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| Foto: Martin Bureau/AFP

Recentemente, a tenista norte-americana Serena Williams, um dos maiores fenômenos do tênis, perdeu a final do U.S. Open após ser acusada de receber instruções do técnico, o que não é permitido em uma partida de tênis. Inconformada com a decisão, ofendeu o árbitro, o português Carlos Ramos, chamando-o de “ladrão”. Perdeu a cabeça e o jogo.

Até aí tudo normal: em qualquer esporte, caso a autoridade máxima (o árbitro) seja ofendida, o esportista recebe uma punição. Foi o que aconteceu na semifinal da Copa do Brasil, em que o lateral-direito do Cruzeiro Edilson xingou o juiz. Não perdeu um game, como Serena, mas foi expulso da partida. Porém, para o que há de pior no feminismo atual, a atitude do árbitro português foi machismo. Por quê? Porque Serena é mulher. E, por essa questão biológica, um homem não pode puni-la. Por quê? Porque é machismo. E assim entramos em um círculo vicioso e ilógico. Danem-se as regras, dane-se a adversária, que tem o direito de que as regras sejam cumpridas. O único fato digno de nota foi o de que um árbitro homem ousou punir uma mulher.

Mas, para aqueles que não acompanham o tênis, é bom lembrar que Serena só é calma no nome. Em 2009, ela ofendeu uma juíza – eu disse juíza – de linha: “Juro por Deus, eu vou pegar essa bola e enfiar pela sua garganta, está ouvindo?”, disse o novo ícone do feminismo. Perdeu um ponto e o jogo. Mas ganhou uma bela multa e, dias mais tarde, pediu desculpas à juíza de linha em um comunicado.

A plateia norte-americana vaiou o árbitro e a organização do evento, mas a campeã acreditou serem as vaias dirigidas a ela

É o que Serena deveria fazer novamente. Afinal, o seu técnico declarou que passou instruções para Serena, mas ressaltou, como qualquer aluno meu faria quando lhe chamo a atenção por falar demais, que “todos estão fazendo o mesmo”. E a resposta ao técnico deve ser a mesma dada ao aluno: “É, mas eu vi você conversando”. Aliás, essa é uma desculpa frequente dos que são flagrados cometendo um delito: na política, todos cometem caixa dois. Quando detidos, argumentam como o técnico e o aluno.

Não sei se as defensoras de Serena Williams viram o jogo. Eu vi. Serena foi brutal não só com o árbitro, mas principalmente com a jovem tenista Naomi Osaka, 20 anos. Ela ganhou um dos títulos mais importantes do esporte, mas chorou, e não de alegria. A plateia norte-americana vaiou o árbitro e a organização do evento, mas a campeã acreditou serem as vaias dirigidas a ela. Naomi, japonesa nascida em Osaka, que tem pai haitiano e mãe japonesa, foi a primeira dessa nacionalidade a ganhar um grand slam. Mas pouco se falou no título. Falou-se de Serena, a reincidente em chiliques nas quadras.

E, em vez de se desculpar desta vez, Serena apelou a um assunto muito sério. O sexismo, a diferenciação no tato entre homens e mulheres, seja em locais públicos ou em ambiente de trabalho, não pode ser tratado como uma “saída lateral pela direita”, como diria o célebre Leão da Montanha. Não é uma carta na manga. Não pode dar margem a que reais vítimas sejam acusadas de “serena-willismo”.

Rodrigo Constantino: Acredite em algo (desde que seja verdadeiro) (publicado em 11 de setembro de 2018)

Leia também: Onde Serena errou (artigo de Martina Navratilova, publicado em 11 de setembro de 2018)

A acusação de Serena, de que os homens não são tratados da mesma forma, é falsa. No ano passado, um tenista foi punido por uma atitude sexista: tentou beijar à força uma repórter após a partida. Ele iria participar de Roland Garros, mas foi banido da competição. Atitude mais do que justa. Pesquisando, encontrei uma história curiosa: o tenista norte-americano Donald Young foi punido por ter ofendido o árbitro. Irritado com a marcação, disse a seguinte frase: “son of a bi..scuit”. Após a punição, ficou revoltado: “Eu falei ‘biscoito’!” Mas não adiantou: o que o árbitro entendeu foi o que o leitor já sabe...

Outro caso, e agora realmente sexista, só para título de comparação. No ano passado, durante o mesmo U.S. Open, o italiano Fabio Fognini chamou a juíza de cadeira de “puta”. Depois ele se desculpou, afirmou não ser “sexista e que ama as mulheres”. Vimos e acreditamos nele. O bom é que foi excluído do torneio e levou uma multa de US$ 24 mil.

Ao sair em defesa de Serena, vimos o pior do feminismo, aquele que busca enfraquecer sua força, a saber: o sexismo. Atitudes como a de Fognini são inaceitáveis, mas, infelizmente, comuns. Por esse motivo, ataques de fúria, derrotas no esporte e egocentrismo não devem manchar essa palavra tão importante para as mulheres.

Eduardo Gama, mestre em Literatura, é professor, jornalista e publicitário.
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