Um raro esforço coletivo, com senso de urgência, foi o maior responsável pela votação e aprovação, na última quarta-feira, dia 11, do Projeto de Lei Complementar (PLC) 79 na Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicações e Telecomunicações (CCT) e também no plenário do Senado. Naquele momento foi possível perceber o entendimento de todos a respeito da necessidade de reformulação da Lei Geral das Telecomunicações, que já tinha 22 anos e não mencionava a palavra "internet" em seu texto original.
Com a aprovação da PLC, entre outros avanços, veio o fim da reversibilidade dos bens, ou seja, a infraestrutura de comunicação não será mais devolvida ao governo, finda a concessão. Esse era um dos pontos mais controversos e polêmicos, tanto que a diferença entre a valoração, a depender de quem calcula, vai de R$ 100 bilhões até valores negativos (diante dessa situação, é o governo que deveria indenizar as concessionárias). Esses bens compreendem, basicamente, imóveis e ativos (rede de cobre) que há muito são desnecessários para prestação dos serviços, além de contar com altos custos de manutenção. Por isso, contesto que sejam um "presente" para as empresas, como alguns defendem.
Cada 1% de aumento no acesso à internet gera um crescimento adicional de até 0,19% do PIB.
Com o fim da reversibilidade as companhias poderão desinvestir esses ativos e gerar caixa para empregar na expansão da banda larga. E isso é extremamente importante para o país. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) calcula que o acesso à internet tem impacto efetivo na geração de riqueza. Foram analisados dados de 5.564 municípios, chegando a projeções específicas para o Brasil: cada 1% de aumento no acesso à internet gera um crescimento adicional de até 0,19% do PIB.
O investimento em banda larga também é necessário se pensarmos no futuro com o 5G, que depende da ampliação da rede e alcance da fibra ótica para funcionar. Todos se beneficiam com a nova regulamentação; ela se moderniza na era do aumento constante da necessidade de conectividade (fixa e móvel), tratando esse serviço como essencial, ante a telefonia fixa. As operadoras ganham por contar com uma regulação mais dinâmica, desobrigando empresas concessionárias a investir em orelhões e universalização de telefone fixo, ambos em desuso.
Apenas para referência: segundo especialistas, a receita gerada pelo uso de orelhão para as operadoras, por ano, é de R$ 500 mil. Em contrapartida, nos últimos anos, o custo de manutenção alcançou entre R$ 350 milhões a R$ 400 milhões, o que permitiu a comercialização privada de espectros, entre outros tantos avanços.
O consumidor final também ganha, porque com mais investimento surgem mais opções e oportunidades de escolher serviços melhores.
VEJA TAMBÉM:
- As telecomunicações precisam de uma lei que acompanhe seu avanço (artigo de Carlos Eduardo Sedeh, publicado em 26 de julho de 2019)
- A despolitização das agências reguladoras (artigo de Sérgio Tannuri, publicado em 24 de setembro de 2018)
- Inovação e subdesenvolvimento (artigo de Rodrigo Fernandes, publicado em 11 de abril de 2019)
Além da celeridade na aprovação da PLC no Senado – a despeito de estar em tramitação na casa desde 2016 –, o mercado também deve comemorar o fato de essa legislatura contar com parlamentares mais sensíveis às causas que impactam nas telecomunicações. Esse tema é muito estratégico para ser tratado com emoção e ideologia; é preciso buscar referência em teses internacionais de mercado e casos de sucesso. A demora na aprovação do PLC fez com que uma quantia próxima a R$ 2 bilhões fosse gasta com expansão e manutenção de orelhões, promovendo um evidente atraso no investimento das concessionárias em redes de fibra ótica, devido a essa falta de definição da reversibilidade.
Não podemos correr o risco de deixar outros temas relevantes ao desenvolvimento do mercado de telecomunicações, que é pela sua própria natureza bastante dinâmico, esperarem em uma gaveta por anos, até que finalmente sejam decididos. É mandatória uma definição estratégica e clara para as metas de universalização de acesso, uso de infraestruturas existentes (postes e dutos) e ocupação de direitos de passagem, entre outros temas que abarcam o desenvolvimento do mercado. Um primeiro e importante passo foi dado, mas não podemos nos contentar apenas com isso.
Carlos Eduardo Sedeh é CEO da Megatelecom e diretor-executivo da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp).