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A vida anda anormal. As coisas parecem meio desparafusadas. Desde 2013, as coisas na vida política andam balançando. Mais à esquerda, depois mais à direita. Depois bem à direita e recentemente voltando um pouco ao centro. Ontem éramos um país de cristãos e simpáticos. Depois viramos um país de ódios e de pecadores.
Na economia é um sobe e desce de indicadores; a inflação subiu muito, depois desceu. Desemprego andava baixo, daí subiu muito. Produção industrial em queda, emprego bom indo pro ralo. Produção agrícola indo bem, mas só a dos grandes empreendimentos. Na economia, estamos no fundo do poço.
Nas questões ambientais também as coisas andam anormais. Falta água na Curitiba das chuvas intermináveis. Será que Curitiba tem poços artesianos? Foi uma pergunta que circulou muito nos últimos seis meses.
Que a vida, vista assim, ande anormal, não é novidade. Nem é coisa exclusiva de brasileiros. O que impressiona é que o valor da vida anda balançando também. Pensando bem, diria até que é o valor da morte que anda balançando. Antes era normal “morrer de raiva”, “matar a fome”, “morrer de amores”. Depois, virou normal matar os outros. Bala na cara. Tráfico. Depois elegemos políticos que mostram “arminha”, que prometem “tiro na cabecinha”.
A vida anda anormal. Tão anormal que o novo normal é a morte da morte. É isso mesmo. A morte morreu. Em agosto, quando batemos em 100 mil óbitos por Covid-19, eu pensei: a morte morreu. A morte não existe mais. É uma notícia. Não é triste, nem alegre. É só uma notícia, no meio da tempestade de outras notícias. A morte morreu. Já não ensina nada. Não há rituais, nem choro, nem vela. É preciso enterrá-la.
O tema da Covid-19 foi politizado. Mas é normal que seja assim. É preciso politizá-lo. Isso não significa que cada um possa vir a público e falar, sobre esse tema, o que bem quiser. A política de enfrentamento da pandemia é tema desafiador em qualquer lugar e para quaisquer governos. É desafiador para países que estão vencendo essa batalha, como é o caso da Nova Zelândia, da Austrália, de Cingapura; também é para países que estavam vencendo e, de repente, tiveram retrocessos, como é o caso da Alemanha, da Argentina, do Canadá, da Dinamarca. Mas é mais desafiador para países que mataram a morte. Nenhum governante tem legitimidade para decretar a morte da morte. Não importa seu nível de delírio. Nem de votos.
Os estados do Sul do Brasil estavam satisfeitos, até pouco tempo atrás, com o andar das coisas sobre Covid-19. Os números comparados vinham mostrando que, no Sul do Brasil, havia governo e sociedade responsáveis. O número de leitos e da rede hospitalar ajudou muito a conciliar a elevação de casos de contaminação e o relativamente baixo número de óbitos por 100 mil habitantes.
As coisas mudaram. Neste momento sabemos que os sulistas não são tão responsáveis assim. O Paraná já tem mais casos registrados (por 100 mil habitantes) que o Rio de Janeiro, neste momento. Maringá está na lista dos 20 municípios do Brasil com maior número de casos novos registrados nos últimos 14 dias. Maringá, Foz do Iguaçu, Londrina, Umuarama, Curitiba e Araucária estão na lista das 20 cidades do Sul do Brasil com mais casos novos registrados nos últimos 14 dias. Além disso, 12 municípios do Paraná registraram mais de mil casos novos nos últimos dias (dentre elas Curitiba), sendo que Umuarama, Londrina e Foz do Iguaçu registraram mais de 2 mil e Maringá teve mais de 3 mil casos em duas semanas.
A politização da Covid-19 é necessária, pois o tema não é assunto particular de ninguém. E preciso que os governos tomem medidas responsáveis e equilibradas, baseadas em evidências e atentas às consequências multidimensionais. Quando o governador do Paraná usou de sua competência especial para decretar restrições especiais à liberdade de locomoção por 15 dias, particularmente no turno que não coincide com o horário comercial, eu fiquei surpreso, mas aplaudi. É medida juridicamente válida. Em termos de política pública de saúde, é preventiva; quanto à necessidade, é baseada em evidências; e quanto aos efeitos, é proporcional: é de curta duração e não afeta horários de atividade econômica.
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É bom ver o Paraná fazendo a coisa certa em tempos anormais. Mesmo que isso desagrade a Presidência da República. Até há pouco, vimos um alinhamento discreto do governador do estado com a visão negacionista do presidente da República. Neste momento, o governador se alinhou à ciência e aos interesses de seus governados deste estado. O pêndulo das escolhas políticas andou para o meio. Sinais de que a vida pode voltar ao normal.
Carlos Luiz Strapazzon, doutor em Direito, é professor do mestrado e doutorado em Direito da Unoesc e dos cursos de Direito e mestrado em Direito da Universidade Positivo.