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Perguntas e respostas para quem precisa da Justiça ou tem ação em andamento em tempos de coronavírus
Imagem da justiça segurando a balança| Foto: Pixabay

A epidemia da Covid-19 trouxe significativas modificações na sociedade contemporânea, atingindo políticas públicas, relações econômicas e comportamentos sociais. E, uma vez que o jurídico deve se comunicar com a realidade, tudo isso provoca imediatos reflexos no Direito Público, cujas transformações pretende-se aqui enumerar.

Em razão da impossibilidade de as regras endógenas de funcionamento do mercado, isoladamente, definirem a retomada do crescimento econômico, observa-se a tendência a um retorno ao maior intervencionismo estatal, para lidar com o tempo de instabilidade que ora se vivencia, como ocorre em relação aos vultosos aportes financeiros públicos no mercado global.

Fundamenta também a intervenção a necessidade de se assegurar a justiça social. O Estado não atua na ordem econômica apenas para promover o reequilíbrio das forças produtivas, mas também para defender o interesse dos mais necessitados, por meio de institutos preconizados até mesmo pelos expoentes do liberalismo, como faz Milton Friedman ao defender o que chama de imposto negativo. Bom exemplo disso é o auxílio emergencial instituído pela Lei 13.982/2020.

Em termos procedimentais, a utilização cada vez mais frequente dos mecanismos de comunicação virtual e de desmaterialização dos processos administrativos é capaz de conferir transparência e, na mesma medida, maior participação dos cidadãos nas decisões da administração pública.

Por outro lado, vislumbra-se a aceleração dos mecanismos de consensualidade, em nítida superação da posição de supremacia estatal em relação aos particulares, considerando que os mecanismos ortodoxos da teoria da imprevisão não se mostram suficientes para a solução dos conflitos. A necessidade de buscar soluções individualizadas, em caráter emergencial, a envolver, inclusive, nas relações obrigacionais, a partilha de riscos advindos da força maior apresenta-se como fator de propulsão para o surgimento de uma administração mais democratizada e dialógica.

Outro ponto desborda da crescente complexidade dos fatos, impondo aos administradores públicos a rigorosa observância da racionalidade científica e nada distante disso, provocando natural redução da margem de discricionariedade das decisões administrativas. A mesma ordem de ideias é integralmente aplicável aos provimentos de cargos em comissão no setor público, a exigir dos nomeados, progressivamente, mais formação técnica que apadrinhamento político.

Considera-se, ainda, a dificuldade do controle externo em relação às gestões da crise, em virtude do volume de atos e recursos, todos manejados em estado de calamidade pública e de alta tensão, exigindo-se mais o controle dos resultados que dos próprios meios. Certo, ainda, que recentes normas e precedentes judiciais alinham-se à suspensão de metas fiscais, simplificação dos atos de gestão, alargamento das margens de endividamento e de gastos públicos.

Marca também o novo Direito Público a intensificação da regulação por meio de atos infralegais. Explica-se. A notória urgência de adoção de mecanismos interventivos reclama a flexibilização da legalidade, trabalhando o Poder Executivo à margem do parlamento, centralizando as decisões daquilo que, em sua ótica, venha a ser o interesse público. Preocupa, evidentemente, que tal atividade normativa possa representar supressão indevida de direitos fundamentais.

Esses aspectos, rapidamente destacados, não parecem efêmeros, mas, antes, anunciam-se como caracteres permanentes de um novo Direito Público. Espera-se que dele decorram a segurança jurídica, o fomento, a moralidade, a justiça social e posturas mais colaborativas, todos eles requisitos igualmente indispensáveis ao desenvolvimento.

*Cláudio Smirne Diniz, doutor em Direito, é promotor de Justiça e professor de Direito Administrativo.

*Hirmínia Dorigan de Matos Diniz, mestre em Direito, é procuradora de Justiça e professora de Direito à Educação.

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