A Igreja Católica não toma posição partidária e nem se configura como um partido político, mas propõe valores que humanizam a política, refreando sua tendência de se tornar mera disputa de interesses pelo poder. Contudo, os que pouco entendem o significado da laicidade reivindicam a extinção da religião. Já os intelectuais do multiculturalismo a toleram, entretanto, com restrições bem definidas quanto à sua atuação na vida pública.
Ao contrário dos colegas da mesma vertente, a marxista Rosa Luxemburgo defendeu a possibilidade de coexistência da Igreja juntamente com o sistema comunista, desde que a velha instituição cristã não usasse do púlpito para se opor ao regime e suas atrocidades. Ora, é essa mesma mentalidade de adestramento da religião, tolerando-a apenas enquanto um “cão mudo”, encarcerado na sacristia, que evidenciamos hoje quando um religioso se atreve a criticar um líder político.
Nesta sociedade laica de culturalismo marxista, a religião só presta e só pode existir se favorecer os governantes
Na missa do dia 6, o então bispo auxiliar de Aparecida, dom Darci Nicioli, rezou no Santuário Nacional numa prece espontânea pedindo “a graça de pisar a cabeça da serpente, de todas as víboras, que insistem e persistem em nossa vida, daqueles que se autodenominam ‘jararacas’. Pisar a cabeça da serpente, vencer o mal pelo bem, por Cristo, Nosso Senhor”. Foi uma resposta à declaração arrogante do ex-presidente Lula, depois que o mesmo prestou esclarecimentos à Polícia Federal por suspeitas de corrupção. Bastou o vídeo do bispo circular pelas mídias sociais que, em tendenciosos comentários, aquela categoria de passividade foi exigida da Igreja Católica, como condição determinada para sua sobrevivência nesta sociedade laica, mas de culturalismo marxista, em que a religião só presta e só pode existir se favorecer os governantes, por mais perversos que possam ser.
A Igreja, mais do que qualquer outra instituição, conheceu as variáveis formas de governo dos últimos 20 séculos, bem como seus disfarces de filantropia que ocultam seus piores esquemas de corrupção. E, se há também vergonhosas manchas de corrupção na história da Igreja, não foram causadas senão por vínculos políticos, quando, na tentação de se tornar também a Igreja um partido, ela adulterou sua identidade transcendental, reduzindo-se a mais uma facção com seus interesses.
Na verdade, desde a sua origem, o cristianismo se configurou como livre de ideologias políticas, e, por isso mesmo, capaz de denunciar com critérios apartidários chefias corrompidas, porém encapadas por discursos de moral solidária; pois os ideais da Revolução Francesa, do comunismo, do nazismo – víboras do mesmo ninho –, que tanto prometeram um paraíso terrestre, com suas siglas e lemas, mais infernal tornaram a vida humana e tentaram amordaçar a Igreja.
Como na história do lenhador e da raposa, talvez em algum momento, ainda que dramático, nossa sociedade descubra que o sangue nos dentes do “cão mudo” é das cobras peçonhentas que a tentaram destruir.
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