O debate sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins parece não ter fim. Com o julgamento do RE 574.706, em março de 2017, foi firmada a tese de que a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e Cofins é inconstitucional, não podendo o contribuinte ser submetido a tal tributação.
Com a inconstitucionalidade declarada em março de 2017, diversos processos passaram a transitar em julgado, não cabendo mais recurso para a União, dando ao contribuinte a possibilidade de apurar os valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos, contados da data de distribuição do processo.
No voto da relatora, ministra Cármem Lúcia, não se encontra qualquer limitação temporal ou material. Seu voto, que firmou a tese vencedora, não é possuidor de qualquer omissão que venha a justificar os embargos de declaração opostos pela União, que tenta a todo custo modular os efeitos dessa decisão.
Qualquer decisão que não confirme irrestritamente o julgamento ocorrido em março de 2017 e o direito já reconhecido pelo STF será um verdadeiro absurdo
Dentre os diferentes pedidos de modulação apresentados pela União, destaca-se o pedido para que o STF deixe claro qual é o critério de cálculo, uma vez que, na sua visão, o ICMS a ser excluído é aquele recolhido e não o ICMS destacado em nota fiscal. Aqui é fundamental explicar que em momento algum esse tema foi trazido ao processo, não cabendo à União inovar nesta fase processual, até porque os contribuintes não tiveram a possibilidade de se defender dessa alegação, uma vez que ela nem existiu no processo, cuja inconstitucionalidade foi decretada. Entretanto, o próprio Supremo já se manifestou em outras situações, referendando que o ICMS a ser excluído é o destacado. A União, na tentativa de se esquivar da obrigação de ressarcir tudo aquilo que cobrou indevidamente por anos, tenta trazer uma discussão nova, inovando em um processo que já teve sua declaração de inconstitucionalidade proferida de forma cristalina.
Ainda mais grave está o pedido para que o STF determine a limitação temporal, isto porque, de acordo com o nosso ordenamento jurídico, a restituição daquilo que foi pago indevidamente aos cofres públicos em razão de tributo declaradamente inconstitucional é de cinco anos contados da data da distribuição da ação – por exemplo, um contribuinte que ingressou com o processo em 2010 teria o direito à devolução de tudo o que pagou indevidamente desde 2005. A União busca a modulação no sentido de que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade tenham validade a partir da data em que o mérito foi julgado (março de 2017) ou a partir da data de julgamento dos embargos de declaração.
Os pedidos da União são totalmente contrários à legislação tributária e abrem um precedente negativo para a segurança jurídica do país. Isto porque em 2006 a maioria do STF já tinha posição majoritária pela exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, lançando por terra todos os argumentos apresentados pela União. Desde 2006 a União tinha conhecimento de que o processo caminhava para uma derrota do Fisco, tamanha e gritante é a inconstitucionalidade dessa cobrança, mas a União se manteve inerte, acreditando que poderia reverter a situação a qualquer momento.
Em 2014, o STF julgou o RE 240.785, fixando a tese de que o ICMS não compõe a base de cálculo do PIS e da Cofins; com essa nova derrota era praticamente notório que o RE 574.706, que tinha repercussão geral, teria o mesmo desfecho. Mesmo assim, já com a derrota anunciada, a União, em vez de se preparar, tomou postura totalmente contrária, continuou inclusive criando tributos com o mesmo vício de inconstitucionalidade, a exemplo da CPRB, e desprezou completamente a derrota sofrida no RE 240.785.
Os pedidos da União são totalmente contrários à legislação tributária e abrem um precedente negativo para a segurança jurídica do país
Três anos depois, com o julgamento do RE 574.706 em março de 2017 e a confirmação da inconstitucionalidade, a União, já sem muitos argumentos, opôs embargos de declaração visando inovar no processo, trazendo à discussão situações inconcebíveis e amplamente revestidas de incoerência e absurdos processuais incríveis.
Cumpre frisar ainda que desde março de 2017 inúmeros processos transitaram em julgado, fazendo com que diversas empresas habilitassem seus créditos perante a Receita Federal do Brasil, efetuando assim as devidas e competentes compensações tributárias, amplamente revestidas de liquidez e certeza; inclusive, grande parte destes processos teve seu trânsito em julgado há mais de dois anos, não cabendo nestes casos eventuais ações rescisórias.
Em meio a tudo isso, o contribuinte segue aguardando o término desse julgamento, muitos com o trânsito em julgado, créditos devidamente constituídos, já compensados, ou em compensação, mas na expectativa do que pode vir daqui para a frente.
Diante disso, temos apenas uma certeza: qualquer decisão que não confirme irrestritamente o julgamento ocorrido em março de 2017 e o direito já reconhecido pelo STF será um verdadeiro absurdo, uma violação à segurança jurídica, a validação de uma cobrança indevida realizada durante décadas, bem como trará um enorme descrédito às instituições, podendo gerar prejuízos irreparáveis a milhares de empresas e prejudicando ainda mais a economia brasileira.
Luis Alexandre Oliveira Castelo é advogado tributarista.
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