Viajar pelo mundo ficou mais fácil e é uma das principais metas das pessoas durante o ano: conhecer lugares novos, descansar a mente e dar espaço para novas experiências. Com o acesso fácil à tecnologia na palma da mão, o aumento de turistas em locais cobiçados para visitação se tornou algo corriqueiro, já que as plataformas garantem uma visibilidade nunca antes imaginada para os destinos. Dados do Banco Mundial apontaram que em 2017 houve 3,97 bilhões de viagens de avião, contra 2,2 bilhões em 2007 – um crescimento de 80% em apenas uma década.
Isso mostra que o lazer deixou de ser considerado um artigo de luxo há muito tempo. Mas o aumento acelerado do turismo vem chamando a atenção das autoridades, principalmente em locais que já registram impacto negativo no meio ambiente. A ocupação descontrolada de turistas ganhou o nome de overtourism, que ocorre quando a cidade atinge a capacidade máxima de visitantes. São filas intermináveis em pontos de interesse para visitação, trânsito caótico e custo de vida altíssimo, entre dezenas de outros fatores que se tornaram insuportáveis para quem vive nesses locais, hospitaleiros para quem chega a passeio.
Ainda falta conscientização de boa parte dos turistas, que não se preocupam com o futuro
Fernando de Noronha, por exemplo, é um dos locais mais belos do Brasil, amado por muitas pessoas. Classificado como parque nacional, o espaço há anos já vem limitando o número diário de visitantes – somente em 2018 foram 100 mil. O custo de vida por lá é alto em comparação com outros destinos, o que limita ainda mais a visitação em massa. Um dos maiores problemas enfrentados pelo arquipélago pernambucano é a falta de consciência sobre o descarte irregular do lixo; todo mês são coletadas, em média, 220 toneladas. É verdade que uma usina de resíduos sólidos faz a separação de vidros e lixo orgânico para reciclagem, e envia o restante do que é descartado para Recife, em um barco. Mas a ideia das autoridades locais é restringir o uso de plástico, como garrafas, copos, talheres e sacolas, para que não prejudique a biodiversidade que o local exibe.
Já os 5 mil habitantes da Cidade Velha, principal área de Dubrovnik, na Croácia – uma cidade medieval considerada patrimônio mundial da Unesco desde 1979 –, viram suas vidas mudarem após a cidade ser cenário das filmagens da série Game of Thrones e se tornar a fictícia Porto Real ("King’s Landing"), a capital dos Sete Reinos, e ficar mundialmente conhecida. “Vergonha, vergonha” é a palavra mais falada pelos turistas que a gritam toda vez que passam, dia e noite, pela Escadaria dos Jesuítas e reproduzem a fala da famosa cena em que a rainha Cersei caminha enquanto é insultada pela multidão. A presença constante de turistas e essa gritaria fizeram com que muitos moradores abonassem suas casas. Hoje, a Cidade Velha conta população de apenas 1,5 mil pessoas. A maioria das casas foi vendida para estrangeiros por nada menos que 10 mil euros o metro quadrado.
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E quem nunca ouviu falar da praia de Maya Bay, na Tailândia? Se nunca ouviu, pelo menos já deve ter visto as imagens no filme A Praia, de 2000, estrelado por Leonardo DiCaprio, quando as paisagens paradisíacas se tornaram mundialmente conhecidas e viraram alvo fácil para a presença constante de turistas, provocando sérios problemas no meio ambiente local, a ponto de a praia ter sido fechada por tempo indeterminado um ano atrás, para um programa de revitalização dos corais dizimados da área. Somente no ano passado 10 mil corais foram replantados. A intenção é que, quando a baía reabrir aos turistas – daqui a dois anos, acredita-se –, o local seja limitado a 1,2 mil pessoas por dia, divididas por faixas de horários; até o fechamento, 5 mil turistas passavam pelo local diariamente.
A intenção, claro, não é acabar com o turismo, mas o que está em jogo nessas cidades é a busca pelo equilíbrio para preservar não somente os pontos turísticos, mas também tudo que os cerca, principalmente o meio ambiente – pois a natureza, quando afetada, leva anos para sua recuperação – e a boa qualidade de vida dos moradores das cidades. O maior desafio enfrentado por esses pontos turísticos que sofrem com o overtourism é “educar” o viajante sobre o respeito aos lugares e à tradição que ali existe. Infelizmente, ainda falta conscientização de boa parte dos turistas, que não se preocupam com o futuro.
Henrique Mol é diretor-executivo da rede de franquias Encontre Sua Viagem.
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