domiciliares, exceto os antineoplásicos de uso oral, portanto, ao contrário do que ocorre no Medicare americano, a cobertura pelas operadoras de planos de saúde dos agonistas GLP-1 no Brasil não é obrigatória.

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A indústria farmacêutica inovadora adota como estratégia mercadológica a oferta de medicamentos por preços mais elevados, mesmo que somente uma parcela menor da população tenha acesso, excluindo-se os indivíduos de baixa renda. Acordos de acesso gerenciado, nos quais a indústria aceitar compartilhar risco com os provedores de saúde em face da obtenção de benefícios clínicos, podem facilitar a incorporação dos agonista GLP-1 como o Ozempic, a exemplo do que houve em minha gestão no Ministério da Saúde, com a incorporação do Zolgensma no SUS, para o tratamento da atrofia muscular espinhal.

Os agonistas GLP-1 são mesmo o assunto do momento, para além dos famosos que fazem uso, também foram tema das eleições municipais, já que o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), prometeu disponibilizar a semaglutida na rede pública municipal: “O Rio vai ser uma cidade que não vai ter mais gordinho, todo mundo vai tomar Ozempic nas clínicas da família”. No entanto, como vimos, o tratamento da obesidade é bem mais complexo e multifatorial, depende de dieta saudável e atividade física, além do controle da ansiedade, tem elevado impacto no orçamento público, mesmo sem incluir na conta a “cervejinha com picanha” prometida pelo presidente Lula, pode ser equiparável aos gastos no combate a fome no país, ao menos pelo que depreendemos das estimativas econômicas para incorporação dos agonistas GLP-1 no Brasil e no mundo.

Marcelo Queiroga, especialista em cardiologia, foi ministro da Saúde no governo Bolsonaro.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]