| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Os mais recentes resultados do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), por município, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e pelo Ministério da Educação, mostram como a diferente situação econômica e social das famílias ainda é fator discriminante na formação educacional do jovem.

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Os dados mostram que nossa desigualdade social produz um cidadão de segunda categoria, exemplo maior da perversidade da pobreza, com baixo desempenho educacional. Com raras exceções, onde a situação socioeconômica é melhor, os índices simplesmente dão um salto. É gritante a diferença de desempenho entre famílias que têm internet, televisão, situação social e participação nos meios de comunicação em relação às que não têm. Deveríamos ficar envergonhados, pois estamos criando uma geração de órfãos da cidadania.

As pessoas não estão percebendo que o problema não está só no currículo

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A gravidade de nossos problemas já começa na primeira infância e na educação básica. Como exigir alto desempenho de uma criança que nos primeiros anos de vida não teve leite materno, cuidados e alimentação adequada, se a inteligência é consequência da vida saudável justamente nesta fase da vida? O mesmo acontece no ensino fundamental. Se o aluno vem de uma família pobre, que depende da merenda escolar, invariavelmente vamos nos deparar com problema idêntico. Estamos apontando os canhões para o lado errado e a razão de tudo isso é uma sociedade cada vez mais egocêntrica, egoísta, e – pior – que não enxerga o desafio. Diz-se democrática, garante não discriminar raça e cor, quando na realidade mostra totalmente o contrário, como provam os indicadores divulgados recentemente pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Analisando os resultados de milhares de escolas avaliadas no Enem, há outra constante: as melhores são particulares dotadas de todas as ferramentas para um bom aprendizado. As primeiras públicas estão mais distantes do topo e são poucas. Os números mostram o lado mais duro de nossa realidade. A situação socioeconômica como fator lastimável; falta de infraestrutura como fator determinante; falta de equipamentos tecnológicos e internet também; além de professores desmotivados, pois não têm material didático, qualificação e nem acesso ao que existe de mais moderno para dinamizar o ensino.

Tudo tem efeito dominó. O aluno entra no ensino fundamental e vai sendo empurrado para frente com todas as deficiências em Matemática, Língua Portuguesa e outras disciplinas. Quando, finalmente, poucos entram no ensino médio, já trazem a carga de atrasos e defasagens que também vão se perpetuar. E aí temos as primeiras consequências: evasão e abandono. Com isso, esses jovens vão formar a legião dos chamados “nem, nem”. Não mais estudam, simplesmente por carências, desânimo e desalento; e também não trabalham, porque não foram preparados para qualquer ofício.

As pessoas não estão percebendo que o problema não está só no currículo. Ele representa parte, mas não é fator determinante, apesar de o tema ser controverso e, pior, debatido por profissionais que nunca entraram em uma sala de aula do ensino médio para cair na real.

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Estamos formando uma geração de deserdados e desprovidos das ferramentas básicas para serem cidadãos brasileiros. Essa dívida vai aumentando dia após dia, e será cobrada pelas novas gerações, que dirão que somos cúmplices, pois sabíamos dos problemas e não os resolvemos.

Por isso essa é uma questão de guerra. Temos de resolver as questões fundamentais do sistema educacional, em que todos os níveis e graus estão interligados. Separar apenas um deles para tentar resolver o problema como um todo é colocar remendo novo em roupa velha.

Gabriel Mario Rodrigues é presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES).