O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em 6 de outubro, em julgamento de embargos de declaração, alterar a posição firmada em 15 de março de 2019 no Recurso Especial 1.737.428, que considerava ilegal a cobrança da taxa de conveniência por uma empresa que atua no ramo de vendas on-line de ingressos para eventos. O STJ considerava, até então, que a taxa de conveniência constituía venda casada, pois a cobrança estaria impondo ao consumidor a aquisição de serviço não contratado (o que é vedado pelo artigo 39, I, do Código de Defesa do Consumidor), e se mostrava ilegal pelo repasse ao consumidor de um custo operacional que, em regra, constitui risco da própria atividade empresarial.
Com o acolhimento da divergência e o reconhecimento de que a taxa de conveniência remunera um preço correspondente a uma oferta alternativa de aquisição pelo consumidor, o STJ corrige interpretação absolutamente equivocada, já que é inquestionável a licitude e praticidade para o consumidor na aquisição de ingressos pela internet, pagando, para tanto, a taxa de conveniência, pois, pelo fato de poder fazê-lo no conforto de casa ou de qualquer lugar, bastando ter acesso à internet, economiza-se tempo de deslocamento até o ponto físico de venda e de espera em fila, além da opção de impressão em casa e até, em alguns casos, ter o ingresso disponível no celular (e-ticket).
A conduta determinante para apreciar a legalidade da cobrança da taxa de conveniência pelas empresas reside, agora, na oferta de alternativa de aquisição ao consumidor. A ilicitude só restará configurada caso não haja opção diversa para efetuar a compra do ingresso, sem a cobrança da taxa de conveniência, comprometendo a autonomia da vontade de quem realiza a compra. Portanto, cabe às empresas oferecer em suas plataformas a informação de meios acessíveis para realizar a compra sem a cobrança de taxa de conveniência, evidenciando que a venda on-linedos ingressos é opcional, ou seja: o consumidor pode escolher entre a compra via internet, realizada com a comodidade de não precisar sair de casa, dispensando para tanto o pagamento dos respectivos custos, ou a aquisição presencial diretamente na bilheteria do evento.
A nova decisão proferida pela corte ratifica que a taxa discutida nada mais é que a contratação de um serviço adicional e opcional de “conveniência”, tal como expressamente indicado, que permite ao consumidor adquirir ingressos sem ter de se deslocar até o local físico de vendas e enfrentar filas.
Acertada foi a nova decisão, porquanto era equivocada a afirmação de que a cobrança da taxa transferia aos consumidores parcela do risco das atividades empresariais, exercidas pela empresa que produz o evento. Neste ponto, é crucial que não se confunda a atividade da empresa responsável pela organização do evento cujo ingresso é vendido com a atividade da empresa responsável pelo mecanismo de aquisição e entrega do ingresso ao consumidor.
Em verdade, a cobrança evidencia a existência de duas atividades completamente diferentes e a necessidade de remuneração de cada uma delas, sendo certo que a taxa é a única fonte de remuneração das empresas que realizam a venda de ingressos pela internet, de forma a arcar com os custos de manutenção e atualização da tecnologia necessária para realizar a operação, além de implementação de sistemas seguros e eficientes para prevenir fraudes e proteger os dados fornecidos no momento da compra.
Fato é que a nova decisão favorece o consumidor, pois, se o STJ firmasse o equivocado entendimento de ilegalidade da cobrança, certamente, para suportar os custos da venda on-line, os organizadores de eventos aumentariam o preço dos ingressos, incorporando o valor devido às plataformas digitais, sem qualquer distinção entre o consumidor que comparece à bilheteria e aquele que realiza a compra digitalmente. Isto é, os custos seriam repassados não apenas ao grupo de adquirentes digitais – efetivamente favorecidos com o serviço de conveniência –, mas também direcionados àqueles que realizam a compra presencialmente.
Com a nova decisão, protege-se o princípio da legalidade, ante o amparo à realização de prática lícita; evidencia-se a valorização da transparência, pois a taxa não será absorvida pelo valor do ingresso – que, consequentemente, teria margem de aumento e imposição àqueles que não realizam a aquisição por meio eletrônico – e continuará tendo sua existência indicada ao consumidor como contraprestação de serviços de conveniência. E por fim, valoriza-se o princípio da informação, porquanto o novo entendimento traduz que as empresas que atuam no setor de vendas de ingressos on-line devem incluir, em suas ofertas de ingresso, o preço total de compra com o destaque da taxa de conveniência, sob pena de ser obrigada a restituir o valor desta taxa.
Marcella Braga Marinho é advogada atuante em contencioso Trabalhista e Cível, especializada em Direito e Processo do Trabalho.
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