"No amor e na guerra todas as armas são válidas". Esta frase, difundida no conhecimento popular, serve para ilustrar o ambiente no qual se desenvolve a disputa política. O grande público desconhece as paixões e estratagemas que estão envolvidos na corrida pelos mandatos públicos. Cabe destacar que se trata de um fenômeno observado em todo o globo terrestre e em toda a história da humanidade. Seria muita ingenuidade esperar a santidade daqueles sujeitos sedentos pelo poder. Isso! Uma histórica corrida em busca do poder: o poder do capital, do controle sobre os outros homens, da vaidade etc. A trajetória humana se caracteriza pela subida, e descida, de líderes nos respectivos tronos.
A questão é compreender como se deu, e como se dá, o acesso ao poder. A disputa nas modernas democracias é direcionada, por óbvio, pelo controle da lei, mas, quando os candidatos encontram brechas no sistema jurídico vigente, supõe-se que a tendência é recorrer ao benefício deixado à prova em detrimento dos adversários.
No Brasil, o abuso do poder político vem ganhando destaque desde a polêmica levantada sobre a conduta do então presidente Lula ao expor a sua ministra (e candidata) Dilma Rousseff em eventos como grandes inaugurações, entrevistas etc. Restou uma impressão de que o presidente estava se aproveitando da sua agenda política para expor uma candidata ao público, em detrimento dos demais candidatos.
Contudo, cabe destacar que não se trata de um evento isolado; ao contrário, é comum que políticos já seguros no poder façam uso da máquina pública para garantir os votos. Note-se que há duas formas de abuso de poder: um é oriundo de grupos econômicos; o outro, dos recursos existentes na própria infraestrutura estatal. Em ambos os casos, o direito eleitoral brasileiro procura minimizar os impactos do poder desproporcional utilizado no convencimento do eleitor.
A eleição existe com o intuito de se consolidar o consenso dos cidadãos na escolha dos gestores do poder político. A importância desse processo é vital ao regime democrático; logo, o interesse sobre o processo coletivo é, em tese, maior que os interesses privados e individuais. O cidadão tem, sim, o direito de votar e de ser votado, mas este direito individual não deve soterrar os interesses da coletividade, ou seja, uma democracia sadia.
Neste entendimento, o artigo 14 da Constituição é claro ao transferir à lei complementar a incumbência de consolidar um sistema no qual se garanta a "normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta". Contudo, o sistema carece de constantes ajustes, haja vista a evolução tecnológica, econômica, social e comunicativa. Algumas sociedades são mais sensíveis às formas de acesso ao poder e, por causa disso, criam regras capazes de coibir o tratamento egoísta empregado por grupos em detrimento dos interesses de toda a sociedade.
É importante desenvolver um sistema jurídico capaz de estabelecer "freios" aos grupos historicamente arraigados no poder, pois, conforme a sociedade evolui nos interesses, as demandas vão surgindo. A tributação é universal, mas os benefícios públicos são individualizados. E quem direciona tais recursos? A resposta a esta questão pode dimensionar o quão é prejudicial ao regime democrático o uso da máquina pública para fins clientelistas, mas é necessário compreender que se trata de um fenômeno real e universal, passível de repreensão da sociedade, que não pode permitir a deturpação do processo eleitoral.
Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior, mestre em Gestão Pública, é professor de Direito Eleitoral no Centro Universitário Internacional Uninter.
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