O princípio da transparência tornou-se obrigatório na gestão pública. Hoje já não se admitem administradores públicos agindo em desacordo com esse conceito, tanto porque o cidadão tem direito constitucional de acesso às despesas realizadas pelos gestores públicos, como é lícito saber todos os aspectos envolvidos na tomada de decisão: razões, fatos, lógica e base jurídica, seja ela ato ou contrato.

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Em termos jurídicos, o Paraná está na vanguarda do acesso às informações públicas. A Lei da Transparência, aprovada a partir de anteprojeto apresentado pela Associação Paranaense dos Juízes Federais (Apajufe) e pela Ordem dos Advogados do Brasil – seccional do Paraná (OAB-PR), foi uma conquista do povo paranaense, permitindo eficácia máxima ao princípio constitucional da publicidade administrativa, além de ampliar sua abrangência em relação às leis federais que regulavam a matéria. Na prática, a Lei da Transparência estabelece um pacto entre governantes e cidadãos, tendo os primeiros a obrigação de demonstrar as despesas e, a população, o direito de examiná-las.

Apesar da nossa posição de vanguarda, noticiou-se recentemente que o presidente da Assembleia Legislativa do estado tem se recusado a publicar na internet os gastos com gratificações dos agentes públicos ocupantes de cargos em comissão. O argumento para não publicá-los estaria no fato de a Lei da Transparência obrigar apenas a publicação das remunerações dos agentes públicos, mas não as gratificações.

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Sem dúvida, o presidente da Alep, como administrador público que é, tem o dever de interpretar a lei para aplicá-la. Não pode, todavia, adotar interpretação que lhe negue vigência. O argumento de que as "gratificações" não seriam "remunerações", estando, portanto, fora do alcance da Lei da Transparência, faz distinção não autorizada pela letra da lei. Pior ainda, chega a uma conclusão absolutamente conflitante com seu espírito.

A Lei da Transparência possui um conteúdo mínimo irredutível. Em várias passagens, ela determina que todos os atos e contratos que importem em despesas públicas devem ser publicados no diário oficial e na internet. A única exceção são os atos e contratos que impliquem risco à segurança pública, caso em que serão publicados apenas os valores nominais, sem a especificação da despesa.

A lei foi fundamentada em conceitos amplos justamente para prever todas as situações administrativas que originem despesas públicas. O comando "todos os atos e contratos que originem despesas públicas devem ser publicados" evidentemente pode ser interpretado, mas não de uma maneira a encontrar exceções que não se enquadrem naquelas alinhadas pelo próprio texto.

É sintomático que a lei, em mais de uma passagem, taxativamente inclua como de obrigatória publicidade os atos envolvendo os ocupantes de cargos em comissão. Essa preocupação do legislador se justifica exatamente por serem tais cargos uma anomalia institucional em vários países desenvolvidos, mas que se tornou a regra de aparelhamento do Estado no Brasil.

Ainda que uma interpretação restritiva do conceito de "remuneração", como sendo aquilo que o agente público recebe como contraprestação de seu serviço, possa diferenciá-lo do conceito de "gratificação", nenhuma acrobacia exegética pode retirá-lo do alcance da transparência quando a lei determina a publicação de todos os atos que originem despesas.

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Sendo a concessão de gratificação ao agente comissionado um ato administrativo, por lei deve ser ele publicado. Preferencialmente junto ao nome, cargo e lotação de quem o recebe.

A falta de transparência pública é uma doença. À medida que as sombras avançam sobre os negócios públicos, cria-se o ambiente propício para a proliferação da corrupção.

Em matéria de transparência pública, a interpretação das palavras da lei diz muito sobre quem a interpreta. Dessa forma é que aguardamos por parte do presidente da Assembleia Legislativa – que de resto tem tomado importantes decisões em nome do interesse público – que reveja sua decisão, dando ampla divulgação às gratificações pagas aos ocupantes de cargos em comissão, mesmo porque tal medida estará alinhada com os mais altos valores éticos comungados pela sociedade paranaense.

Anderson Furlan é presidente da Apajufe (Associação Paranaense dos Juízes Federais).

José Lúcio Glomb é presidente da OAB-PR (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Paraná).

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