Congresso Nacional, em Brasília.| Foto: Roque de Sá/Agência Senado

Diferentemente do erro individual – aquele fato que chamamos de "falha" e nos persegue cotidianamente –, que se busca tratar com o desenvolvimento de uma moral a guiar e motivar o sujeito a evitar nele persistir, o erro político é amoral. Não significa que a política deva normalizar a imoralidade, mas sim que a moralidade não contribui para o aprimoramento das práticas políticas, pois estas se orientam por motivações que são indiferentes aos valores morais dos indivíduos. A política é um meio para vários fins; a moral é um fim em si mesma.

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Em regimes autoritários, o erro político fica ocultado pelas barreiras que o grupo a exercer o poder impõe aos cidadãos, obstando-os de conhecer as “entranhas do poder”. Esta é uma das maiores fortalezas das ditaduras e que harmoniza em perfeição à sua aparência de eficiência, mais devida à impossibilidade de crítica pelos indivíduos que pelos resultados das ações estatais. Assim, apenas a fração perfeita do poder alcança a esfera pública: as falhas do poder são por ele mesmo cobertas. Nas democracias, ao contrário, reverberam-se os erros políticos: todos parecem estar em erro e tudo parece estar errado, principalmente ao se cometer o pecado de utilizar um padrão moral para indicar os erros políticos (e dos políticos).

Para termos a liberdade de desenvolvermos uma moralidade individual, exige-se que defendamos que a política seja amoral

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Eis uma trágica porta de saída da democracia: defender uma moralização da política ao mesmo tempo em que se desacredita as soluções que as instituições democráticas apresentam, sob o argumento de estas serem insubmissas a regras morais “oficiais”. As falhas políticas na democracia devem ser evidenciadas e solucionadas com soluções políticas, e não morais, sob pena de esvaziar o conteúdo das instâncias políticas de representação de poder e, nesse vácuo, sujeitos oportunistas fulminarem a possibilidade de moral individual dos cidadãos mediante a imposição de sua própria moral. A moral individual do sujeito do cidadão deve se conformar à moral oficial, caso contrário quem estaria errado é o cidadão. Nessa ótica, o Estado não erra, pois ao lado dele está a moral, o erro é do sujeito que não tem a moral adequada à moral pública.

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Para termos a liberdade de desenvolvermos uma moralidade individual, exige-se que defendamos que a política seja amoral. Não que tenhamos de aceitar imoralidades de agentes políticos, ou que a moral do cidadão não deva ser valorizada, mas sim que pautar discussões políticas com valores morais é um caminho direto para impedir a existência de valores morais dos sujeitos da planície periférica, os quais seriam suplantados por valores impostos por aqueles do planalto central. Assim, é desejável que a falha do indivíduo seja objeto de apreço em sua esfera moral subjetiva, e que a falha do Estado seja exposta no espaço público via debate político – o inverso conduzir-nos-ia a um pueril autoritarismo.

Fernando Redede Rodrigues é defensor público.

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