Outro dia conheci um casal texano com um filho que ainda usava fraldas, mas os dois já estavam pensando em colocá-lo na pré-escola de um colégio particular preparatório com alto índice de admissão universitária.
É verdade que estavam meio reticentes em fazê-lo; afinal, ambos vinham de famílias imigrantes operárias e se deram bem estudando em escolas públicas. Na teoria, acreditavam que todas as crianças mereciam chances iguais de sucesso, mas desconfio que, se conseguirem vaga na tal escolinha, não vão pensar duas vezes. Hoje em dia é difícil recusar esse tipo de oportunidade.
A história é conhecida. Há mais de uma década, psicólogos, sociólogos e jornalistas identificaram e criticam os hábitos dos “pais helicóptero” e sua obsessão por escolas. Insistem em afirmar que esse excesso de zelo parental não dá certo, só servindo para criar uma geração de jovens estressados que não sabem se virar sozinhos. Já os próprios pais se alternam entre a culpa, o pânico e o ridículo.
Mas novas pesquisas mostram que, em uma era de desigualdade, esse tipo de criação é essencial. Pelo menos essa é a mensagem do livro Love, Money and Parenting: How Economics Explains the Way We Raise Our Kids, dos economistas Matthias Doepke, da Universidade Northwestern, e Fabrizio Zilibotti, de Yale. É fato que esse tipo de educação, poderosa e extremamente dedicada, inclui alguns excessos desnecessários, e não parece ser prazerosa para os pais – mas, se conduzida de forma adequada, dá muito certo para os filhos, não só nos Estados Unidos, mas em outros países ricos do mundo.
Há mais de uma década, psicólogos, sociólogos e jornalistas identificaram e criticam os hábitos dos “pais helicóptero” e sua obsessão por escolas
Os autores explicam que a desigualdade atingiu um nível bem baixo nos anos 70, ou seja, não havia grandes diferenças entre o que a pessoa ganhava com ou sem diploma universitário. A educação rígida, então, abriu espaço para a “permissiva”, que dava aos filhos muita liberdade e pouca supervisão. Por que passar 18 anos insistindo para a garotada ter sucesso se os resultados não valiam a pena?
Na década de 80, entretanto, a desigualdade cresceu drasticamente nos países ocidentais, especialmente nos EUA, e a diferença entre os salários da mão de obra braçal e especializada aumentou; o pai permissivo foi substituído pelo “helicóptero”. Casais de classe média e alta que tinham estudado em colégios públicos e ficado noites e noites jogando bola nas ruas do bairro começaram a colocar os filhos em pré-escolas com métodos mirabolantes e a passar as noites monitorando a lição de casa e as atividades dos pequenos.
Com isso, os norte-americanos acabavam gastando cerca de 12 horas a mais por semana na dedicação parental em relação à década anterior; holandeses, espanhóis, italianos, canadenses e britânicos seguiram pelo mesmo caminho (no Japão, as mães excessivas são conhecidas como “monstros”).
Nem todas as mudanças foram racionais; quando descobriram que conversar com os filhos de 2 a 3 anos ajudava a desenvolver o cérebro dos pequenos, por exemplo, passaram a monologar com eles constantemente.
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De modo geral, porém, o novo estilo de criação parecia eficaz. Doepke e Zilibotti não conseguiram provar casualidade (para isso, teriam de determinar métodos de criação diferentes, de forma aleatória, a diversas famílias), mas, quando analisaram o Pisa – teste acadêmico feito por jovens de 15 anos em várias partes do mundo – de 2012, em conjunção com os relatórios de interação dos adolescentes e seus pais, descobriram que o “estilo intensivo de supervisão” correspondia às notas mais altas. E provou ser verdadeiro mesmo entre os jovens cujos pais tinham níveis semelhantes de escolaridade.
Não basta só ficar em cima dos filhos. Se o fizer, agindo de forma “autoritária” – definida como o estilo da pessoa que estabelece regras, espera ser obedecida e ocasionalmente reage àqueles que não o fazem –, não verá os benefícios integrais desse tipo de educação.
Os pais mais eficientes, segundo os autores, têm “autoridade”, no sentido de usar a razão e a lógica para convencer os filhos a fazer coisas que lhes são favoráveis. Em vez de obediência sumária, enfatizam a adaptabilidade, a solução de problemas e a independência, qualidades que vão ajudar seus rebentos em situações de trabalho futuras de uma maneira que ainda não podem nem conceber.
E parecem ter mais sucesso em ajudar os filhos a realizar as grandes conquistas da educação moderna, ou seja, os diplomas de graduação e pós-graduação, que hoje representam enormes vantagens financeiras. Usando dados de um estudo nacional que acompanhou milhares de adolescentes norte-americanos durante vários anos, os autores concluíram que os filhos de pais “com autoridade” tinham mais probabilidades de se formar, inclusive na faculdade, principalmente comparados com os que vinham de famílias autoritárias, fato que se provou verdadeiro mesmo quando controlaram a escolaridade e a renda dos pais.
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Os benefícios não são só acadêmicos: em um estudo britânico, os jovens criados por pais “de autoridade” registraram melhores condições de saúde física e maior nível de autoestima. Na análise norte-americana, os jovens mostraram menos propensão ao uso de drogas, cigarro ou consumo excessivo de bebidas alcoólicas; começaram a vida sexual mais tarde e se mostravam mais inclinados ao uso de preservativos.
Diante disso, por que essa opção de criação não é adotada universalmente? Os autores descobriram que as pessoas religiosas, independentemente da renda, têm mais tendência ao autoritarismo, esperam obediência e acreditam em punição física.
Já o pessoal de baixa renda e da classe trabalhadora pode não ter tempo nem recursos para pagar pelas atividades e escolas caras dos filhos – e talvez ache, com razão, que deve preparar os descendentes para ocupar cargos em que vale mais obedecer às regras do que debater ideias.
Aqueles que podem e têm condições de ser “helicópteros” provavelmente estão deixando as coisas ainda mais desiguais para as gerações futuras. E, como no caso do casal texano, isso nem sempre se alinha às suas crenças políticas. Na pesquisa Hidden Tribes, publicada no ano passado pela ONG More in Common, os participantes que valorizam mais a autoestima que a obediência dos filhos e ressaltam a criatividade sobre o bom comportamento – confirmando os modelos de pais autoritários e permissivos – tinham maiores probabilidades de votar em Hillary Clinton em 2016. Os que revelaram uma visão mais autoritária pendiam mais para o voto em Donald Trump.
Uma vez que parece não haver limites para o que os pais são capazes de fazer, o prognóstico para a educação parental não parece muito bom. E aí está outra razão para elegermos pessoas que farão dos EUA um país mais igualitário: para que nós, adultos, finalmente possamos parar de fazer lição de casa.
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