Imagem ilustrativa.| Foto: José Cruz/Agência Brasil
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Nas últimas semanas a mídia tem noticiado o dispêndio de vultosos valores em imóveis por integrantes da família Bolsonaro – apelidados de “clã Bolsonaro”. Tais movimentações levantaram suspeitas pelo fato de que, pelo o que consta, teriam sido realizadas com o uso de dinheiro em espécie. Mas por que esses questionamentos? É errado usar dinheiro em espécie para a compra de imóveis?

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É preciso considerar que o aprimoramento dos instrumentos bancários de transferência de valores foi notavelmente acelerado nos últimos anos – em boa parte devido à pandemia de Covid-19, e o papel moeda teve sua circulação reduzida a poucas operações rotineiras e, no mais das vezes, em pequenos valores. Nesta linha, as operações financeiras com o uso da moeda em pecúnia é, de fato, um comportamento que levanta suspeitas quanto a sua licitude, notadamente porque a maior parte da movimentação financeira no mercado paralelo é feita com dinheiro em espécie.

Para entender melhor a questão, é importante que reflita acerca das implicações criminais que podem ocorrer no uso da moeda corrente em sua forma primitiva, sobre as quais paira a suspeita de destinação para lavagem de dinheiro havendo, inclusive, atos administrativos dos órgãos reguladores a respeito de saques de elevados montantes em agências bancárias ou lotéricas.

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Sabe-se, contudo, que a utilização da moeda corrente em dinheiro possui vantagens implícitas, muitas das vezes ligadas a práticas ilícitas de evasão fiscal – quando o agente não deseja declarar o capital, por exemplo. Ou simplesmente para obter descontos em estabelecimentos comerciais – e nesse caso não há qualquer ilicitude.

Todavia, comprar bens com valores em espécie é uma prática que há muito tempo vem atraindo a atenção dos órgãos dedicados à prevenção da lavagem de dinheiro, como é o caso do Banco Central do Brasil (BACEN).

O BACEN edita regularmente cartas circulares que exemplificam situações que podem conter indícios de lavagem de capitais, as quais devem ser informadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) pelas entidades obrigadas à comunicação compulsória, como é o caso da Carta Circular 4.001/2020, a principal norma a respeito do tema.

Apesar das críticas dirigidas às cartas circulares do BACEN, fato é que os cartórios têm dominado o ranking de comunicações feitas ao COAF, sendo a “Comunicação de Operação em Espécie (COE)” a mais comum, fator este que pode indicar o atrativo do mercado de compra e venda para a prática de lavagem com valores em pecúnia.

À vista disso, o Projeto de Lei 3.951/19, de iniciativa do Senado Federal, pretende estabelecer limites para o uso de dinheiro em espécie nas operações comerciais, definindo patamares de uso diário de R$ 5 mil para algumas negociações, objetivando evitar o uso de dinheiro físico com finalidades ilegais, como impedir o rastreamento da transação ou, até mesmo, a própria lavagem. A movimentação de dinheiro em moeda é uma prática que realmente chama a atenção para a possível ocorrência de uma infração penal que afeta a todo o sistema financeiro nacional, sendo coerente que haja a preocupação dos órgãos fiscalizadores acerca de seu uso totalmente desregulado. Entretanto, por si só, o uso de dinheiro em espécie não é ilegal.

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O uso de moeda corrente não é, de forma alguma, por si só caracterizada como crime, nem tão pouco como ilícito fiscal, sendo um meio de movimentação que muitas das vezes beneficia a ambas as partes de uma operação comercial – até pela desnecessidade de arcar com elevados custos relacionados à movimentação bancária.

Leonardo Tajaribe Jr. é advogado criminalista, especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM), pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM). É membro da Comissão de Políticas Criminais e Penitenciárias e delegado de Prerrogativas da OAB-RJ.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]