De início, um leve jogo de palavras que recomendo para quem deseja desfrutar da genuína felicidade: seja solidário para não ser solitário; seja voluntário e não voluntarioso. São atitudes e posturas que humanizam quem dá e quem recebe, pois levam dignidade, proporcionando a transformação interior e o prazer de se sentir útil. Ao contrário, o voluntarioso (do latim voluntas, vontade) age seguindo a própria vontade, de modo egoísta com seus próprios caprichos, pouco se importando com o outro.
Atualmente, ser ou ter sido um ator social é muito valorizado para a empregabilidade, pois as empresas buscam colaboradores que sabem se doar, são proativos, não se apequenam diante das vicissitudes e conflitos. Enfim, a experiência com boa dedicação à assistência social é habilidade reconhecida, porque traz maiores possibilidades para compartilhamento de energia positiva e desenvolvimento de competências socioemocionais também no mundo corporativo.
Há que se considerar que o chamado 3.º setor, formado por organizações de iniciativa privada sem fins lucrativos, já movimenta 1,2% do PIB brasileiro, apesar de distante dos 5% alcançados por vários países desenvolvidos. A participação comunitária é um dever de consciência social e um dos mais nobres exercícios da cidadania. Somos um país desigual, mas não pobre, e a justiça social neste país não será conquistada apenas pelos governos, mas em conjunto com as ações solidárias de cada um de nós.
Neste contexto, a boa notícia é que os jovens em geral são sensíveis ao chamamento por uma maior participação comunitária, como bem comprova uma pesquisa realizada em três escolas de Curitiba, com 1.900 estudantes: apenas 8% deles participam regularmente de ações solidárias promovidas pela escola, família, igreja, em contrapartida, porém 71% gostariam de participar e não sabem como.
Milhares de jovens estão fazendo a sua parte, mas é pouco, muito pouco para um Brasil que necessita de maior equidade econômico-social, ainda mais existindo outros milhares de jovens com tempo disponível, bem-instruídos, bem-nutridos e, no entanto, voluntariosos e hedonistas (do grego hedoné, prazer), seduzidos pelo consumismo. Um quase hino à apatia, pois boa parte deles pratica o refrão "deixa a vida me levar", de Zeca Pagodinho, conquanto essa bela música tem um estribilho reparador: "mas meu coração é nobre".
Isso nos faz questionar quantos são os jovens a parasitar numa torre de marfim? Uma vida irreal, pois blindado é o seu mundo das redes sociais, dos shoppings, dos condomínios ou dos prédios-fortaleza. Jamais poderíamos afirmar que essa geração é melhor ou pior que as antecedentes, e sim que é diferente, é sui generis. É fato também que o consumo de drogas – em especial cocaína, crack, MDMA – cresce de maneira alarmante.
Ademais, inquieta um estudo com base em dados do IBGE que revela a precocidade com que os pré-adolescentes de 13 a 15 anos bebem álcool: ao menos uma vez por mês, sendo 25,1% de garotas e 22,5% de garotos. Para efeito de comparação, nos EUA é menos de 10%, pois nessa faixa etária os controles são rigorosos. É um hábito devastador. O consumo antes dos 21 anos aumenta em cinco vezes a probabilidade de dependência, sem contar ser altamente prejudicial para o organismo.
E as escolas devem fazer sua parte, promovendo com seus alunos ações comunitárias, afinal, uma ação organizada e unida ao entusiasmo produz uma força de transformação poderosa. Por muitos anos, como diretor de escola, juntamente com professores e pais, promovemos uma boa e contínua integração dos nossos alunos com a comunidade de algumas creches, asilos e escolas de periferia. E ao final, colhíamos depoimentos. Um dos adolescentes assim se manifestou: "quando estou praticando o voluntariado esqueço os meus problemas, até porque eles são pequenos diante daquela realidade que estou vivenciando". Até mesmo uma das professoras fez blague: "quem não está gostando é a minha psiquiatra e o meu psicólogo, pois com essa vivência abandonei os remédios e a terapia contra a depressão".
A solidariedade é um dever moral e que vai além dos preceitos religiosos. Quem não tem em seu coração amor ao próximo sofre da pior doença cardíaca.
Jacir J. Venturi, cidadão honorário de Curitiba, foi professor, diretor de escolas e presidente do Sinepe/PR, onde, juntamente com outros professores, implementou 750 ações comunitárias em creches, asilos e escolas de periferia.