“Talvez a maior lição da história seja a de que ninguém aprendeu as lições da história.” A essa frase atribuída a Aldous Huxley adicionaria: muito menos quando tal história se passou há tempos que falhem à memória da geração atual ou em terras longínquas. O crescente movimento nacional-protecionista que vemos emergir com fenômenos como a eleição de Donald Trump, o apoio ao Brexit e o fortalecimento de partidos de extrema-direita ao redor do mundo (a exemplo de Marine Le Pen na França e do Hindu Sena na Índia) encaixa-se perfeitamente nessa narrativa.
O fim da Primeira Guerra Mundial deu origem à política conhecida como beggar-thy-neighbor, caracterizada pelo excesso de protecionismo e outras políticas cujo objetivo principal era o impacto negativo em países vizinhos. Países destruídos pela guerra fecharam suas fronteiras atrás de tarifas, e a globalização retratada por Keynes em seu chá matinal deu lugar a conflitos como a guerra cambial e a própria Segunda Guerra Mundial.
Países latino-americanos também decidiram retomar a receita do fracasso no século 21
Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, países latino-americanos flertavam com o protecionismo desde o século 19. Não contentes em colher os frutos (podres) das maiores tarifas comerciais do mundo (em média cinco vezes maiores que as de países industrializados) no período pré-Primeira Guerra, alguns decidiram retomar a receita do fracasso no século 21, adicionando aos impostos de importação doses cavalares de conteúdo local e subsídios de toda natureza a campeões nacionais. O resultado não é novidade para nós, brasileiros: produtividade estagnada, inflação, desemprego e recessão. E a indústria protegida? Registra hoje a menor participação nas exportações globais da última década – caindo de 0,85% em 2005 a 0,61% em 2015.
Agora vemos Trump pleitear uma nova política comercial para fazer dos EUA “grandes de novo”: a imposição de barreiras comerciais a produtos importados (especialmente chineses), além do fim do histórico mega-acordo regional TPP, que reduziria tarifas entre países responsáveis por 40% do PIB mundial. Observamos também, extasiados, a população britânica apoiar uma decisão que custará ao Reino Unido 122 bilhões de libras em endividamento e 30 bilhões de libras em arrecadação até 2021 de acordo com estimativas oficiais, além de milhares de empregos, exportações e o provável prestígio como polo global financeiro, tecnológico e educacional.
Seria o fim da globalização? Certamente é o que desejam eleitores de Trump, apoiadores do fim da União Europeia e similares. Entretanto, o que lhes espera é a provável decepção. “Trumpistas” do antigo centro industrial norte-americano, conhecido como rust belt (“cinturão da ferrugem”), dificilmente testemunharão a volta da era dourada de seus estados, uma vez que cadeias globais de valor alteraram o padrão de produção global – queira Trump ou não. Enquanto isso, trabalhadores britânicos assistirão de camarote a uma economia baseada em exportações perder espaço em seus principais mercados para (justamente) estrangeiros – de alemães e franceses a chineses e indianos.
Desta forma, a classe média baixa de países avançados (detentores de 20% da riqueza mundial), cujo sentimento de exclusão dos ganhos da globalização levou ao cenário atual, servirá apenas para que caminhemos para trás sob um suposto atalho que todos sabem aonde levará, mas esforçam-se em ignorar.