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Síntese do dia 2

Um limite necessário

No início da revolução industrial, na Inglaterra do século XVIII, a violência das forças produtivas que o capitalismo libertava destruía tudo o que parecia sólido, arrancava milhões de homens do campo para jogá-los nas indústrias nascentes, criava riqueza e também miséria, empregos e também desemprego, esperança e desespero. A concorrência desapiedada entre os capitalistas decretava falências e fechamento de fábricas, e as próprias fronteiras nacionais não eram um limite seguro: com efeito, guerras por mercados foram a tônica do século XIX.

Com o tempo, no interior do próprio capitalismo começou a se estabelecer um consenso de que era necessário, inclusive para a sobrevivência do próprio sistema, pôr um freio aos apetites dos empresários, e que o Estado era o instrumento talhado para esse fim. Uma série de leis entrou em vigor em todos os países capitalistas avançados, leis que tentavam impedir a concorrência desleal, a prática de preços artificialmente baixos (que sofriam elevação assim que se eliminava a concorrência) e, por conta do desenvolvimento do movimento operário independente, esses países acabaram adotando legislações limitando a jornada de trabalho e tornando as condições de trabalho mais humanas e suportáveis.

Não há, portanto, nada de novo ou estranho em propor leis que regulem a circulação de mercadorias ou as condições de trabalho. Do nosso ponto de vista, o horizonte deve ser sempre o interesse social, a criação ou manutenção de postos de trabalho, a melhoria das condições de vida.

Assim, chegamos à questão dos postos de combustíveis dos supermercados e shoppings centers. O projeto de lei de minha autoria, aprovado pela Assembléia Legislativa e sancionado pelo governador Roberto Requião, proíbe os hipermercados e shoppings centers de abrirem postos de combustíveis que se utilizem do mesmo CNPJ ou inscrição estadual desses estabelecimentos, por entender que se trata de concorrência desigual com os demais empresários do setor de comércio dos combustíveis. Por que desigual? Porque os hipermercados e shoppings centers têm mecanismos de compensação tributária, podendo creditar o ICMS pago a mais pelos combustíveis nas demais mercadorias que comercializam; além disso, empregam como frentistas funcionários não especializados, sem precisar obedecer à convenção coletiva de trabalho da categoria (e, portanto, pagando salários mais baixos).

A lei recentemente sancionada garante condições de sobrevivência aos postos de combustíveis situados nos bairros e representa uma defesa dos direitos dos trabalhadores desses postos, representados por seu sindicato. Parece-me evidente que se trata de resultados que atendem ao interesse social.

Pode-se argumentar que a cobrança de preços mais baixos pelos combustíveis é de interesse da população. Mas esse argumento não convence. Primeiro, porque, como já vimos, os baixos preços têm um custo social elevado. Em segundo lugar, até quando esses preços permanecerão baixos? Como a história demonstra, eles subirão quando se eliminar a concorrência.

Estabelecer limites à concorrência significa impedir a extrema concentração de ramos inteiros da produção e comércio. Significa garantir, no fim das contas, que a concorrência não se transforme num jogo de cartas marcadas, cujo resultado só pode ser o prejuízo para o consumidor.

Péricles de Mello é deputado estadual (PT) e ex- prefeito de Ponta Grossa.

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