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Opinião do dia 2

TV Pública, Estatal e Comercial: “cada macaco no seu galho”

O debate nas últimas semanas sobre criação de uma rede nacional de TV Pública (para uso dos poderes Executivos nacional, estaduais e municipais) abre o espaço público para um tema relevante, que é a conformação do nosso sistema de difusão de conteúdos audiovisuais. Pena que parte das discussões esteja enviesada por falta de compreensão conceitual sobre o sistema de comunicação ou por posicionamentos radicais ideológico/partidário de alguns debatedores. A começar pela própria justificativa do ministro das Comunicações, Hélio Costa, que chama de TV Pública uma proposta com o por objetivo, nas palavras do ministro, de "oferecer condições para que o governo [grifo meu] possa apresentar a sua versão dos fatos". Isso porque os espaços concedidos pelo sistema comercial de TV ou o enfoque dado aos temas de interesse dos governantes não têm sido adequados – na avaliação do ministro.

Em primeiro lugar é preciso identificar os papéis da TV Pública, Estatal e Comercial no sistema de comunicação. Em linhas gerais, podemos distingui-las da seguinte forma: A TV Estatal pertence ao Estado, com funcionários pagos pelo Estado, para que o Estado comunique temas e abordagens de seu interesse à sociedade como um todo. A TV Comercial pertence à iniciativa privada, com funcionários pagos por empresários, para comunicar temas e abordagens de interesse do sistema comercial a toda a sociedade. A TV Pública pertence à sociedade organizada, com funcionários pagos por grupos sociais organizados, para comunicar temas de interesse da sociedade organizada para a sociedade como um todo.

Como se percebe, as três modalidades têm um objetivo em comum: comunicar determinados conteúdos à sociedade. Porém, a forma como isso acontece, seja em relação ao temas ou abordagens, é diferente. O ideal seria um sistema de comunicação que contasse com emissoras de televisão para cumprir os três papéis. Assim, haveria uma democratização de fato, com diferentes temas agendados, visões distintas (complementares ou opostas) de um mesmo assunto sendo ofertados à sociedade e debate público pluralizado. O que o ministro Hélio Costa está propondo com o nome de Rede Nacional de TV Pública, na verdade é uma Rede de TV Estatal, o que, aliás, já existe no sistema Radiobrás. Considero necessária e salutar sua existência, porém, é preciso identificar corretamente seu papel na sociedade.

A meu ver, o que falta no nosso sistema de comunicação é uma Rede Nacional de TV Pública de fato – que não seja instrumentalizada por interesses de governo(s) ou partido(s) governista(s), nem pela lógica imediatista do mercado – presente nas abordagens dos meios de comunicação comerciais. Um sistema de TV Estatal, ainda que receba o nome de TV Pública, Educativa, Cultural, Executiva ou outro qualquer não cumpre o papel de universalização de conteúdos e abordagens. No máximo, serve para contrapor a visão do governo àquela transmitida no sistema comercial de comunicação – o que é importante, diga-se, mas não suficiente.

Rede de TV Pública de fato deve estar mais próxima de segmentos organizados da sociedade do que do governo ou do mercado. Por exemplo, uma forma de viabilizar a TV Pública no Brasil seria vinculá-la ao sistema brasileiro de ensino superior, que atualmente é formado por instituições públicas e privadas, cujas estruturas – de forma complementar – permitem a produção de conteúdos e estéticas que realmente democratizariam a comunicação de massa no Brasil, incorporando à produção atual (Estatal e Comercial) pontos de vista de segmentos da sociedade organizada, que habitam os espaços universitários. Se o governo quiser uma rede de TV pública de fato, deve discutir nesses termos. Caso contrário, a proposta ficará restrita à criação de um "palanque eletrônico" para governantes e seus representantes de plantão responderem aos interesses da iniciativa privada, que, por natureza, têm mais facilidade em ocupar espaços no sistema comercial de comunicação.

Emerson Urizzi Cervi é jornalista, doutor em Ciência Política pelo IUPERJ, professor de Teorias do Jornalismo e coordenador do Núcleo de Produção em Rádio e TV da UniBrasil.

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