Recentemente ouvi de um advogado tributarista uma piada que resume bem a importância de uma cobrança de impostos eficiente. Segundo ele, ter um bom sistema tributário está para o desenvolvimento econômico de um país assim como ser bonito está para conseguir um relacionamento amoroso: embora não seja condição necessária, com certeza ajuda. E faz todo sentido: na prática, a forma como um país cobra seus tributos influencia muito na maneira como os negócios se desenvolvem.
Dizer que o sistema tributário brasileiro é extremamente complexo e injusto já virou lugar comum no debate público. Mas, de fato, essas afirmações estão corretas: somos o país onde as empresas mais gastam tempo pagando impostos e nossa tributação é regressiva, onerando mais os pobres.
No entanto, talvez o mais grave dos problemas no sistema tributário brasileiro seja a forma como ele distorce o mercado. A grande quantidade de exceções e benefícios tributários torna a tarefa de cobrar impostos uma verdadeira zona de guerra. Uma prova disso é o tamanho do contencioso tributário brasileiro, que gira em torno de 50% do PIB.
O diagnóstico é claro: precisamos reformar nosso sistema tributário. Nesse contexto, à luz do caminho traçado internacionalmente, a unificação dos tributos deve ser encarada como um dos primeiros passos para fazê-lo: ao adotarmos um modelo de imposto sobre o valor agregado (IVA) sobre mercadorias e serviços, simplificamos o sistema e o deixamos mais isonômico.
E é nesse cenário que o debate a respeito da taxação de livros deve ser encarado. A isenção fiscal dada ao mercado editorial é mais uma das políticas bem intencionadas que não resolvem o problema e provocam consequências talvez ainda mais nefastas.
É preciso ter ciência de que tributar livros não é um problema per se. É somente parte da correção de uma distorção que nos trouxe até onde estamos: um país preso na armadilha da renda média e com uma produtividade estagnada há quatro décadas. Na intenção de permitir o acesso à leitura aos mais pobres, a sociedade subsidia livros para as classes altas e financia um mercado ineficiente.
Uma parcela do debate público, encampada principalmente pela esquerda tuiteira, abriu as torneiras dos argumentos falaciosos. “Não podemos taxar livros, é um produto essencial”, dizem. Nosso sistema tributário chegou a esse caos devido a essas máximas: não podemos tributar isso nem aquilo; precisamos subsidiar a indústria X ou a zona franca Y. Precisamos evoluir nesse debate, e rápido.
Por suposto, é preciso garantir que pessoas de baixa renda tenham acesso à leitura e à informação. Eu mesmo cresci em uma família na qual livros não estavam na lista de compras, e só consegui ter acesso a eles na biblioteca da minha escola. Mas precisamos nos guiar pelos dados e, na literatura econômica, há ampla documentação indicando que combater a desigualdade social via gasto público é mais eficiente do que via subsídios tributários. Oferecer algo análogo a um “vale cultura” ou usar o valor arrecadado com impostos sobre livros para aumentar o Bolsa Família seria uma solução de compromisso para garantir um acesso real dos mais pobres à leitura.
Não podemos cair no debate raso e polarizado: não existem impostos de esquerda ou de direita. A taxação de livros não é um problema – ela faz parte da solução. Resolver a complexidade absurda do nosso sistema tributário é essencial para aumentarmos a produtividade brasileira e pilar de uma extensa agenda republicana pautada por um simples princípio: tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais.
Cristóvão Borba é graduando em Direito, líder na Fundação Estudar e foi assistente de pesquisa na área de Relações Internacionais na FGV/SP.