Há algum tempo a educação deixou de ser um tema absolutamente pedagógico para entrar na esfera jurídica. Recentemente, o cenário educacional foi mudado pela promulgação de duas leis federais que alteraram a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (nº 9.393/96). São as leis 11.114/05 e 11.274/06. Ambas tratam da inserção da criança de 6 anos de idade no ensino fundamental, aumentando assim o tempo de escolaridade obrigatória de oito para nove anos. Cabe, portanto, aos gestores públicos tanto a preocupação com o cumprimento da legislação vigente quanto com os aspectos pedagógicos envolvidos.
Garantir a entrada da criança um ano mais cedo no ambiente escolar é assegurar mais oportunidades de aprendizagem, investindo no seu sucesso. Porém há que se considerar o papel social da infância na sociedade atual. Quem é esta criança? Como ela constrói seu conhecimento? Teorias tratam dessa construção como as de Jean Piaget, que trata das fases de desenvolvimento infantil, e as de Lev Vygotsky, que afirma que o desenvolvimento do indivíduo está diretamente ligado com o ambiente socio-cultural no qual está inserido e que o sujeito aprende, portanto, a partir do estabelecimento de relações com outros de sua espécie. Assim, ao ser inserida no contexto escolar, a criança tem a oportunidade de ampliar seu conhecimento sobre si mesma e sobre o mundo que a cerca.
Ao refletir sobre essas questões é importante considerar que, mais que a garantia de uma vaga, a criança precisa de condições reais de aprendizagem. Sendo assim, a escola necessita de um currículo próprio que respeite a singularidade da infância. Não se trata, portanto, de criar um novo currículo para atender às crianças de 6 anos, mas de replanejar o currículo para os nove anos do ensino fundamental, com respeito à infância, dando importância ao lúdico no contexto educacional.
Sendo assim, o trabalho na educação infantil e no ensino fundamental não podem ser dissociados, deve haver uma continuidade nos processos de aprendizagem. Ao refletir sobre isso, perguntamos: é salutar que a criança seja inserida no ensino fundamental antes dos 6 anos? Parafraseando Vinícius de Moraes, a criança de 6 anos está naquela "idade inquieta" em que já não é mais uma pequena criança e não é, contudo, uma criança grande. Espera-se, portanto, do ponto de vista pedagógico, que possa ser iniciada no processo formal de alfabetização e letramento, pois já tem condições para compreender e sistematizar conhecimentos. Espera-se que tenha condições de permanecer por mais tempo concentrada. Já à educação infantil cabe potencializar a vivência infantil, assegurando tempo e espaço para o brincar, o que trará consigo a compreensão do outro, a importância de regras e a interação com seus pares. Enfim, a criança construirá sua identidade social. Este tempo precisa ser respeitado. Se educadores e legisladores não ficarem atentos para a relevância deste período infantil, estarão subtraindo da criança a fase mais preciosa de sua infância, forçando-a a pular etapas em seu desenvolvimento.
Assim, não se trata de garantir a entrada antes dos 6 anos no ensino fundamental, precoce do ponto de vista pedagógico e biológico, mas de assegurar que ela possa ser atendida até essa idade na educação infantil, respeitando-se a singularidade desse período da infância. É dever dos gestores públicos ampliar esse acesso, dando direito a toda criança de conviver, construir seu conhecimento e, a seu tempo, realizar uma transição tranquila para o ensino fundamental, etapa na qual ela concretizará a educação formal.
Elizabeth Regina Streisky de Farias, mestre em Educação pela UEPG, é coordenadora do ensino fundamental na Secretaria Municipal de Educação de Ponta Grossa.
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