Quando naquele inesquecível 4 de outubro de 1957 "o mundo acordou", ninguém poderia supor que um boliche tamanho família de quase 84 quilos e 58 centímetros de diâmetro estava girando ao redor da Terra sob o nome de Sputnik I. Esse respeitável careca, com apenas quatro fios de cabelo, isto é, antenas, cumpria uma órbita elíptica, cuja distância ao nosso planeta variava de 230 a 950 quilômetros, aproximadamente, gastando mais ou menos 96 minutos para completar uma volta. Nos anos que se seguiram toda uma geração assistiu incrédula, gol após gol de uma partida que se afigurava interminável, protagonizada por russos e americanos. Um dia a cortina de ferro ruiu, o muro de Berlim veio abaixo, a guerra fria acabou. Esse jogo não pode ser 1 a 1. Se o meu "time" perder eu mato um. Não perdeu, não matou. Os adversários, incrível, se aliaram e se alinharam. E ainda buscaram parcerias.
Da Skylab à Mir foi um pulo. Da Lua à Marte, outro. Sondas cada vez mais sofisticadas tem sido disparadas para todos os quadrantes do sistema solar local. O planeta Plutão já está enfeitando a casa para receber, dentro de dez anos, a visita dos terrestres representada pela encomenda que estamos enviando através do "sedex" interplanetário.
12 de abril de 1961! Data histórica para nós humanos. O primeiro homem enfrentava o espaço sem atmosfera. Yuri Gargarin, o herói, em sua nave Vostok, orbitou tres vezes em torno da Terra.
Por que o homem deseja com tanto frenesi ir ao espaço? Porque o seu espírito é, iminentemente, aventureiro. A curiosidade é a locomotora de todos os nossos instintos e decisões. A curiosidade busca a aventura e essa, por sua vez, implica encontrar resposta à tantalizante questão da vida similar à nossa em outros astros.
Em 1958 o físico francês Charles Noel Martin declarou: "Enquanto o homem se manteve preso em seu planeta, esmagado pela força da gravidade que o retém, não sonhou muito com o desconhecido todo que deve existir alhures. Tem-nos sido suficiente pensar na nossa Terra para que fôssemos preocupar-nos com o resto. Mas esse resto é, justamente, quase tudo, não passando nossa Terra do resto desse quase tudo".
Poucos anos atrás, almoçando com o astronauta russo Alexander Lazutkin, olhei bem nos olhos dele e lhe disse que não podia imaginar que ele havia morado na estação espacial Mir por 184 dias, descortinando durante todo esse tempo a Terra, a Lua, o Sol, as estrelas, sob um ângulo totalmente diferente. E recordei o título dos memoráveis artigos do inesquecível amigo José Wanderley Dias, A Vista do Meu Ponto. Francamente, no bom sentido, senti inveja.
Hoje nós temos um herói brasileiro, o tenente-coronel aviador Marcos Pontes, meu conterrâneo. Através dele eu me comprazo. Através dele eu me sinto também um pouco lá fora. Ele é um orgulho para o Brasil. E nós, que tanto precisamos de heróis, agora temos mais um. Que o espírito do notável Santos Dumont, o verdadeiro pai da aviação, te acompanhe Pontes, pelas tuas coragem e ousadia. Você é um marco para essa nova e promissora geração de jovens capazes de mudar o Brasil. Você é, na tua especialidade, uma das chaves que estão abrindo os cofres da cultura, da educação, das artes, da ciência, da tecnologia, em todos os ramos do conhecimento, para o teu povo. Se alguém negar isso estará negando a si próprio, a sua Pátria, a humanidade. Por mais simples que tenham sido as experiências que foram desenvolvidas na Estação Espacial Internacional, ainda assim elas representam o início de um futuro programa de pesquisas que os jovens brasileiros de agora estarão, em dez ou vinte anos, desenvolvendo, posto que genialidade e criatividade não nos faltam. Por outro lado, aqueles milhares de jovens marginalizados, sem teto, nem trabalho, sem perspectiva de vida, se devidamente amparados por ações contundentes aplicadas pelos governantes e empresários de elite, ajudarão a reverter o triste quadro que o programa Falcão mostrou na tevê.
A exploração do espaço pelo homem não pode ser efetuada num piscar de olhos. Ela é um processo gradual. E nós brasileiros chegamos lá. Astronomia e astronáutica brasileiras são hoje atividades de ponta. Nossos cientistas estão contribuindo para esse mister.
E aqui combino minhas palavras com as do grande explorador norueguês Fridtjof Nausen: "A história da humanidade é uma contínua luta entre a escuridão e a luz. Por isso não se justifica discutir o uso do conhecimento. O homem quer saber e se o impedirmos ele perderá a sua condição de homem". Parabéns coronel! Valeu Pontes!
José Manoel Luís da Silva é astrônomo e diretor o Observatório Astronômico e Planetário do Colégio Estadual do Paraná, membro da Sociedade Astronômica Brasileira e observador correspondente na Nasa.
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