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A Lei Rouanet é uma das normas mais controversas da nossa legislação. Criada para estimular projetos em um país onde cada vez menos se consome cultura, seus resultados práticos parecem ser insatisfatórios e levam à cooptação política da classe artística por parte do governo federal através de dinheiro público. Por isso, parte da população brasileira, principalmente a de inclinação mais liberal e conservadora, hoje se mostra bastante contrária à lei. No entanto, esse debate não é tão simples quanto parece, mesmo dentro de uma lógica de direita.

A ideia da lei é relativamente simples: o interessado em ter seu projeto cultural financiado o apresenta ao Ministério da Cultura (MinC), que, após análise técnica, aprova ou não o requerimento. Aprovado, sempre com um teto de limite, o detentor do projeto parte para a busca de pessoas físicas e jurídicas interessadas em financiá-lo, podendo abater o valor doado em tributos.

Talvez a grande crítica à Lei Rouanet se refira à obscuridade nos critérios de aprovação dos projetos

A quem interessa a cultura?

Desde Kant, a cultura é considerada a mais eficiente medida de civilização, parte indissociável do aperfeiçoamento, racional e moral, da história e da sociedade humana; é, em si, transcendente e imaterial.

Leia o artigo da educadora Wanda Camargo

Cumpre destacar que existe sempre a possibilidade de o promotor do evento cultural falhar em levantar tais recursos, caso ninguém esteja interessado em um produto ruim. Isso ocorre porque existe, por trás desse mecanismo, uma ideia de natureza liberal. O liberalismo argumenta que a distribuição privada de bens e serviços é sempre mais eficiente que a distribuição pública. Não à toa, há um esforço de todas as nações desenvolvidas no sentido de cada vez mais aumentar a abrangência de casos em que as doações feitas a instituições de caridade e de serviços educacionais, médicos e culturais possam ser deduzidas da tributação. Visão bastante razoável.

E, ainda dentro de uma perspectiva liberal, a Lei Rouanet dá ao contribuinte a chance de escolher onde parte do seu dinheiro que lhe será tomado pelo Estado será utilizado, ao destinar, a seu critério, recursos para um projeto cultural específico.

Pena que, no Brasil, boas ideias acabam sempre distorcidas. Os projetos aprovados normalmente são autossustentáveis, de cunho politizado e de pessoas ligadas ao governo – ou seja, totalmente fora do espírito original da lei.

Talvez seja essa a grande crítica à Lei Rouanet: a obscuridade nos critérios de aprovação dos projetos, quase sempre privilegiando os amigos do petismo. Se as regras fossem mais claras e a aprovação dos projetos dependesse apenas de critérios jurídicos, sem análise de conteúdo, ou com padrões muito reduzidos, a Lei Rouanet seria liberal. Mas, com essa interferência inegável, acaba havendo uma intromissão estatal odiosa, com fortalecimento do poder governamental, e não seu esvaziamento, como seria de se esperar.

Não se pode ignorar ainda que, mesmo com todo o dirigismo estatal, a direita brasileira normalmente falha em obter esse tipo de benefício, não por questões políticas, mas por questões técnicas. Recentemente, uma editora aprovou projeto de quase meio milhão de reais para publicar livros sobre liberalismo, em um caso raro de profissionalismo da direita brasileira, justamente porque teve rigor técnico no projeto.

Com todos os elementos apresentados, fica-se com a impressão de que a Lei Rouanet, para se adequar a um espírito liberal, precisa antes ser reformada que abolida e, por outro lado, a direita brasileira pode se tornar um pouco mais profissional para que possa vencer a guerra cultural com a esquerda e consertar o país.

Bernardo Santoro é diretor-presidente do Instituto Liberal.
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