Com um mínimo de vontade política e sem temer as ameaças daqueles que serão atingidos pela implementação das medidas necessárias, a atual Mesa Diretora pode passar para a história
Merecem amplo apoio da sociedade civil paranaense as recentes medidas adotadas pelo novo presidente da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), Valdir Rossoni (PSDB), para moralizar de uma vez por todas o parlamento estadual. Tendo em vista a inércia das administrações anteriores em atacar de frente as raízes do vergonhoso descalabro em que se encontra o Legislativo paranaense, era de fato indispensável um choque de gestão e de moralidade para estancar o ciclo vicioso de corrupção, impunidade, desvios de verba, prevaricação, chantagem e crime em que havia se transformado essa casa legislativa, e que vieram à tona com o conjunto de reportagens efetuadas pela Gazeta do Povo e pela RPC TV.
Ao adotar com firmeza esse conjunto de atos visando romper com a inércia de gestões anteriores para a efetiva resolução das irregularidades e denúncias, a atual Mesa Diretora responde aos reclamos mais profundos da opinião pública paranaense, cuja manifestação mais destacada foi a campanha O Paraná que Queremos, organizada por vários segmentos da sociedade civil no ano passado.
Entretanto, aqueles interessados na efetiva modernização do Legislativo paranaense devem resistir à tentação de transformar a atual crise de legitimidade por que passa a Alep num simples "caso de polícia", como se fosse suficiente convocar o capitão Nascimento, o Bope e os blindados da Marinha para subir a rampa do parlamento e liquidar de uma vez por todas com a ópera bufa de ameaças de seguranças irregularmente contratados, espionagem e tráfico de influências existentes nos corredores do Legislativo estadual.
Com efeito, por mais positivas e louváveis que sejam essas medidas punitivas, elas não resolvem, por si mesmas, o conjunto de anomalias quotidianamente observadas na Alep ao longo dos últimos anos. É necessário combinar essas medidas punitivas com uma visão de futuro e adotar políticas que modernizem de fato o Legislativo estadual, reaproximando-o da sociedade paranaense, e tornando o parlamento do Paraná compatível com o clima de renovação política e de produção de novas elites, de perfil mais modernizante, que atualmente ocorre em nível estadual.
Caso contrário, corremos o risco de que, dentro de muito pouco tempo, retornem com a mesma intensidade as práticas viciosas do passado, e que as medidas ora adotadas sejam meramente paliativas, fazendo lembrar o dito do velho escritor italiano Tomaso di Lampedusa, segundo o qual deve-se de vez em quando efetuar mudanças superficiais para que tudo continue como está.
Dentre essas medidas que contribuirão para a efetiva modernização do Legislativo estadual, podemos enumerar as seguintes, a nosso ver imprescindíveis para a revitalização da Alep e que podemos considerar como desafios para a Mesa Diretora e para os parlamentares da atual legislatura: (i) recadrastramento e publicização efetiva dos nomes de todos os funcionários que trabalham na Alep, com disponibilização pela internet da função e horário de trabalho de cada um deles; (ii) realização ainda neste ano de concurso público para a contratação de um corpo de funcionários estável (advogados, administradores públicos, cientistas políticos, engenheiros, especialistas em comunicação e informática) com autonomia funcional para implantar os programas de modernização do Legislativo, tal como já ocorre em outros parlamentos estaduais brasileiros; (iii) reativação e implantação de programas de valorização e qualificação dos bons funcionários da Casa que encontram-se paralisados, tais como a Escola do Legislativo, e o Centro de Operações Legislativas, dentre outros; (iv) reformulação e aperfeiçoamento do website da Alep de modo a publicizar de maneira acessível para o cidadão comum o maior número de informações sobre o que ocorre no Legislativo, tais como gastos de gabinete e presença em plenário dos deputados, votação nominal e emendas ao orçamento estadual, os diários do Legislativo, dentre outras informações relevantes; (v) realização de Comissões Parlamentares de Inquérito a fim de obrigar os acusados de irregularidades, especialmente o antigo diretor geral da Alep, a prestar contas publicamente de seus atos para a sociedade paranaense.
Isso para começo de conversa. Com um mínimo de vontade política e sem temer as ameaças daqueles que certamente serão atingidos pela implementação dessas medidas, a atual Mesa Diretora pode passar para a história como aquela que reaproximou o Legislativo estadual da opinião pública do Paraná, tornando-o compatível com os bons exemplos de gestão pública que já temos em nosso estado.
Sérgio Braga, professor do programa de mestrado em Ciência Política da UFPR, é autor de vários livros e artigos sobre processo legislativo, internet e elites políticas.
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