O Paraná segue sendo o estado que mais testes RT-PCR realiza no Brasil em relação à sua população, tendo realizado até o momento mais de 2,5 milhões. Mas estariam sendo adequadamente usados para controlar a transmissão do vírus?
Nos últimos dois meses a pandemia alcançou pico jamais pensado no país. No Paraná não foi diferente. Março e abril são, em conjunto, os meses mais letais de todos, mais de um ano depois da primeira morte no Brasil. No Paraná, a incrível marca de 10.505 mortes nesses dois meses, com abril ainda não fechado. Quase 50% do total de 22.086 mortes desde o início da pandemia, conforme o boletim epidemiológico de 29 de abril.
Nos dois últimos meses as medidas restritivas aumentaram e agora já um degrau abaixo. Efetivo controle de circulação das pessoas não ocorreu em praticamente nenhum lugar do Brasil, salvo casos isolados como em Araraquara (SP), onde o sucesso do fechamento ficou estampado nos números de casos e óbitos nas semanas pós-fechamento. Mas não queremos aqui voltar com essa discussão, que não faz parte do leque de opções dos nossos governantes Brasil afora.
Nessas últimas semanas, a diminuição de casos e óbitos foi expressiva no Paraná. No último dia 24, a média móvel de óbitos caiu 56% em relação a 14 dias atrás. Excelente notícia. Óbitos em geral expressam contágio de um mês atrás, ou mais.
É possível um novo recrudescimento dos casos e óbitos, com o relaxamento das restrições? É possível, sim, e talvez provável, especialmente diante da vacinação ainda em ritmo aquém do necessário, pela clara limitação de doses, salvo aquelas que Butantan e Fiocruz entregam ao PNI. A proximidade do inverno traz consigo as infecções respiratórias, a Covid-19 certamente entre elas.
Mas vamos nos ater a como se usar os testes RT-PCR e, hoje, os já disponíveis Testes Rápidos Antigênicos para Covid, capazes de cumprir o papel do PCR com resultados de alta confiança em até 20 minutos. Ambos os testes diagnosticam as pessoas infectadas e, portanto, portadoras do vírus, e que são as responsáveis por passar o vírus adiante. Isso ocorre quando pessoas positivas, infectadas, seguem circulando e mantendo contatos, ainda que dentro da família, mas também no trabalho, nos meios de transporte, no comércio, etc. São elas que fazem o tal R0 (“R zero”, a taxa de transmissão) estar acima ou abaixo de 1 – acima disso, significa que cada positivo transmite o vírus para ao menos uma pessoa ou mais. Fácil compreender que R0 acima de 1 é igual a pandemia se propagando, se reproduzindo e expandindo; R0 abaixo de 1 expressa pandemia em descenso, quando uma pessoa positiva contamina, em média, menos de uma outra. Portanto, R0 igual a 0,8 significa que, para cada dez pessoas positivas, apenas oito casos novos surgiram e, assim a pandemia vai cedendo. R0 igual a 1,2 significa que dez pessoas positivas contaminaram mais 12, ou seja, pandemia crescendo.
Como fazer o R0 ficar abaixo de 1? Simples: achar os positivos e retirá-los de circulação! E como achamos os positivos? Testando e testando e testando, com RT-PCR e com os novos testes antigênicos rápidos para Covid. Essa responsabilidade é especialmente de cada município.
Defendemos aqui que a alternativa crucial à ausência de medidas mais restritivas coletivamente, no limite do fechamento das cidades, precisa ser competência total na testagem, na vigilância ativa dos casos. Usá-la no limite para identificar precocemente os positivos, colocá-los em quarentena e identificar rapidamente os seus contactantes (quem, nos últimos dias, teve contato com esse caso positivo). Dentre estes contatos haverá seguramente outros positivos, que devem igualmente ser afastados, e assim por diante. Precisamos de ações muito mais competentes em termos de vigilância ativa, busca fina de casos positivos e potenciais casos positivos.
E isso precisa de mecanismos de vigilância mobilizando a atenção básica de saúde, os agentes comunitários, sistemas de busca ativa e comunicação intensa com a população, envolvendo a mídia, entidades representativas, igrejas, empresas, entre outras. E, claro, disponibilidade de testes imediatos, com resultados em muito pouco tempo.
A população precisa ser mobilizada e mais consciente para importância da testagem. O foco na vacina, tão necessária, não pode turvar a importância dos testes, que serão necessários meses à frente e mesmo anos à frente.
Sabemos da importância da testagem desde o início da pandemia, mas ainda não se alcançou eficiência satisfatória nessa vigilância no Brasil. A evolução da pandemia atesta também, dentre outros sérias razões, o fracasso da vigilância ou uma clara limitação. Repetimos que medidas coletivas mais severas, como restrições mais fortes, seriam igualmente necessárias. Na limitação dessas, cresce o papel mais competente na vigilância com base nos testes. Sim, sempre enfrentar o negacionismo e o desdém com a ciência.
Países que foram, e ainda são, bem-sucedidos nessa estratégia testam mais de 20 pessoas para cada caso positivo, o que significa que rastreiam fortemente os contactantes. No Brasil, mal passamos de dois testes a mais para cada caso positivo. No Paraná o número tem variado, sendo a média perto de três; praticamente em nenhum momento passou de cinco testes para cada caso positivo identificado.
Conclusão: não estamos praticando vigilância epidemiológica adequada. A testagem apenas serve para diagnosticar os positivos, mas não está a serviço do controle epidemiológico na pandemia. A testagem, na quantidade atual, pouco está conseguindo conter a transmissão e circulação do vírus. Mas sempre é tempo de melhorar! Os instrumentos, as boas práticas e os testes estão disponíveis.
*Pedro R. Barbosa é diretor-presidente do Instituo de Biologia Molecular do Paraná.
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