Em 1500, quando, na carta-relatório do Descobrimento do Brasil ao rei português Dom Manoel, o escriba Pero Vaz de Caminha relatou que “aqui em se plantando tudo dá”, jamais poderia imaginar que, 520 anos depois, um bem intangível de imenso valor também estaria brotando de nossa abençoada terra: a esperança. Esta, fundamental no enfrentamento da duríssima crise da Covid-19, é o fruto da resiliência, competência e profissionalismo dos produtores rurais, mulheres e homens que trabalham no campo e todos os demais elos da cadeia produtiva.
O sentimento está expresso, com todas as letras, no Índice de Confiança do Agronegócio (IC Agro), recém-divulgado pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a CropLife Brasil. Ao fechar o terceiro trimestre no patamar recorde de 127 pontos, subindo 15,3 degraus em relação aos três meses imediatamente anteriores, o indicador carrega uma forte mensagem de coragem e superação aos brasileiros.
Cabe explicar a metodologia utilizada: acima de 100, a posição é de otimismo; abaixo desse valor, de pessimismo. É interessante notar que, na composição do índice, o segmento dos entrevistados de “dentro da porteira”, ou seja, os agropecuaristas, é o que apresentou o melhor resultado, com 132,7 pontos, seguido pela agroindústria (123,3) e empresas de insumos agrícolas (122).
Os números são congruentes com o desempenho setorial. A safra de grãos 2019/20, um recorde, está estimada em 257 milhões de toneladas, aumento de 4,8% na comparação com 2018/2019. Quase 70% do aumento refere-se a ganhos de produtividade e eficiência, impulsionados por tecnologia. Ademais, o agronegócio, cujo PIB é de R$ 1,55 trilhão, representa 21,7% do PIB nacional e suas exportações, 43% do total do país, garantindo o superávit de nossa balança comercial, com embarques significativos de produtos como soja, carnes, cereais e do complexo sucroalcooleiro.
O campo não se abateu com a pandemia e ante fatores internos de nosso país passíveis de prejudicá-lo, como alguns projetos relativos à reforma tributária em trâmite no Congresso Nacional, que podem aumentar sua taxação, agravando os custos da produção em 2021. Em São Paulo, estado forte no agronegócio, o governo tem dialogado com o setor e sido razoável no aspecto fiscal. O Brasil precisa mesmo de um sistema de impostos mais moderno e desburocratizado, entretanto menos oneroso para a sociedade, em especial no tocante aos segmentos que mais geram empregos, renda e divisas internacionais.
Resiliente, a agropecuária segue cultivando sementes de esperança. Porém, alerta sobre a importância de concluirmos, na agenda de 2021, as reformas estruturais, como a administrativa e a tributária, mas sem aumentar os já pesados ônus dos impostos e taxas pagos à União, estados e municípios. Mais importante do que tudo, entretanto, é que tenhamos um eficaz plano nacional de imunização contra a Covid-19, à medida que se liberem as vacinas em fase final de testes, como já estão fazendo várias nações. É prioritário proteger nossa gente e evitar novas ondas de contaminação. Além da prioritária defesa da saúde dos brasileiros, a medida é decisiva para a plena retomada das atividades econômicas.
A terra na qual em se plantando tudo dá tem desafiado o improvável e germinado produção e otimismo recordes. Porém, realizar o impossível pode ter limites.
João Guilherme Sabino Ometto é engenheiro, empresário e membro da Academia Nacional de Agricultura (ANA).