| Foto: /Pixabay

Quem já engravidou em situação controversa, como quando se passa por apertos financeiros graves, por momentos de crise conjugal, por sexo “casual”, sabe quão desesperadora pode ser a notícia de uma nova vida a caminho. Algumas mulheres podem se encontrar em situação ainda mais desesperadora, como quando a gravidez é fruto de uma violência ou se trata da gestação de um bebê com sérias deficiências, que resultará na morte certa após o parto. Todas essas mulheres, em maior ou menor proporção, se veem numa situação caótica, desejam ardentemente alívio para suas angústias e recuperação do equilíbrio em suas vidas.

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Dor, insegurança, incerteza, medo e tantos outros sentimentos envolvidos numa situação de gravidez não esperada rasgam o coração dessa mulher; e é exatamente nessas circunstâncias emocionais tão intensas que a mulher ponderará a respeito de escolhas que impactarão toda a sua vida.

Para algumas mulheres o aborto é impensável, independentemente da situação. Mas, para outras, o aborto surge como uma possível solução; e aqui não se trata de legalidade ou não, bastando que consideremos os países em que o aborto é liberado.

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Mas o que motiva uma mulher a desejar interromper a gestação? Frequentemente, é a necessidade de se ver livre da sensação de descontrole na sua vida. Sensação, algumas vezes, acrescida de coerção familiar, principalmente no caso de gravidez na adolescência. O aborto, contudo, não “desengravida” ninguém.

O aborto não “desengravida” ninguém

O instinto materno é poderoso (mesmo que algumas mulheres acreditem não tê-lo). Ter um filho não nascido sempre produzirá marcas emocionais profundas na mulher, mas quando se tem um filho não nascido por consequência de uma interrupção voluntária da gravidez (aborto induzido) – experiência violenta e indigna, já que ninguém aborta acreditando que será uma experiência agradável –, essas marcas não só serão profundas, como repercutirão por toda a vida, de forma negativa e muitas vezes autodestrutiva. Conforme o psiquiatra e psicólogo Alfredo Simonetti, “a racionalidade dos motivos não anula a força da tristeza e, principalmente, da culpa”. Num primeiro momento, pode ser que a sensação corresponda a um profundo alívio, mas ninguém passa incólume por uma violência.

O aborto provocado é considerado por alguns como um “não evento”. Mas ele produz luto – um luto real, provocado exatamente pela negação da ocorrência de uma morte real, que é desconsiderada.

Repito: esta reflexão não trata da questão do aborto ser liberado ou não em nosso país ou no fim do mundo. A escravidão de negros também já foi permitida em outras épocas. Este texto é sobre mulheres reais, sofrimentos reais, vidas reais – a vida da mulher e do bebê.

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Opinião da Gazeta: Um debate desequilibrado (editorial de 2 de agosto de 2018)

Leia também: O jacobino hermenêutico e a liberdade de matar (artigo de Murilo Resende Ferreira, publicado em 31 de julho de 2018)

As mulheres pedem apoio e não aborto. As mulheres pedem empatia e compaixão, e não aborto. É muito fácil gritar “meu corpo, minhas regras” quando a decisão de interromper a gestação não é sua, as angústias não são suas e as consequências não são suas. É muito fácil esquecer, quando não se trata do nosso corpo, que o padrão dos sofrimentos tardios pós-aborto é uma informação menosprezada e negligenciada.

De minha parte, recuso-me a acreditar que, diante de todo o desenvolvimento científico atual, a opção para a angústia das mulheres seja a morte. Recuso-me a acreditar que uma vida é superior a outra.

Não há final feliz no aborto. Mas pode haver um final respeitoso como a adoção e, sim, também feliz, quando se é amparada para receber o filho nos braços e recomeçar com esperança uma nova história.

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E o que eu e você estamos dispostos a oferecer a essas mulheres? Esperança ou morte? Na morte não há solução – mas a vida está repleta de possibilidades. Pelas mulheres, pela vida.

Karen Fernandes é enfermeira.