A crise do federalismo nacional instalou-se no plano fiscal. A Federação, como forma de estruturação do Estado Nacional, foi introduzida concomitantemente com a Republica. Todavia, os seus processos históricos, embora consagrados pela Constituição de 1891, tiveram origem, desenvolvimento e maturidade distintos. A Federação correspondeu ao coroamento de lutas desenvolvidas ao longo do Império, contra a centralização característica do Estado Unitário. Balaiada, Sabinada, Revolução Praieira, Confederação do Equador, Farrapos, são algumas das demonstrações insurgentes, afirmativas da necessidade de descentralização do poder político e financeiro, em favor das entidades periféricas na estruturação estatal, submetidas ao status de meros órgãos administrativos.
No ponto de vista da Federação, sob o aspecto financeiro tributário, a atual Constituição, promulgada em 1988, é a que mais avançou no sentido de estabelecer equilíbrio entre os entes federados.
O federalismo fiscal brasileiro intentou, na sua evolução, dotar cada ente federado, União, estados, Distrito Federal e municípios, de competência tributária poderosa, para prover as suas necessidades, principalmente no fornecimento de receita destinada a cobrir o exercício de suas funções e atribuições.
Entretanto, se, no ponto de vista jurídico e político, há igualdade atribuída pela Constituição, no exercício do poder de tributar, revela-se a fragilidade desse mecanismo de sustentação financeira, dada a heterogenia entre os estados-membros e municípios entre si. Há estados e municípios desenvolvidos e outros subdesenvolvidos. Daí que a arrecadação é pródiga em São Paulo, estado e capital, e reduzida no Acre e Piauí, bem como em 3 mil municípios do país.
Para melhorar a distribuição de renda regional e local, foi instituída a participação de alguns entes no produto da arrecadação de impostos da competência de outro ente. É o caso dos Fundos de Participação dos Estados e dos Municípios, com partilha dos recursos do Imposto de Renda e do IPI. Trata-se de receita tributária, transferida após a sua realização como arrecadação.
Todavia, para dar maior segurança e rapidez à participação nos recursos tributários, foi atribuída a titularidade direta no produto da arrecadação de certos impostos. Vale dizer, o imposto é da competência de um ente, entretanto, outro ente tem como receita própria parte da arrecadação, quando ela é gerada. A arrecadação na sua origem já pertence a terceiro ente, como receita própria, distinto do titular da competência. É o que ocorreu com o Imposto de Renda Retido na Fonte, nos pagamentos feitos pelos estados e municípios, suas autarquias e fundações, a terceiros: os 25% da arrecadação do ICMS pertencem aos municípios; 50% da arrecadação do IPVA pertencem aos municípios.
Esse modelo de financiamento equilibrado dos entes federados perdeu atualidade. A União, mediante as contribuições especiais desbalançou a harmonia financeira do sistema e tem promovido uma guerra fiscal cruel contra a periferia do Estado Nacional, vitimando também, pelo seu apetite voraz, o padecente tributário, cujos bolsos são extorquidos pelos seus tributos. As contribuições, incidindo sobre mesma base econômica dos impostos, representam mais de 70% da arrecadação federal, não sendo objeto de partilha. Há extrema centralização do produto da arrecadação dessas contribuições, em detrimento dos estados e municípios. O equilíbrio da Federação exige, para que se estabeleça novo pacto federativo no ponto de vista financeiro e tributário.
Osíris de Azevedo Lopes Filho, advogado, é professor de Direito na Universidade de Brasília (UnB) e ex-secretário da Receita Federal.
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