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A “Grande Mentira” é uma distorção grosseira da verdade, usada principalmente como técnica de propaganda política. Vem do alemão “große lüge”. Curiosamente, essa expressão foi usada pela primeira vez por ninguém menos que Adolf Hitler em seu livro Minha luta (Mein Kampf), em 1925. Ele disse que as pessoas acreditam em mentiras absurdas porque não aceitam que alguém pudesse ter a “insolência de distorcer a verdade de forma tão infame".
Hitler alegou que a técnica teria sido usada por judeus para culpar a Alemanha pela derrota na Primeira Guerra Mundial. Ou seja, para justificar sua própria mentira, Hitler cunhou a expressão “grande mentira”, distorcendo de modo infame a verdade. O fato é que a Alemanha obviamente perdeu a Primeira Guerra Mundial e Hitler inventou uma Grande Mentira para culpar os judeus e poder persegui-los.
A Grande Verdade parece indicar que a maioria dos brasileiros não confia no governo, não confia no presidente, não confia nos políticos ou nos partidos políticos, não confia no STF, não confia nas urnas eletrônicas, não confia na Justiça, na polícia ou nas Forças Armadas
Há dois fatos perturbadores sobre isso: 1) “Grandes Mentiras” sempre existiram ao longo da história e sempre caminharam lado a lado com a má política; 2) as pessoas acreditam mais em uma grande mentira do que em uma pequena mentira ou até mesmo na verdade.
Os psicólogos ficam intrigados com a lógica contraintuitiva da Grande Mentira. Por que a natureza humana acredita mais facilmente em uma Grande Mentira do que em uma pequena mentira? E por que as pessoas parecem preferir uma mentira conveniente à verdade? Alguns especialistas explicam: “Porque ajuda a desabafar raiva ou frustração”; “porque muitos preferem a segurança de uma resposta pronta, do que a indefinição sobre problemas difíceis de serem resolvidos”; ou ainda “plataformas de mídia social como Facebook, X e Instagram exacerbam essas tendências porque adicionam novos elementos de pressão social, principalmente sobre jovens”. Segundo a psicóloga americana Ramani Durvasula, especialista em transtornos de personalidade narcisista, “a privação de assistência médica, educação, capacidade de ganhar a vida e outras vias de dignidade podem tornar uma população psicologicamente vulnerável àqueles que procuram explorá-la".
Alguma semelhança com o Brasil de hoje? Quantas Grandes Mentiras estamos vivendo? Segundo a plataforma global alemã Statista, o nível de confiança do brasileiro em seu governo é de apenas 42% (dados de 2023). O IPEC, em uma pesquisa de julho deste ano, mostrou que 51% dos brasileiros não confia no presidente Lula. Outra pesquisa divulgada em fevereiro de 2023, feita pela Atlas Intel, indicou que 57% dos brasileiros não confia no Congresso. Segundo outra pesquisa da Atlas Intel, de setembro deste ano, metade dos brasileiros não confia no trabalho e nos ministros do STF.
E não é só isso. Pesquisa feita em 2023 pela Revista Insight Inteligência apontou que 62.9% dos brasileiros “não confiam” ou “confiam pouco” nas urnas eletrônicas. Em 2022, uma pesquisa do Instituto Milenium mostrou que quase 90% dos brasileiros eram contrários à destinação de R$ 5 bilhões dos cofres públicos para o Fundo Eleitoral – mas fizeram o Fundo Eleitoral de qualquer jeito. Já a pesquisa A Cara da Democracia, de julho deste ano, feita pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT), mostrou uma exceção: as igrejas têm avaliação positiva com 77% de confiança dos brasileiros. Talvez isso explique a hipocrisia de políticos candidatos que vão à missa apenas em época de eleições.
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Perguntei a um amigo que trabalhou por 40 anos na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro qual seria a porcentagem dos vereadores que seriam corretos. E ele respondeu “de 5 a 10%”. Fiz a mesma pergunta a outro amigo que trabalhou por 40 anos na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj). Ele respondeu “de 10 a 15%”. São opiniões subjetivas, claro, mas o que impressiona é a realidade disfuncional de um sistema que aparentemente serve mais a si mesmo. Pelo menos 85% do sistema representativo parece representar um grande desperdício. De fato, em outubro de 2024 o Estado do Rio prevê um déficit de R$ 14,6 bilhões em proposta de orçamento para 2025 enviada à Alerj.
A posição do Brasil em relação ao Poder Judiciário também vai mal. Com relação à Justiça Criminal, o Brasil foi classificado como o segundo país com a Justiça Criminal mais parcial do mundo, de acordo com o ranking do World Justice Project: Índice do Estado de Direito 2021. Com relação à Justiça Civil, o Brasil caiu no ranking mundial dos sistemas de Justiça Civil: em 2023 ocupava a 83ª posição entre 142 países no Índice do Estado de Direito, que avalia leis justas, governo aberto e acessibilidade à justiça.
Resumindo: segundo pesquisas recentes, a Grande Verdade parece indicar que a maioria dos brasileiros não confia no governo, não confia no presidente, não confia nos políticos ou nos partidos políticos, não confia no STF, não confia nas urnas eletrônicas, não confia na Justiça, na polícia ou nas Forças Armadas. Sei que temos políticos e profissionais corretos em todas essas instituições. Mas serão apenas 15% deles?
Tivemos eleições municipais recentemente. Entre os grandes vencedores destas eleições estão o Centrão, a direita e centro-direita (PSD e MDB). Parece ser um apelo por mudança. Esses partidos vão gerenciar orçamentos da maior parte das prefeituras do Brasil, algo como R$ 489 bilhões.
Não gosto dos rótulos “esquerda” e “direita”. Meu partido é aquele que pratica transparência, probidade, ética, empreendedorismo e criação de oportunidades justas para todos que preferem trabalhar. Gostaria de pensar que há mais de 15% de políticos sérios tentando fazer isso. Como otimista incorrigível, espero agora que o “centro” e a “direita” não desperdicem a oportunidade de provar que podem beneficiar mais brasileiros de forma eficiente e com menos desperdício do que a “esquerda”.
Senão restará a dúvida: no Brasil de hoje teríamos vários casos específicos de Grandes Mentiras específicas? Ou então ficaremos com a certeza de que o país inteiro já estaria se transformando em uma Grande Mentira generalizada, formada por várias mentiras que se conectam de forma perversa para facilitar a vida de poucos e ignorar a maioria.
Jonas Rabinovitch é arquiteto urbanista com 30 anos de experiência como Conselheiro Sênior em inovação, gestão pública e desenvolvimento urbano da ONU em Nova York.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos